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quarta-feira, 12 de junho de 2019

Obrigado, cidadãos!

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de José Ribeiro e Castro, saído hoje no jornal i.

É gratificante verificar que a petição tenha mobilizado não só milhares de cidadãos, mas, entre estes, figuras destacadas da sociedade portuguesa em diferentes setores de atividade.


Obrigado, cidadãos!
Deve estar quase a concluir-se o processo parlamentar da petição “Legislar o poder de os cidadãos escolherem e elegerem os seus Deputados”, por que 7.372 cidadãos (até esta altura) pedem à Assembleia da República que dê seguimento ao disposto na Constituição e nos permita, aos eleitores, que possamos escolher, nas eleições legislativas, não só o partido da nossa preferência, mas também o deputado que queremos.

É gratificante verificar que a petição tenha mobilizado não só milhares de cidadãos, mas, entre estes, figuras destacadas da sociedade portuguesa em diferentes sectores de actividade. É, na verdade, uma ampla e significativa frente cívica independente, que reclama dos legisladores aquilo que é nosso direito: democracia de qualidade conforme à Constituição, democracia de cidadania.

Como co-autor do projecto de lei de reforma eleitoral e primeiro subscritor pela APDQ e pela SEDES, a todos agradeço, nomeando os mais destacados que consegui identificar, por ordem inversa da assinatura (com indicação do seu número de ordem), e pedindo desculpa a todos os outros por não os nomear também:
Teresa da Fonseca Gonçalves, 7216, bióloga e professora universitária

Nuno Amado, 7181, presidente do Millennium BCP

José de Almeida Serra, 7175, político, ex-ministro do Mar

Cristóvão Norte, 7161, economista e jurista, deputado

Luís Aguiar-Conraria, 7129, economista, professor universitário e cronista

Alexandre Patrício Gouveia, 7115, economista e gestor

Jorge Moita Vieira, 6939, estudante e coautor do projeto de lei de reforma eleitoral

António-Pedro Vasconcelos, 6811, cineasta

José Manuel Martins Lopes, 6769, filósofo, professor universitário, diretor da Faculdade de Filosofia de Braga

José de Paiva Boléo-Tomé, 6726, médico, professor universitário, publicista e ensaísta

Alexandre José Linhares Furtado, 6725, médico, cirurgião, Prémio Nacional da Saúde 2011

António Sevinate Pinto, 6667, perito em sementes, dirigente associativo e gestor no setor agrícola

Jacinto Monteiro, 6666, médico e professor universitário

Eduardo Oliveira e Sousa, 6657, engenheiro agrónomo, presidente da CAP

Roberto Carneiro, 6487, professor universitário, ex-ministro da Educação

Isabel de Bragança, 6441, princesa real e duquesa de Bragança

Miguel Frasquilho, 6420, economista, ex-deputado, presidente da TAP

Francisco Fernandes do Vale, 6400, médico, professor universitário

Carlos Seruca Salgado, 6369, vice-presidente da ANAC

Manuel Barroso Silvério Marques, 6353, médico, ex-ministro da Ciência e Tecnologia, ex-membro do CNECV

General Aurélio Aleixo Corbal, 6302, oficial da Força Aérea, ex-CEMFA

Manuel de Almeida Ribeiro, 6263, jurista, professor universitário

Luísa Antas, 6257, mestra em Direito por Harvard, administradora do Banco Finantia

João Marques Vidal, 6098, procurador-geral adjunto

Manuel de Almeida Damásio, 5593, presidente do Grupo Lusófona

Conceição Pedroso de Lima, 5581, professora catedrática de Ciências da Vida

António Pinto Basto, 5547, fadista

Eduardo Catroga, 5512, professor universitário, gestor, ex-ministro das Finanças

Rui Moura Ramos, 5453, professor universitário, ex-presidente do Tribunal Constitucional

