A Ana Cid Gonçalves, secretária-geral da APFN - Associação Portuguesa das Famílias Numerosas, escreveu, no mural da página de Facebook do meu irmão Fernando, este testemunho, que aqui agradeço e partilho, de forma reconhecida. É tudo verdade. Também fui testemunha.
“Vai ser o meu último mandato!”
Foi o que o Fernando declarou nas últimas eleições da APFN em que ainda se candidatou a Presidente da Direcção após a nossa insistência para que o fizesse.
Longe estávamos, ele e nós, de saber do terrível cancro que o viria a levar tão precocemente…
Conheci-o há 10 anos quando um amigo me pediu que desse uma ajuda na organização do II Congresso Europeu de Famílias Numerosas que se realizou em Portugal em 2004. O Fernando que eu conheci fazia de tudo na APFN: colava etiquetas, atendia telefones, fazia apresentações, escrevia, angariava artigos e compunha o boletim, geria os sócios numa aplicação informática integralmente criada por ele e que ainda hoje usamos... Mas também realizava trabalhos de fundo que exigiam muito tempo de recolha e tratamento de dados, pesquisa e compilação de informação (como os primeiros cadernos da APFN) e até mesmo o desenho conceptual de políticas públicas que hoje se mantém totalmente actual. Isto tudo de forma totalmente generosa e voluntária, noite dentro, após o seu horário de trabalho profissional e contribuindo muitas vezes com recursos próprios seus, como quando correu o país para arranjar delegados a expensas próprias.
Fui totalmente contagiada por esta energia e generosidade, e um assunto que para mim nem sequer era assunto, passou a ser o assunto da minha vida.
Sempre admirei a sua frontalidade e transparência. Nada na manga… Tudo o que pensava se conhecia. Muito directo e nada politicamente correcto, afirmava as suas fortes convicções de forma desabrida. Tinha sempre opinião que invocava muito seguramente mas, da mesma forma que o fazia, também era capaz de, no minuto seguinte e com toda a humildade, reconhecer razão na outra pessoa.
Era muitas vezes mal interpretado, o que às vezes me entristecia. Frequentemente lhe atribuíam palavras, ideias e pensamentos que nunca teve. E ele sabia isso e, também por essa razão, queria que mais pessoas falassem em nome da APFN.
Totalmente liberto de protagonismos, não procurava as luzes da ribalta. Sempre teve a preocupação e o cuidado de garantir que, como ele dizia, “a APFN não pode ser a Associação do Fernando”. Tudo fez para que tivéssemos uma equipa profissional capaz de dar resposta aos desafios com e sem ele.
Apesar de profissionalmente ter tido sempre profissões exigentes e trabalhosas em termos de tempo, nunca deixou de dar pronta resposta a todas as necessidades da APFN e acredito que também de outros assuntos como, por exemplo, os da Confederação Europeia de Famílias Numerosas a que também presidia. Milagrosamente, arranjava sempre tempo para responder a todos os assuntos, muitas vezes no minuto seguinte. Extraordinariamente inteligente e rápido.
Um maravilhoso sentido de humor. Achava tanta graça às nossas palhaçadas que chegámos a fazer capas de boletim falsas e outras brincadeiras só para ouvir as suas gargalhadas estrondosas. Era rara a vez que estávamos juntos e que não brincássemos a propósito de qualquer coisa.
Mal entrava na sede, dava-se por ele. Acompanhava e estava próximo do nosso trabalho. Valorizava e entusiasmava muito a equipa. Distribuía os louros e agradecia constantemente o trabalho dos outros.
Muito exigente, pensava em tudo e tudo fazia com enorme dedicação, mas também era muito compreensivo quando alguém falhava e as coisas não corriam exactamente como deviam. Podia até ficar bastante zangado num minuto mas, no minuto seguinte, já não era nada.
Sempre apaixonado pela sua querida Leonor e pelos seus filhos e netos, vivia aquilo em que acreditava: uma família estável, unida e forte, e muitos irmãos, "é o melhor que se pode dar aos filhos". Os olhos brilhavam e sorriam quando falava deles e falava muitas vezes.
Foi um visionário e antecipou muito do que hoje vivemos e do que teremos que enfrentar no futuro. Mesmo sabendo das dificuldades, era um optimista com uma enorme alegria de viver. Mas, tal como adorava viver, entregou-se tranquila e corajosamente à realidade de uma morte prematura anunciada.
Embora sabendo que continuas connosco, sentimos e sentiremos muito a tua falta, Fernando.
Agradeço muito o tanto que me deste. O exemplo, o testemunho, a força, o entusiasmo… Também tudo o que deste à APFN.
Ana Cid Gonçalves
1 comentário:
Obrigado pela partilha que tão bem descreve uma Vida, uma Obra, uma Personalidade invulgar, deixando Vida para Viver e, Continuar."Isto não pode parar" e, no "isto" cabia tudo!
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