Face à importância das matérias tratadas nestes projectos de lei, que foram debatidos no plenário da Assembleia da República na quinta-feira, 19 de Janeiro, e colocados a votação na sexta-feira, 20 de Janeiro, entendi apresentar uma declaração de voto, que foi entretanto entregue, nos termos regimentais, e será publicada no Diário. Incluo-a aqui:
DECLARAÇÃO DE VOTO
Votação dos projectos de lei n.ºs 122/XII/1ª (BE) e 137/XII/1ª (Pedro Delgado Alves et alii) e dos requerimentos sobre os projectos de lei n.ºs 131/XII/1ª (PS) e 138/XII/1ª (PSD)
Procriação Medicamente Assistida, incluindo a maternidade de substituição
1. Nas votações sobre os projectos de lei de alteração à Lei n.º 32/2006, de 26 de Julho, que se propunham modificar o regime vigente para a Procriação Medicamente Assistida (PMA) e, entre outros pontos, introduzir a maternidade de substituição, votei contra os dois projectos de lei, em título, da autoria do Bloco de Esquerda e de deputados do Partido Socialista. E teria votado também contra os outros dois projectos, da autoria do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata, se não houvessem sido retirados da votação a requerimento dos seus autores, já após o debate na generalidade e imediatamente antes de serem votados pelo plenário.
Quanto aos dois requerimentos de baixa à Comissão destes projectos do PS e do PSD, sem qualquer votação, discordo totalmente do expediente adoptado, susceptível de criar grandes equívocos na opinião pública, pelo que, de facto, não os votei: presente na sala, não teria votado, se o Regimento o permitisse; mas, estando na sala no momento de votar e face ao impedimento do Regimento (artigo 93º, nº 2), declaro acompanhar a abstenção por que decidiu votar o grupo parlamentar do CDS-PP, nos termos então oralmente declarados.
2. A matéria da Procriação Medicamente Assistida suscita diversas questões de grande sensibilidade quer para os pais que aspiram a ter filhos, quer para os filhos que assim são gerados e, bem assim, com relação a diversos valores sociais e humanos de referência.
A lei adoptada em 2006 seguiu-se a longo processo e debate na sociedade portuguesa. Basta recordar como a primeira tentativa legislativa foi objecto de veto do Presidente da República, Jorge Sampaio, em 1999. E basta recordar também o prolongado debate em que o tema prosseguiu, chegando a merecer, em meados da década passada, uma iniciativa popular de referendo, que, todavia, não seria acolhida pela Assembleia da República.
A lei que, em concreto, foi adoptada em 2006, apenas foi possível no seu dispositivo concreto, por vigorar, na altura, em Portugal, a maior maioria de esquerda de sempre, com maioria absoluta do PS (que podia, querendo, decidir sozinho) e um peso significativo à sua esquerda, por parte do PCP e do BE (sendo que este último partido prossegue uma conhecida agenda pró-activa em específicos aspectos da matéria).
3. Seja como for, a lei foi adoptada: Lei n.º 32/2006, de 26 de Julho.
Ora, a alta sensibilidade das matérias em apreço – que tocam no núcleo mais sensível da própria humanidade e da dignidade humana e em valores sociais fundamentais – aponta para a conveniência de estabilidade legislativa. Isto é, aponta para que as mudanças de legislação aconteçam após um relativamente longo período probatório e de sedimentação do regime jurídico, que permita claramente fazer novas avaliações e extrair conclusões relevantes que sejam solidamente diferentes daquelas que tenham norteado a sua adopção.
É evidente que cada um tem concepções próprias, que terão sido acolhidas ou rejeitadas, total ou parcialmente, aquando da adopção da legislação em vigor. E é evidente também que a todos assiste o interesse e o direito de procurarem fazer avançar os seus pontos de vista. Mas o interesse colectivo, em matérias deste recorte e melindre, é o de alguma estabilidade legislativa, porque a sociedade portuguesa não pode dar de si própria a ideia de que muda de valores fundamentais e de quadros matriciais de referência todos os anos ou todas as legislaturas. Dizendo por outras palavras mais directas, estas leis são de tal natureza que não devem ser tratadas como bolas-de-trapos do debate político-partidário corrente.
Por isso, divergi, em geral, da própria oportunidade deste debate legislativo.