Luís Filipe Rocha, 5300, cineasta

Margarida Corrêa de Aguiar, 5297, economista, presidente da Cidadania Social, ex-secretária de Estado da Segurança Social

General Garcia Leandro, 5272, oficial do Exército, ex-governador de Macau

Inês Serra Lopes, 5271, advogada e jornalista

Francisco Mantero, 5269, presidente do Conselho Estratégico para a Cooperação, Desenvolvimento e Lusofonia Económica da CIP

Pedro Rebelo de Sousa, 5238, advogado

Luís Campos e Cunha, 4821, professor universitário, ex-ministro das Finanças

João Varandas Fernandes, 4810, médico, político e dirigente desportivo

Emília Nadal, 4535, artista plástica

Almirante Francisco Vidal Abreu, 4190, oficial de Marinha, ex-CEMA, presidente do conselho académico da Academia de Marinha

Nuno Cardoso, 3857, engenheiro, ex--presidente da Câmara Municipal do Porto

José Rueff Tavares, 3626, médico e investigador, ex-membro do CNECV

Bruno Bobone, 3625, empresário português, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa

Eduardo Marçal Grilo, 3567, engenheiro, ex-ministro da Educação, administrador da Fundação Calouste Gulbenkian

Afonso Pereira Inácio, 3542, economista, dirigente da APDQ

Sofia Afonso Ferreira, 3314, fundadora do Democracia21

Luís Mira Amaral, 2609, engenheiro e economista, administrador de empresas, professor universitário, ex-ministro da Indústria

Rui Vilar, 2570, jurista, gestor e administrador de empresas, ex-ministro em diferentes pastas, ex-presidente da Fundação Calouste Gulbenkian

Manuel Tinoco de Faria, 2520, advogado

Jorge da Paz Rodrigues, 2444, líder de movimentos cívicos

Laura Vidal, 2404, fundadora e líder da Conexão Lusófona

Rui Reininho, 2402, músico

Nuno Ribeiro da Silva, 2383, economista, ex-secretário de Estado, presidente da Endesa Portugal

General Quesada Pastor, 2319, oficial do Exército

Almirante António Rebelo Duarte, 2297, oficial da Marinha

Sofia Galvão, 2296, advogada, ex-secretária de Estado

Francisco Oliveira Dias, 2263, médico, ex-presidente da Assembleia da República (entretanto, já falecido)

João Bosco Mota Amaral, 2244, jurista, ex-presidente do Governo Regional dos Açores, ex-presidente da Assembleia da República

Esmeralda Dourado, 2184, engenheira, gestora e administradora de empresas

Agostinho Pereira de Miranda, 2168, advogado, fundador da Miranda Alliance

Paulo Carmona, 2156, gestor, presidente do FAE – Fórum dos Administradores de Empresa

Rosalia Vargas, 2153, presidente da Agência Ciência Viva

Almirante António Balcão Reis, 2145, oficial da Marinha

Almirante Nuno Vieira Matias, 2140, oficial da Marinha, ex-CEMA

Pedro Velez, 2080, jurista, professor universitário e coautor do projeto de lei de reforma eleitoral

Maria Ester Vargas, 2009, professora, ex-deputada

Margarida Mercês de Mello, 1994, apresentadora de televisão, autora e realizadora de documentários

José Marques Vidal, 1993, magistrado do Ministério Público, ex-vice-procurador-geral da República, ex-diretor-geral da Polícia Judiciária e juiz conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo

Nuno Roby Amorim, 1978, ex-jornalista, consultor de comunicação

Isilda Pegado, 1972, advogada, ex-deputada, dirigente da FPV

Margarida Gonçalves Neto, 1962, médica, ex-coordenadora nacional para os Assuntos da Família

José da Silva Peneda, 1956, economista, ex-ministro do Trabalho, ex-deputado ao Parlamento Europeu

Carina João Oliveira, 1946, engenheira civil, ex-deputada

Jorge Marrão, 1918, auditor, diretor da Deloitte, presidente da Missão Crescimento

