Aproveitar-se dos mais fracos: competitividade oportunista e atractividade desleal |
Ontem, foi manchete a notícia de que os donos da Jerónimo Martins transferiram a sua sede para a Holanda, a fim de aí passarem a ser tributados e pagarem menos impostos. Não é o primeiro caso em que isso acontece. Há vários anos já, foi também abundantemente noticiado um caso da SONAE. E há outros casos que têm sido já referenciados, sabendo-se que o processo tem anos e continua. Hoje mesmo, há mais notícias.
O problema não é quem, perante diferentes opções, escolhe a que lhe é mais vantajosa - um resultado que normalmente acontece no reino de seres inteligentes e em economias de escolhas racionais. O problema é quem define e permite o quadro em que, anos a fio, estas coisas acontecem. Que U.E. estamos a fazer?
O problema não é quem, perante diferentes opções, escolhe a que lhe é mais vantajosa - um resultado que normalmente acontece no reino de seres inteligentes e em economias de escolhas racionais. O problema é quem define e permite o quadro em que, anos a fio, estas coisas acontecem. Que U.E. estamos a fazer?
Há coisas na União Europeia que, na verdade, ninguém entende. Nem consegue explicar racionalmente.
Há alguns anos atrás, quando o crescimento da Irlanda
começou a causar inveja, líderes dos países mais ricos da União Europeia
inventaram uma acusação contra os irlandeses: fariam "dumping"
fiscal. A expressão, repetida à saciedade por franceses, alemães e holandeses,
dá vontade de rir, para quem sabe o que é o "dumping". Mas o
objectivo político era claro: ilegitimar a taxa mais baixa de IRC que as empresas
pagavam na Irlanda e forçar os irlandeses a uma tributação empresarial mais
elevada, assim martelando a competitividade do chamado "tigre celta". A Irlanda resistiu.
Quando estoirou a crise recente e a Irlanda teve que recorrer à ajuda externa, prontamente surgiu a "facturinha": então e a taxa de
IRC? Os mais ricos - com a Alemanha à cabeça - quiseram condicionar a ajuda a
que os irlandeses revissem a sua taxa de IRC. Pressionaram por todas as formas; e
quase chegaram ao extremo da chantagem irredutível. Mas a Irlanda bateu-se valentemente e a tudo resistiu: conseguiu obter a ajuda pretendida - e tem apresentado bom desempenho ao abrigo
do programa contratado. A sua taxa de IRC continua nos 12,5%, o que é uma
ferramenta central na competitividade internacional do "tigre celta"
e um alicerce do crescimento económico, a que já regressou.
A opção irlandesa compreende-se bem e está na plena normalidade
da sua soberania fiscal quanto à actividade económica que decorre no seu próprio
país. Já o caso holandês tem muito que se lhe diga. Na verdade, se os mais
ricos da U.E. inventaram um tal de “dumping” fiscal de que acusam os irlandeses, que dizer então de ver
a Holanda a parasitar a actividade económica desenvolvida em países terceiros, a fim
de lhes capturar apenas a nata, isto é, parte substancial dos lucros e as respectivas
receitas fiscais?
Bem sei que, na história colonial e ultramarina, os Países
Baixos tiveram grandes artes de pirataria – como os ingleses, aliás. Mas isto é capaz de ser
demais. À cabeça, não tem nada a ver com a U.E., nem com interesses legítimos de uma
economia europeia.
A coisa – acima de tudo – cai muito mal naqueles que têm que suportar
duros programas de austeridade e vêem os mais folgados sugar-lhes parte do
esforço fiscal. Num quadro de economia aberta e de livre concorrência, há técnicas particularmente desleais e oportunistas de atrair e capturar o que, por direito, é de terceiros. A U.E. faz alguma coisa quanto a isto?
Sem comentários:
Enviar um comentário