Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Clemente Pedro Nunes, hoje saído no jornal i.
Para as PME que não conseguirem aumentar os preços de venda só haverá duas alternativas: endividarem-se junto da banca ou tornarem-se insolventes, com o consequente drama do aumento do desemprego.
O assalto às PME e a estabilidade da banca
O dinamismo e a capacidade de resistência das empresas produtoras de bens e serviços transacionáveis foram o que salvou a economia portuguesa após a pré-bancarrota a que Portugal chegou em maio de 2011, então conduzido pelo governo socialista de José Sócrates.
Reduzindo custos, lançando-se para o mercado exterior face à retração forçada do mercado interno, estas empresas, e muito em especial as PME, foram as responsáveis pela retoma económica registada logo a partir de 2012 e pelo fenómeno do reequilíbrio das contas externas, que desmentiram as previsões da “espiral recessiva” que muitos reputados economistas consideravam inevitável devido ao plano de ajustamento forçado pela troika.
Infelizmente, o novo governo da geringonça, logo que tomou posse, há um ano, decidiu atacar frontalmente a sustentabilidade das empresas que estão sujeitas à feroz concorrência externa.
Foi logo o abandono da redução da taxa de IRC, anteriormente acordada pelo próprio Partido Socialista, e que era uma peça fundamental para a capitalização das PME. Foi, de seguida, a decisão da reposição imediata dos quatro feriados, sem qualquer tentativa de acordo na concertação social, com importante influência no aumento dos custos de produção, muito em especial no quarto trimestre, onde se situam três dos quatro feriados repostos.
Foi, depois, o célebre “imposto Mortágua”, destinado a confiscar a poupança imobiliária, incluindo aquela que está investida em andares de habitação que se encontram devidamente arrendados e que, por isso, pagam já todos os impostos devidos.
E isto é tanto mais grave quando são as PME que criam grande parte do emprego e são indispensáveis para manter Portugal no euro. E só a solidez financeira das empresas dos setores transacionáveis pode permitir à banca ser rentável evitando as “loucuras financeiras” que geram depois as famosas imparidades, que só provocam mais dívida, pública e privada.
Criar as condições fiscais para que as empresas se possam capitalizar ao serviço da criação de emprego deverá ser, pois, um objetivo político fundamental para garantir a coesão social de Portugal e a sua manutenção na Zona Euro.
Por isso se assistiu agora com grande preocupação ao diktat do governo sobre as empresas no que diz respeito ao aumento do salário mínimo, aumento este que se situa muito acima da taxa de inflação e dos ganhos de produtividade, o que claramente coloca em causa a competitividade da economia portuguesa.
Com 557 euros, pagos 14 meses por ano, a que acrescem 22,5% da componente da TSU paga à parte pelas empresas, mesmo após a redução especial proposta para 2017, as empresas vão ter de despender 557x14x1,225 euros por cada colaborador, ou seja 9630 euros em 2017. Para os cerca de um milhão de colaboradores nestas condições, o esforço financeiro exigido globalmente às empresas atinge os 9630 milhões de euros.
Mas atenção: 33,5% deste montante é receita direta do Estado, através da Segurança Social, ou seja, 3250 milhões de euros saem das empresas diretamente para os cofres do Estado.
Além disso, isto representará em 2017 um adicional de 448 milhões de euros relativamente a 2016, e deste aumento de despesa, 33,5%, ou seja, 150 milhões de euros, vão diretamente para o Orçamento do Estado como contribuições obrigatórias para a Segurança Social - o que constitui um precioso contributo para a redução do défice de 2017.
Mas, para manterem a atividade nestas novas condições, as empresas terão de ir buscar algures esses 448 milhões de euros adicionais.
Para as PME que não conseguirem aumentar os preços de venda só haverá duas alternativas: endividarem-se junto da banca ou tornarem-se insolventes, com o consequente drama do aumento do desemprego.
E se é certo que, em 2016, o extraordinário boom turístico, provocado pela instabilidade no Médio Oriente e no norte de África, salvou o emprego, nada garante que em 2017 este fenómeno se repita na mesma escala e que a ameaça do desemprego não ressurja.
E depois lá estará de novo o espetro do aumento das dívidas à banca e do aumento do malparado.
Conforme já referi em anterior artigo, a atual política de redução da poupança em simultâneo com o aumento do consumo só será possível, a prazo, com uma política laxista e suicida de concessão de crédito por parte da banca que aumente artificialmente a circulação financeira.
Por isso, considero que a última coisa que o atual governo da geringonça deseja, exatamente ao contrário do que se tem propalado, será aplicar o pré-acordo com o BCE para a recapitalização da Caixa Geral de Depósitos que foi recentemente revelado pela imprensa e que visa, nomeadamente, uma grelha muito mais rigorosa para a concessão de créditos.
Mas esse será um assunto para ser tratado com maior profundidade em próximo artigo, para se criar em Portugal “Uma Democracia de Qualidade” conforme proposto no nosso Manifesto.
Clemente PEDRO NUNES
Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade
NOTA: artigo publicado no jornal i.
1 comentário:
A BANCA? Que banca?
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