quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

O Défice Gasoso e as Contrapartidas Militares

Por indicação do seu autor, republicamos um artigo recente do Eng.º Mira Amaral, publicado na última edição do semanário EXPRESSO, caderno de "Economia".

Um alerta bem importante. E oportuno.


O DÉFICE GASOSO E AS CONTRAPARTIDAS MILITARES

Por causa das centrais eólicas e fotovoltaicas, as térmicas estão quase inactivas apenas a apoiar as eólicas quando não há vento. Com a revolução do shale gas, os americanos deixaram de consumir carvão, este tornou-se mais barato e os europeus, Portugal inclusive, utilizam crescentemente as centrais a carvão e as de gás natural ficam paradas. Isto está a gerar sérios prejuízos nas utilities europeias, com excepção para a EDP, que tem as suas centrais cobertas pelos famosos CMEC que asseguram a estes activos uma rendibilidade garantida de cerca de 15%, funcionem ou não. Não admira pois que a EDP não tenha o problema dessas utilities. Como diria Pires de Lima, os seus gestores têm, assim, uma máquina para ganhar prémios internacionais!

As tarifas de acesso às redes de electricidade desde 1995 têm tido os seguintes e impressionantes aumentos médios anuais: Muito Alta Tensão, 10,3%; Alta Tensão, 9,5%; Média Tensão, 5,7%; Baixa Tensão Especial, 6,4%; Baixa Tensão Normal, 5,6%! O consumo de electricidade é o mesmo de há dez anos, mas os famosos Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) aumentaram de 500 para 2.500 Milhões de euros, devido ao monstro eléctrico. Entretanto, a dívida tarifária está descontrolada e já ultrapassa os cinco mil milhões de euros!

Quando introduzimos o gás natural, foi necessário ter centrais a gás, criando consumos que viabilizassem o pesado investimento nos gasodutos, pois os consumidores domésticos e industriais não chegavam para tal. Como agora as centrais a gás estão paradas, elas não asseguram esse consumo às redes de gás e, então, a rendibilidade das concessionárias tem de ser assegurada pelos consumidores domésticos e industriais, o que está a gerar terríveis pressões de aumento do preço do gás natural para estes. Começa-se, aqui no gás, a falar agora eufemisticamente em desvio tarifário. Repete-se, pois, a cena; e o monstro eléctrico começa a ficar gasoso!

Também neste contexto, não faz qualquer sentido o reforço das interligações gasistas entre Portugal e Espanha. Tal só poderá fazer sentido se se reforçarem as interligações entre Espanha e França e isso se e quando a Península Ibérica, através dos seus terminais de regaseificação, se tornar um hub de fornecimento de gás natural à Europa Central, combatendo a hegemonia do fornecimento pela Rússia. Se isso acontecer, é evidente que o nosso terminal de Sines também seria utilizado para abastecimentos, através de Espanha, à Europa.

O mais elementar bom senso recomendaria então que não se continuasse a aumentar o monstro eléctrico (potência renovável intermitente em excesso). Mas qual não é o meu espanto e indignação quando vejo que, como contrapartida dos submarinos, vão ser instaladas mais 172Mw de potência eólica na rede! Os alemães vão conseguir fazer os portugueses pagar, através das rendas e sobre-custos da energia eólica, as contrapartidas que, no negócio dos submarinos, não deram! Em vez de contrapartidas úteis para as nossas empresas, oferecem-nos uma coisa que já tínhamos em excesso!

Quando, como ministro da Indústria, assinei com o então ministro da Defesa Nacional Figueiredo Lopes, um despacho conjunto no sentido de se obterem contrapartidas em prol de empresas portuguesas aos fornecedores de material às Forças Armadas Portuguesas, estava longe de supor que tal espírito fosse subvertido, as empresas portuguesas nada beneficiassem e, pelo contrário, a economia portuguesa até fosse prejudicada através de contrapartidas inúteis e prejudiciais por via duma decisão deste governo! 

LUÍS MIRA AMARAL
Engenheiro (IST) e Economista (NOVASBE)