Jacinto Lucas Pires, 1916, escritor

Matilde Sousa Franco, 1875, historiadora, académica, ex-deputada

Hélio Loureiro, 1885, chef

António Gentil Martins, 1814, médico

Manuel Braga da Cruz, 1796, professor universitário, ex-reitor da Universidade Católica

General José Rocha Vieira, 1717, oficial do Exército, ex-governador de Macau

Joaquim Vairinhos, 1707, ex-presidente da Câmara Municipal de Loulé, ex-deputado ao Parlamento Europeu

José Sucena Paiva, 1700, professor universitário e cientista, fundador e primeiro presidente do conselho de administração do Taguspark

José Roquette, 1632, economista, empresário, ex-banqueiro e ex-dirigente desportivo

Miguel Cadilhe, 1597, economista e político, ex-ministro das Finanças

Guilherme Valente, 1518, editor

Carlos Móia, 1464, empresário e dirigente desportivo

António Pinheiro Torres, 1459, advogado e ex-deputado

Martim Borges de Freitas, 1456, ex-dirigente parlamentar, dirigente associativo empresarial

Luís Cabral da Silva, 1454, engenheiro, especialista em transportes e vias de comunicação

Michael Rothwell, 1431, professor, dirigente da Comunidade Judaica do Porto

Manuel Serrão, 1422, empresário, comentador na televisão

Ana Cid Gonçalves, 1418, secretária-geral da APFN

Afonso Camões, 1254, jornalista e gestor

Fernando Paes Afonso, 1166, economista, gestor, ex-vice-provedor da SCML

Fernando Adão da Fonseca, 1164, economista, professor universitário, administrador de empresas, fundador do Fórum para a Liberdade de Educação

Marco Galinha, 1143, empresário

José de Melo Alexandrino, 1020, jurista, professor universitário

António Capucho, 987, político, ex-deputado nacional e europeu, ex-ministro, ex-conselheiro de Estado

Tiago Craveiro, 696, dirigente da FPF

Pedro Quartin Graça, 406, advogado, professor universitário e político, ex-deputado

Ventura Leite, 341, economista, político, ex-deputado

Henrique Neto, 278, empresário e gestor, ex-deputado, ex-candidato à Presidência da República

António Barreto, 227, cientista social, político, ex-ministro da Agricultura, investigador e cronista

Manuel Ramalhete, 82, economista e professor universitário

José de Azevedo Pereira, 51, economista, professor universitário, ex-presidente da Autoridade Tributária, dirigente da SEDES

Pedro Sampaio Nunes, 41, engenheiro, ex-vice-provedor da SCML, alto dirigente na Comissão Europeia, ex-secretário de Estado

João Luís Mota Campos, 36, advogado, ex-secretário de Estado da Justiça, dirigente da APDQ

José António Girão, 33, economista, professor universitário, dirigente da APDQ

Rui Paiva, 32, empresário, dirigente da SEDES

Ana Marta Castro, 23, advogada, coautora do projeto de lei de reforma eleitoral

António Pinho Cardão, 22, economista, administrador de empresas, dirigente da APDQ

António José Mocho, 21, consultor de comunicação, dirigente da APDQ

João de Jesus Ferreira, 14, engenheiro e consultor

Álvaro Beleza, 12, médico e político, dirigente da SEDES

Clemente Pedro Nunes, 11, engenheiro, professor universitário, empresário

João Duque, 10, economista, professor universitário, presidente da SEDES

Fernando Teixeira Mendes, 9, engenheiro, empresário, dirigente da APDQ

Gustavo Mesquita Guimarães, 6, economista, gestor, empresário

Gonçalo Carrilho, 5, jurista, assistente universitário, coautor do projeto de lei de reforma eleitoral

Maria João Louro, 4, economista, consultora, dirigente da SEDES

Luís Alves Monteiro, 3, engenheiro, administrador de empresas, presidente do Instituto Francisco Sá Carneiro

A petição ainda pode ser subscrita em: https://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania

Muito obrigado a todos pelo apoio a esta causa de cidadania.