É compreensível que o Bloco de Esquerda o abrisse através do Projecto de Lei n.º 100/XII/1ª – entretanto, retirado e substituído pelo PL 122/XII/1ª. Assim picou o ponto da sua agenda fracturante logo nos primeiros meses da primeira sessão legislativa desta Legislatura, repondo os pontos em que não obteve vencimento em 2006 e procurando ir um pouco mais longe.
Mas já não considero compreensível que partidos do arco da governabilidade, como PS e PSD, se juntassem à mesma procissão – e, por isso, me manifestei contra isso e tentei que o não fizessem.
Os factos posteriores e finais parecem, aliás, dar-me razão: primeiro, os projectos do PS e do PSD acabaram por ser retirados de votação; segundo, os projectos de lei levados a votos foram reprovados; e, terceiro, o único efeito do movimento político fracturante do BE foi o de efectivamente provocar divisões em todas as bancadas e coligações, com excepção do PCP.
A dignidade dos valores em questão merece mais.
4. Ao defender a estabilidade legislativa, não quero dar ideia de que sou totalmente a favor da lei vigente, a Lei nº 32/2006, de 26 de Julho. Não sou.
Considero-a um passo muito importante no que respeita à legalização da procriação medicamente assistida, a que muitos casais recorriam já, desde há algumas décadas, em Portugal, para vencerem problemas de infertilidade. E também para dotar de segurança jurídica os médicos que se dedicaram à medicina da infertilidade.
Mas há aspectos específicos do regime estabelecido que me merecem discordância ética, jurídica e política. O CDS votou, aliás, como é sabido, contra essa lei, sendo eu na altura Presidente do CDS e assumindo inteiramente essa responsabilidade.
Sou claramente a favor da procriação medicamente assistida, em casal, com reprodução homóloga, isto é, com recurso ao material genético da própria mulher e do próprio homem que, em casal, recorrem à medicina para superarem problemas de infertilidade. Creio que a PMA é uma grande resposta médica para estes casais, permitindo-lhes completar o seu projecto familiar em termos em que a filiação afectiva corresponde inteiramente à filiação natural, à filiação biológica.
Mas, passado esse plano, em que a medicina está inequivocamente ao serviço e ao lado da natureza, deparo-me quanto à PMA, problema a problema, sucessivamente, quanto a cada uma de outras questões que se vão justapondo, primeiro com dúvidas, depois com reservas, enfim em oposição – no plano ético e, portanto, também no plano legislativo, isto é, político.
Sou contra a procriação heteróloga. E sou contra o anonimato dos dadores de material genético, anonimato que viola um direito fundamental à identidade pessoal dos filhos que assim são gerados.
Por outro lado, creio que a legislação portuguesa deveria também, como acontece noutros países da União Europeia, regular e limitar estritamente, nos processos de PMA, a geração de embriões para implantação, por forma a evitar o acumular infinito dos chamados “embriões excedentários” e o pesadelo ético, médico, social e político a que esse acumular dá lugar. Assim como acompanho todos aqueles que se opõem à investigação destrutiva de embriões humanos e que, em matéria de investigação com células estaminais, apontam para que o caminho é, inequivocamente, o da investigação sobre células estaminais adultas (de bem reconhecidas virtualidades e grande alcance científico e médico) e não sobre células embrionárias, isto é, com os embriões humanos.
Penso, aliás, que foi impróprio que, em 2006, se apropriasse uma lei sobre a PMA para regular matérias referentes ao destino dos embriões excedentários e seu uso (e destruição) em investigação científica. Penso que seria mais correcto que o Estado português vencesse o medo ou o embaraço em estabelecer e definir um Estatuto Jurídico do Embrião Humano – algo que é exigido pela modernidade e imposto pela própria Ciência – e daí retirasse, depois, todas as consequências, em lugar de andar a definir normativos ad hoc sem consideração da questão na sua essência e no seu conjunto.
Mas, dito isto quanto aos meus pontos de afastamento relativamente à lei em vigor, isto em nada diminui as palavras que acima deixei quanto ao valor da estabilidade legislativa. Essas palavras aplicam-se-me também por inteiro.
5. Os quatro projectos de lei que foram, agora, apresentados visavam, em modos e graus diferentes, ampliar o recurso às técnicas de PMA, incluindo a maternidade de substituição (vulgo “barrigas de aluguer”), e refazer alguns aspectos do regime quanto aos embriões excedentários, renovando o seu uso em processos de investigação e inerente manipulação e destruição em processos científicos.
