Já ouvi comentários sobre os efeitos que esta questão do Carnaval e da não tolerância de ponto terá na questão mais geral da abolição de quatro feriados. Em particular. na questão do feriado nacional do 1º de Dezembro, aquela que me mobiliza e, em termos patrióticos, a única realmente fundamental.
Houve quem me dissesse: "O Governo fez da questão do Carnaval uma questão de teste. Se ganhar a discussão - e é provável que ganhe facilmente - então o problema dos outros quatro feriados fica resolvido de vez. Vai tudo de carrinho."
Não vejo as coisas assim.
Declaro, primeiro, a minha posição sobre o Carnaval: tanto me faz. Não me aquece, nem arrefece. Não tenciono levantar um dedo por esta questão - nem para um lado, nem para outro. Declaro, depois, a minha opinião sobre a decisão do Governo: compreendo-a, mas não teria feito assim, nem seria esta a decisão que teria tomado.
Uma vez que todas as decisões em matéria de férias, feriados e faltas e regime de trabalho, emergentes do recente acordo de concertação social, só entrarão em vigor em 2013 (ou ainda este ano, mas depois de adoptadas as leis pela Assembleia da República), teria anunciado isso mesmo quanto ao Carnaval: vida nova em 2013.
Há muitas cidades e vilas que fazem do Carnaval um grande acontecimento anual: Torres Vedras, Loulé, Ovar, Mealhada, Estarreja, Sines, Loures, Sesimbra, etc. Estas festas são importantes para a economia local e já envolveram grandes investimentos neste ano. Os prejuízos poderão ser elevados. Respeitar esse quadro não ficaria mal. E não enfraqueceria a posição geral do Governo - antes a reforçaria, creio eu. Mostrar respeito pelas autarquias e pelos compromissos de muitas economias locais seria positivo quando, por um lado, o Governo tem também em marcha uma importante reforma da administração autárquica e, por outro, o clima geral de recessão desaconselha qualquer martelada adicional nas dinâmicas económicas habituais. Mas, enfim... o Governo é que sabe o que quer.
Importa-me mais o efeito que isto possa ter na questão dos quatro feriados e do Dia da Independência. Creio que continua tudo em aberto.
Primeiro, veremos como evoluirá a guerra do Carnaval - o melhor será tirar conclusões somente no fim. Segundo, o tipo de resistências e de protestos que se levantam quanto ao fim do 1º de Dezembro não são iguais aos do Carnaval - poderão ser menos "populares", mas são mais políticos e potencialmente mais estruturados. Têm uma carga, um valor e um peso completamente diferentes - e o mesmo pode passar-se simultaneamente quanto ao 5 de Outubro. Ou seja, a dinâmica política e social do debate sobre os feriados civis será outra. Finalmente, em terceiro lugar, poderá dizer-se isto: "Acabando com o Carnaval, o Governo, a final de contas, quer acabar com cinco feriados, em vez de quatro."
Ora, o acordo de Concertação Social previu o fim de "três a quatro" feriados, como foi abundantemente divulgado para a opinião pública. É bem verdade que o Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego prevê, em rigor, o seguinte: «Tendo presente os compromissos assumidos no Memorando de Entendimento e visando contribuir para o reforço da competitividade das empresas, o Governo e os Parceiros Sociais entendem reduzir em três a quatro o número de feriados obrigatórios.» Ou seja, falou-se de feriados obrigatórios e o Carnaval era um feriado facultativo. Seja como for, a confusão estará lançada: Eram quatro? Ou eram cinco? E não creio que o Governo tenha vantagens em usar teclas de arrogância e de "quero, posso e mando".
Isto, uma vez mais, mostra o erro que foi não se ter retomado o fio da meada: o projecto de Resolução n.º 136/XI que as deputadas Teresa Venda e Maria do Rosário Carneiro levaram a debate e a votos há coisa de ano e meio atrás. Tudo teria um racional diferente. A decisão duradoura quanto ao Carnaval poderia ter sido a de passar a dar o feriado à segunda-feira - o que, acabando com a "ponte", faria ganhar um dia de trabalho - ou de acabar de vez com o feriado facultativo - o que faria ganhar dois dias de trabalho. Em qualquer caso, as economias locais não se ressentiriam, pois poderiam programar os seus festejos com antecedência a partir de 2013: para três dias ou só para o fim-de-semana. E, mais importante, todo o novo regime de feriados e "pontes" ganharia em coerência e racionalidade: se resolvêssemos o cancro das "pontes", ganharíamos, só aí, 8 a 7 dias de trabalho por ano e bem poderíamos talvez deixar sossegados os feriados de mais alto valor simbólico.
Um processo mal conduzido no plano político e partidário. Esperemos que a consulta pública e a Assembleia da República ainda vão a tempo de o consertar.
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