segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A história da nossa crise: II - as causas das consequências que nos acontecem



Portugal beneficiou de uma década de noventa de razoável crescimento económico. A década de 70, com excepção dos anos de 74 e 75, foi uma década de enorme crescimento económico; e a década de oitenta, apesar dos desmandos das finanças públicas que conduziram à intervenção do FMI em 1983-85, veio a revelar-se uma boa década para o País, sobretudo depois da adesão à CEE, em 1986.

O afluxo de dinheiros comunitários tornou possíveis os sonhos mais fantasiosos dos Governos portugueses, desde a construção de luxuosos centros culturais, à cobertura do país com novas auto-estradas.

Mas o dinheiro escondeu as fragilidades do país e desmotivou os Governos da tarefa de reformar aquilo que carecia em absoluto de reforma. Reformar é difícil, muitas vezes muito impopular e, num ambiente de crescimento económico, de internacionalização crescente da economia, de afluxo cultural e cosmopolita, o custo político dessas reformas parecia desnecessário e, portanto, dispensável.

O país também não estava pronto para essas reformas: depois da «reforma» radical que consistiu na mudança de paradigma e de configuração por que Portugal passou na década de setenta, da adesão à CEE na década de oitenta e da preparação da rampa de lançamento do mercado único e do euro no final da década de oitenta e princípios da década de noventa, o que os Portugueses pareciam querer era a estabilização da sua democracia e o aprofundamento do estado social.

Por todos os lados havia sinais de mudança, crescimento e exigência de direitos garantidos. Foi a época dourada do «Estado democrático de direito» em que passou a ser inconstitucional tudo o que contrariasse direitos adquiridos, mesmo de ilegítima ou excessivamente fácil aquisição, e tudo o que se opusesse aos direitos inalienáveis à saúde, educação e cobertura social "gratuitas" e garantidas pelo Estado.

Com a maturação da fruição plena dos frutos do crescimento económico e dos dinheiros europeus, a que a partir de 1985 se vieram somar os resultados da privatizações, os partidos compreenderam que ganharia as eleições quem se mostrasse o melhor campeão do Estado social e dos «direitos garantidos».

Mesmo a decisão, aparentemente consensual e unânime, de aderir ao núcleo fundador do Euro, não levou ninguém a pensar na necessidade de reformar o País, de o preparar para uma nova situação a que Portugal só poderia fazer face com um drástico aumento da competitividade e uma disciplina férrea nas finanças públicas.

Pelo contrário, começou com Cavaco e Silva uma prática deliquiscente de colonização da Administração Pública com fornadas de clientes partidários e de sequestro das administrações dos serviços públicos por quadros partidários. O resultado foi que no espaço de dez anos, entre 1985 e 1995, se passou de cerca de 400.000 funcionários públicos para 600.000 mil; floresceram as mais variadas e desencontradas empresas públicas e iniciou-se a prática delinquente de transformar direcções-gerais em institutos público, primeiro, e empresas públicas, depois. Foi uma forma de desorçamentar partes importantes da despesa pública, pondo-a, por um lado, a coberto das regras sobre contratação pública e, por outro, pondo-a sob a alçada gananciosa de clientelas partidárias.

O monstro da despesa pública nascia - e o papá era o Dr. Cavaco. Em 1995, perdeu as eleições porque os Portugueses acharam pouco, queriam o monstro um pouco maior. Muito maior, na verdade.

1995 podia ter sido o ano da inversão do ciclo. O crescimento económico estava claramente a abrandar e os efeitos dos dinheiros europeus estavam a perder potência transformadora.

Uma boa liderança do País teria apontado no sentido das reformas e da disciplina nas finanças públicas, antes que fosse tarde. Aliás, vinha aí o Euro e estávamos obrigados aos critérios de Maastricht.

Em vez disso, saiu-nos Guterres e os socialistas.

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