6. Quanto às normas de alguns dos projectos (BE, PS e PSD) que se referem à investigação científica com embriões humanos, não careço de acrescentar mais nada ao que já disse.
O meu pensamento é o de que a necessidade legislativa em Portugal é exactamente ao contrário:
• Limitar a produção de embriões;
• Definir autonomamente um estatuto jurídico do embrião humano, que passe a ser referência matricial;
• Canalizar o esforço investigatório para as células estaminais adultas, poupando os embriões humanos.
7. Quanto a admitir a procriação medicamente assistida fora de um quadro clínico de infertilidade, sou contra. Era o caso dos projectos do BE e do de alguns deputados do PS (Pedro Delgado Alves et alii).
Creio, aliás, que haveria aí uma contradição nos próprios termos: não há algo que seja “medicamente assistido” em sentido próprio, onde não haja doença de infertilidade, isto é, falta de saúde reprodutiva em sentido próprio.
Nesses casos de PMA sem infertilidade clínica, estaríamos certamente a regular técnicas artificiais de reprodução humana, mas tenho as mais sérias dúvidas sobre que, no sentido rigoroso, deontologicamente mais autêntico, pudéssemos sequer falar de medicina.
8. Quanto a admitir a PMA a mulheres sós, também não sou a favor, fosse para projectos de mães solteiras em sentido exacto, fosse no quadro de uniões homossexuais.
Repito: a PMA, para mim, é uma resposta correcta e muito importante para ajudar casais a superarem a própria infertilidade – infertilidade clínica, infertilidade medicamente declarada – como homem e mulher, como pai e mãe, em casal.
Não serve – isto é, não deve servir – para apagar o pai, nem para gerar filhos em quadros que são, por natureza das coisas, infecundos.
Uma coisa é a medicina. Sou a favor. Outra coisa é a engenharia social. Sou contra.
Ainda quanto às mães solteiras, não há dúvida de que qualquer mulher que o queira ser o pode ser – embora seja de observar que a maioria das mães solteiras não o desejavam ser; e a situação em que se viram resultou, muitas vezes, de quadros dolorosos, de quadros de abandono e de desrespeito humano e social, quando não de violência.
Mas, seja como for, chegados a um plano de legislação sobre PMA, a questão não é a de saber se a mulher pode, ou não pode, ser mãe solteira – pode.
A questão é a de saber se a medicina deve, ou não deve, ser posta ao serviço dessa escolha individual – e, a meu ver, não deve.
9. Por último, quanto às chamadas “barrigas de aluguer”, também sou contra.
Revejo-me em todas as reflexões que foram feitas – nomeadamente pelas deputadas do CDS, Teresa Caeiro e Isabel Galriça Neto – quanto à intensidade da relação maternal que se estabelece numa mulher que gera no seu próprio ventre um filho de terceiros e à delicadeza psicológica, ética, densamente humana das relações assim geradas. O mesmo se passa, na perspectiva inversa, com a criança assim gerada: nove meses de gravidez são nove meses de gestação. Ou seja, há evidência bastante de que um útero não é só uma incubadora – é o útero de uma mãe.
E recordo também a infinidade dos problemas jurídicos e dos conflitos por solucionar a que vidas assim geradas poderiam, em abstracto, dar lugar, como vários têm chamado a atenção.
Só isso chega, a meu ver, para afastar como crucialmente inconveniente a introdução desse regime em Portugal.
Uma vida humana é, em si, simples: resulta do amor de um homem e de uma mulher. Não merece ser deliberadamente criada num psicodrama social, num embrulho psicológico denso, num novelo jurídico interminável. E isto, mesmo sem entrar sequer na questão de que a introdução da maternidade de substituição a título gracioso – como os projectos (BE, PS e PSD) unicamente procuravam agora – seria a inevitável antecâmara para a futura legalização das “barrigas de aluguer” e o favorecimento dos negócios mais deploráveis e degradantes.
10. Duas reflexões a terminar.
Tenho o maior respeito por todos os casais que desejavam ter filhos e não podem. Sei o que é esse drama. E, nesta matéria, intensamente pessoal, sem prejuízo de declarar e defender os meus próprios valores, abstenho-me de qualquer juízo.
Sei como a infertilidade é uma barreira duríssima à realização de componentes importantes da felicidade pessoal: o nosso próprio prolongamento noutra geração, como pai ou como mãe.