José RIBEIRO E CASTRO
Advogado
Subscritor do Manifesto "Por uma Democracia de Qualidade"

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Reforma do Sistema Eleitoral – Um desafio urgente e imperioso para benefício de todos

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Fernando Teixeira Mendes, saído hoje no jornal i.
Círculos uninominais cobrem todo o território. Apenas o candidato mais votado é escolhido. Só assim se passarão a discutir na AR os assuntos que interessam aos cidadãos.


Reforma do Sistema Eleitoral – Um desafio urgente e imperioso para benefício de todos 
A Sociedade Civil está de forma generalizada de acordo em que é preciso encetar um processo de melhoria da nossa classe política.

Políticos que aceitam de ânimo leve que os portugueses sejam obrigados a colocar quase 20.000 M€ num sistema bancário onde foram feitas negociatas hediondas, políticos que gerem um Estado que não protege os cidadãos e que seguem uma filosofia de maior Estado pior Estado, políticos que legislam criando um Sistema Elétrico Nacional muito ineficiente e com tarifas altíssimas para os consumidores de um bem indispensável como a eletricidade, políticos que não implementam as muitas sinergias possíveis através de uma reengenharia a nível do Estado, mais conhecida por Reforma do Estado, políticos que se queixam muito do défice Orçamental como argumentação para o tradicional aumento da fiscalidade sobre tudo e todos, políticos ainda que, contra a vontade generalizada da Sociedade Civil, afastaram Joana Marques Vidal de Procuradora-Geral da República devem ser avaliados e escrutinados de outra forma pelos eleitores.

Estamos atualmente num período de importância capital que a Sociedade Civil não pode de forma alguma desperdiçar. Conseguimos, graças ao grande empenho e capacidade de José Ribeiro e Castro e de uma equipa por ele criada de motivados juristas, elaborar a Petição à Assembleia da República “Legislar o Poder de os Cidadãos Escolherem e Elegerem os seus Deputados”. Para que seja efetuada uma profunda Reforma do Sistema Eleitoral, peço a todos os leitores que assinem e divulguem esta importante Petição através do link: https://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania.

Graças ao trabalho notável desse Grupo, pudemos apresentar um muito completo Projeto de Proposta de Lei baseado nos trabalhos que temos vindo a realizar nos últimos anos.

Juntamente com a Sedes, a APDQ – Associação Por Uma Democracia de Qualidade, elaborou uma proposta de grande relevo da Reforma do Sistema Eleitoral, apontando para uma Assembleia da República com 105 Deputados eleitos pelo mesmo número de círculos uninominais, 105 Deputados eleitos por círculos regionais correspondentes aos distritos, 15 Deputados eleitos num Círculo Nacional de Compensação para garantir a proporcionalidade da representação parlamentar e 4 Deputados eleitos pelos Círculos da Emigração. Uma Assembleia da República com 229 Deputados e com a alteração do Sistema Eleitoral que a nossa Constituição prevê há já vinte anos!

Círculos uninominais são, como sabemos, círculos que no seu conjunto cobrem todo o território nacional e para os quais existe no boletim de voto uma segunda coluna para que se faça uma votação específica num candidato, entre os que se apresentam no círculo uninominal.

Em cada um deles, apenas o candidato mais votado é escolhido para entrar no hemiciclo. Tipicamente cada círculo agrupará aproximadamente 75 000 eleitores. Estes círculos são cruciais porque os eleitos neles são a génese de uma ligação muito mais profunda entre eleitos e eleitores. Só assim na Assembleia da República se passarão a discutir os assuntos que interessam aos cidadãos e muitos Deputados deixarão de ser escolhidos de forma ditatorial pelos diretórios dos partidos.

