O que não é nada normal, e é mesmo vergonhoso, é assistirmos em Portugal ao aumento da abstenção nas eleições dos deputados para a Assembleia da República.
Luís Montenegro, líder parlamentar do PSD, nas Jornadas Parlamentares do seu partido - Algarve , fins de Maio de 2017 |
Círculos uninominais nas eleições legislativas – uma necessidade premente
O ex-candidato à Presidência da República Henrique Neto fez importantes referências no seu artigo desta coluna, na semana passada, à obra de Manuel Braga da Cruz “O Sistema Político Português”, da iniciativa da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Trata-se, de facto, de um livro de grande importância, cuja leitura é indispensável, e é um apoio importante à tese de necessidade urgente de uma reforma do sistema eleitoral que preveja círculos uninominais para a eleição dos deputados para a Assembleia da República. Aliás, a nossa Constituição já o permite desde que António Guterres e Marcelo Rebelo de Sousa proporcionaram a revisão de 1997, ou seja, há já 20 anos…! E os dois sabiam certamente o que estavam a fazer.
A introdução de círculos uninominais é um princípio que os subscritores do “Manifesto: Por uma Democracia de Qualidade” defendem ativamente desde 2014.
Aproveito para lembrar os leitores que sistemas eleitorais com círculos uninominais não são sistemas não testados, bem pelo contrário. França, Inglaterra, Irlanda, Dinamarca, Alemanha, Suécia e muitos outros países já utilizam sistemas eleitorais com esses círculos, como forma imprescindível de aproximarem os eleitos dos seus eleitores, há muitos anos.
O que não é nada normal, e é mesmo vergonhoso, é assistirmos em Portugal ao aumento da abstenção nas eleições dos deputados para a Assembleia da República – 8,34%, em 1975, 44,14%, em 2015 – e permitirmos que se mantenha a forma ditatorial como os diretórios dos partidos procedem à escolha de todos os deputados que constituem a assembleia legislativa da nossa República. É, aliás, uma forma que interessa a muitos políticos, mas que não interessa, seguramente, à sociedade civil, porque, como se vê pelo nível de abstenção, ela não se sente adequadamente representada.
Os partidos deviam ser responsabilizados pela sociedade civil por não estarem a defender os interesses da nação. Porque continuam a insistir em não aceitar a concorrência de candidatos independentes das suas estruturas para que, em candidaturas espontâneas, se possam candidatar a deputados?
A situação vai a este extremo: ainda há uma semana, o líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro, segundo a comunicação social, ter-se-á manifestado contra a criação de círculos uninominais em Portugal considerando que “tal sistema podia criar uma hipermegageringonça”. Hipermegageringonça quando existiria sempre um círculo nacional de compensação de uns 100 deputados?
Os partidos tendem a não gostar de círculos uninominais porque teriam de arregaçar as mangas para se dedicarem à escolha do melhor candidato a deputado em cada um dos, por exemplo, 115 círculos uninominais no Continente. Isso obriga a conhecer muito bem os candidatos e os desejos das populações em cada um desses círculos uninominais porque, em cada um deles, só o candidato mais votado entraria no hemiciclo. E isso é, obviamente, uma ameaça de monta para fracos candidatos. Mas porquê o termo hipermegageringonça? Nascerá de alguma situação traumática?
Defende ainda Luís Montenegro a redução do número de deputados da Assembleia da República. O PSD tem falado numa redução de 50. Um grande erro, quanto a mim, porque tal medida vai prejudicar os pequenos partidos, beneficiando os grandes, tal como o PSD. Não me parece que seja uma boa proposta de início de negociações que, aliás, não me parece que esteja minimamente interessado em encetar.
Acho ridículo que os líderes partidários não tenham ainda compreendido que o primeiro ou os primeiros partidos a apoiarem a implementação dos círculos uninominais e a defenderem a apresentação de candidatos independentes das estruturas partidárias às eleições legislativas serão os que terão mais a ganhar em termos de apoio popular em sede de atos eleitorais.
Considero que, se os partidos não efetuarem atempadamente a reforma do sistema eleitoral, outras alternativas de poder político aparecerão, porque não acredito que a passividade da sociedade civil portuguesa se mantenha e não procure outras soluções, afastando do poder estes políticos que apoiam uma democracia por eles controlada de forma ditatorial.
Até quando a situação se vai manter, não se sabe. Só sabemos que a nossa não pára de se deteriorar!
Informações sobre a subscrição do nosso “Manifesto: Por uma Democracia de Qualidade”, sobre contactos e outras podem ser pedidas através do email: porumademocraciadequalidde@gmail.com
Fernando TEIXEIRA MENDESEmpresário e gestor de empresas, EngenheiroSubscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade
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