Mas, ao contrário do que frequentemente ouço dizer, eu penso que ninguém tem o “direito a ter filhos”. Acho que a palavra não é “direito”. Não é nem a palavra, nem o conceito. Não é a palavra; e não é o conceito.
Eu que, graças a Deus, fui pai, acho que nunca tive direito a nenhum dos meus filhos; e que não tenho direito a nenhum deles. Creio, aliás, falando da ideia e do conceito de “direitos”, que é mais o direito deles a terem pai, do que meu o direito a ter filhos. É deles o direito a terem pai e a terem mãe, tal como eu tive o meu direito a ter o meu pai e a minha mãe.
De pais para filhos, ninguém tem o direito a outrem, ninguém tem o direito sobre outrem.
O Direito, a linguagem jurídica, tem uma insuperável dificuldade em subsumir nos seus quadros realidades humanas que são muito mais densas e muito mais ricas, tal como acontece nomeadamente com todas as relações familiares e, mais ainda, quando consanguíneas. O Direito não tem outro remédio senão procurar enquadrá-las o melhor que pode e sabe. Mas, para o fazer – e não começar a ofender, em vez de servir, a realidade humana –, o Direito tem que ter a humildade de reconhecer a limitação dos seus quadros conceptuais e da sua ferramenta.
Por exemplo, eu creio que o casamento não é um contrato – é muito mais do que isso. A palavra “contrato” era apenas a coisa mais parecida de que o Direito Privado dispunha para o qualificar, quando as modernas leis civis quiseram enquadrar e regular o casamento. Mas todos – ou quase todos – coincidiremos em que o casamento não é da mesma ordem que a compra e venda, ou um mútuo, ou um comodato, ou um arrendamento ou aluguer, ou uma associação ou sociedade civil. É de outra ordem.
Também por exemplo, é conhecido que, em matéria do chamado “poder paternal”, mesmo a doutrina jurídica clássica, já em parte ultrapassada, teve sempre que dobrar a língua e dizer que esse “poder”, esse “direito”, não é bem um poder, mas um “poder-dever”, um “poder funcional”, isto é, um “direito”, se assim se pode dizer, mais no interesse do seu destinatário do que no interesse do seu titular.
A vida humana é mais rica do que a quadrícula mental do Direito. E o Direito corre o risco de agredir a pessoa humana, em vez de a servir, como é a mais nobre vocação do Direito, quando desatemos a fazer ginástica com os vocábulos jurídicos e os seus conceitos instrumentais, em vez de observarmos atentamente as realidades humanas a que os aplicamos.
Quanto tratamos de filhos, o fundamental são os filhos, a pessoa deles, a sua absoluta integridade pessoal, desde a sua identidade plena à sua dignidade inviolável. Não há direito quanto a eles, não há direito sobre eles.
A medicina pode ser importante ajuda aos pais em falha de saúde reprodutiva, ou clinicamente assistida e verificada; mas a medicina, porque é medicina, não deve ser instrumentalizada, a meu ver, como uma engenharia de substituição. Nem a medicina, nem os serviços sociais.
11. Enfim, segunda reflexão, sobre a adopção.
Em todos os quadros de PMA heteróloga e de maternidade de substituição, há uma componente implícita, não declarada, de adopção. Mesmo tratando-se de um filho gerado ex novo, o recurso técnico a material genético de terceiros ou a um útero alheio representa, em certa medida, o estabelecimento jurídico – e afectivo – de uma filiação que não é a filiação biológica, isto é, implicitamente de uma “adopção” parcelar, nos planos afectivo e jurídico.
Ora, além dos outros problemas éticos e humanos inerentes a essas situações, eu creio que, assim sendo, então a resposta social mais correcta é a adopção propriamente dita.
Sabemos o drama das crianças por adoptar. E conhecemos a necessidade de maior sensibilização para o instituto da adopção. É importante ampliar, em vez de estreitar, a consciência a este respeito.
Por isso, penso que essa deve constituir também, sempre com forte sensibilidade humana, uma clara prioridade social, naqueles casos de casais com forte vocação parental e que quadros de infertilidade ou esterilidade privem de ter filhos (ou de ter mais filhos) biológicos.
A melhor alternativa social à filiação biológica é, penso, a filiação adoptiva.
