domingo, 4 de dezembro de 2011

Lisboa, afinal, já era. "Porreiro, pá!"


Dois dos ícones da afirmação portuguesa na U.E., ambos ditos "de Lisboa", jazem mortos e desaparecidos. 

Primeiro, foi a "estratégia de Lisboa", lançada por Guterres no ano 2000. Um fracasso absoluto. Apesar de revista e reajustada algumas vezes, falhou por completo: a ideia de "uma nova estratégia para fomentar o emprego, modernizar a economia e reforçar a coesão social numa Europa baseada no conhecimento" não passou de uma miragem. Era boa ideia, mas finou-se. Andou sempre fraquinha; e a crise iniciada em 2008 soterrou-a de vez. Ao fim dos 10 anos previstos, foi já substituída pela chamada "Estratégia 2020" (é de bom tom dizer-se "vinte-vinte"), que veremos onde chega...

Agora, é a vez do Tratado de Lisboa. O renovado pressing de Angela Merkel - e também de Sarkozy -  para a revisão do Tratado de Lisboa prenuncia o seu fim formal. O célebre "porreiro, pá!" da sua assinatura foi manifestamente exagerado - e prematuro.


O Tratado de Lisboa foi, em boa verdade, um nado-morto. Nem sequer foi uma boa ideia. Se tivessem sido feitos os referendos nacionais que haviam sido prometidos em muitos países, entre os quais Portugal, provavelmente não teria saído dos tacos de partida. 

Adoptado, já então, sob pressing acrítico de Angela Merkel, morrerá agora às mesmas mãos. Em 2007, a presidência alemã precedeu a portuguesa: Merkel fixou o menu, que Sócrates cumpriu como diligente mordomo, no semestre seguinte. Mas o Tratado, em si, pobre herdeiro descafeinado do falecido Tratado Constitucional, deixou sempre muito a desejar: tem todos os defeitos do de cujus e não supriu nenhuma das suas mais flagrantes lacunas e omissões.

As normas procedimentais laterais que o Conselho (ilegalmente?) tem vindo a adoptar "à socapa" para responder à crise actual e procurar melhorar a débil governação económica e financeira da União Europeia são a melhor evidência de como o Tratado de Lisboa passou totalmente ao lado dos problemas e das exigências do seu tempo. Veja-se, por exemplo, o regime orçamental do chamado "semestre europeu", decidido em 2010. 

Agora, Merkel exige mais e não disfarça o que efectivamente se impõe: nova reforma dos tratados. O objectivo é certo, embora o método seja outra vez errado. 

A culpa vem de trás: vem das fantasias e demasiados erros da pomposa (e falhada) "Constituição Europeia". Passam, agora, neste mês, 10 anos sobre a Cimeira de Laeken que deu início a tudo isto, lançando o processo da Convenção Europeia e definindo-lhe o mandato. Muita quimera, falta de democracia e os excessos dos "avancistas" do costume (como gosto de chamá-los), estragaram tudo. Aberta com a ilusão de grandes vôos, esta foi, afinal, uma década perdida.

Desde Maastricht, em 1992, será a quinta reforma dos tratados, em menos de 20 anos. A quarta reforma em apenas 10 anos! - foi Nice, a Constituição (falhada), Lisboa e, agora, novo Tratado à vista. As Comunidades viveram bem com os velhos tratados de Roma, ao longo de mais de 30 anos... 

É no que dão os visionários sem visão: instabilidade. Lisboa merecia melhor.

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