Lisboa, Palácio de S. Bento, 20 de Janeiro de 2012
O deputado do CDS-PP,
José Ribeiro e Castro
4 comentários:
Caro Deputado Ribeiro e Castro,
concordo com 99% do que escreveu.
A minha discordância está na questão da inseminação artificial, pois este processo exige a produção de mais embriões do que as crianças que chegarão a nascer. A ciência ainda não conseguiu ultrapassar esta questão.
Logo, a destruição de embriões (vulgo «aborto»), é inerente ao processo.
Os problemas técnicos da inseminação artificial são independentes de quem forneceu os gâmetas ou de para quem se destina o embrião.
Ou seja, é irrelevante que se trate dum casal heterossexual, duma parelha homossexual, de solitários, transexuais, ou de outros que por aí se inventem, haverá sempre abortos com a aplicação desta técnica, tal como ela é actualmente.
Daí que eu seja contra a inseminação artificial, em qualquer caso.
Aliás, eu acho que o António escreveu um excelente argumento para banir aquela técnica:
«Mas, ao contrário do que frequentemente oiço dizer, eu penso que ninguém tem o “direito a ter filhos”.»
Como saberá, o uso da inseminação artificial é defendido, precisamente, com o argumento do suposto “direito a ter filhos”.
Ora, como o António escreveu, logo a seguir à frase acima:
«Acho que a palavra não é “direito”. Não é nem a palavra, nem o conceito. Não é a palavra; e não é o conceito.»
Na minha opinião de cidadão, que desconhece os «intricados novelos» da lei, julgo que não existindo o suposto “direito a ter filhos”, então deixa de haver justificação jurídica para a legalidade da inseminação artificial, em qualquer caso.
O que acha?
Obrigado pelo seu trabalho na AR, e mais além.
Pedro Alves
Já devia ter respondido. Desculpe a demora.
Efectivamente, não estou de acordo consigo. Considero plenamente legítima no plano ético a PMA em casal, homóloga. O argumento que invoca - de sempre se perderem embriões no processo - não diminui a legitimidade ética da mesma. Também sem PMA se perdem embriões, no processo inteiramente natural, e não é por causa disso que os casais se atormentam a ponto de deixarem de ter filhos ou de os procurarem ter.
Antigamente, aliás, era da literatura que as famílias tinham muitos filhos, porque a mortalidade infantil era muito elevada. Como se dizia, numa linguagem que hoje pode chocar, mas que era comum, esses filhos "não vingavam". Até há poucas décadas atrás, a mortalidade peri-natal e a mortalidade infantil eras elevadas entre nós. E, em Angola, por exemplo, a mortalidade infantil até aos 5 anoso de idade era tão alta quanto vitimava cerca de 1/3 das crianças nascidas. Ora, nada destas tristes circunstâncias, impedia os pais de terem filhos - ou os atormentava na dinâmica de terem filhos.
O mesmo se passa, a meu ver, na PMA homóloga. Os embriões devem ser limitados na sua produção, por razões éticas. Mas, vindo a morrer alguns naturalmente, não vem daí, segundo penso, qualquer dificuldade ou problema ético de maior.
Também discordo de se usar expressões como "inseminação artificial" e que apenas tenderia a degradar, no plano da linguagem, os casais que têm que recorrer à PMA. Essa expressão, aliás, não corresponde sequer a todas as técnicas usadas.
Creio que é errado atormentar mais os casais que recorrem à PMA homóloga para superarem problemas clínicos de infertilidade. E esse recurso não é expressão de qualquer "direito a ter filhos" por todas as formas e feitios. É tão-só a realização de um desejo natural e humano de ter filhos próprios - isto é, biológicos - , fazendo-o neste caso num quadro ético que reputo de inatacável.
Melhores cumprimentos.
José Ribeiro e Castro
Concordo, com tudo.
Em particular no que respeita às células estaminais, o avanço científico deve ser feito nas células adultas.
Já em Novembro de 2003 dei um contributo singelo na análise do Relatório Liese, onde ao de leve foram discutidos os prós e os contras das medidas ali em causa.
A quem interessar o tema...
http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?type=CRE&reference=20031117&secondRef=ITEM-006&format=XML&language=PT
e
http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?type=CRE&reference=20031119&secondRef=ITEM-005&format=XML&language=PT
Pedro:
De facto, isto não há como estudarmos os assuntos e formarmos a nossa própria posição. Bem informada.
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