Tal como já mencionei nestes Artigos, um Deputado da Nação contou-me, há algum tempo, que tinha feito várias viagens com deputados de outros países e constatou que, enquanto os deputados estrangeiros regressavam aos seus países para fazerem contactos com os eleitores dos círculos uninominais onde tinham sido eleitos, os deputados portugueses ficavam a fazer turismo longe de casa. Isto passou-se exatamente no fim duma sessão empresarial em que Rui Rio expressou a opinião de que o atual Sistema Eleitoral para a Assembleia da República está esgotado, que é necessário escolher outro.

Neste início de 2019, apesar de se terem passado já alguns meses, não esqueço o discurso notável de Margarida Balseiro Lopes na Assembleia da República, em 25 de Abril do ano passado, e que dada a sua relevância voltei agora a rever. Um discurso notável, de correção para com todas as bancadas parlamentares, mesmo para com aquelas que não a aplaudiram ao terminar. Notável, também, pelo empenho em agradecer à geração que lhe permitiu viver em liberdade, não abdicando da luta pela melhoria da nossa Democracia. Criticando, contudo, expressões inaceitáveis, muito usadas hoje, como por exemplo: nós os políticos e eles o povo.

Notável no que se refere ao importante combate à corrupção que enriquece ilicitamente particulares e partidos políticos e possibilita a captura das entidades públicas por entidades privadas. Um combate que tem de ser continuado com muito mais eficiência e sem dar tréguas aos prevaricadores que têm de passar a ter respeito pelo nosso Sistema Judicial.

O PAC – Plano de Ação Concreto para o Projeto que Margarida Balseiro Lopes apelidou de O Portugal por fazer, será um programa extenso e que, quanto a mim, tem de começar exatamente pela Reforma do Sistema Político e mais especificamente pela Reforma do Sistema Eleitoral para a Assembleia da República. Feita esta Reforma muitos dos restantes problemas serão resolvidos por arrasto.

Por isso, neste momento em que desejo aos Leitores um Ótimo Ano de 2019, volto a pedir para assinarem e divulgarem a Petição “Legislar o Poder de os Cidadãos Escolherem e Elegerem os seus Deputados” através do link: https://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania
Quaisquer dúvidas podem ser esclarecidas e ou debatidas através do email: porumademocraciadequalidade@gmail.com
Fernando TEIXEIRA MENDES
Gestor de empresas, Engenheiro
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade
NOTA: artigo publicado no jornal i.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

As virtudes da democracia

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Henrique Neto, saído hoje no jornal i.
Portugal é hoje um país doente, governado por impulsos de curto prazo, em que a grande preocupação é a conquista e a preservação do poder, afastados da realidade política e económica, nacional e internacional, ou de uma estratégia de desenvolvimento, que, aliás, verdadeiramente nunca existiu.


As virtudes da democracia

Nestes textos semanais, os subscritores do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade” têm defendido a democratização do regime político e a reforma das leis eleitorais, mas escrito menos acerca das consequências negativas, quer políticas quer económicas, resultantes da inexistência de verdadeiros órgãos democráticos de fiscalização dos governos, o que permitiu a governamentalização do regime – o que resulta do seguidismo partidário e da falta de qualidade e de independência dos deputados escolhidos para a Assembleia da República, qualidade que tem piorado com o tempo e por força do crescente sentimento de impunidade da classe política.
Ou seja, a vitória da fidelidade ao chefe e do conformismo à custa da competência e do mérito tornou-se uma forte característica do regime político português, consequência que se esperaria do critério usado na escolha dos representantes do povo por meios autocráticos das direções partidárias, em que os objetivos de poder dos partidos se sobrepõem ao interesse nacional. Já aqui escrevi que se trata de um modelo em que os chefes escolhem os índios de maior confiança e os índios, agradecidos, “elegem” o chefe, sem que os eleitores tenham qualquer poder na escolha dos deputados.

Também, como seria de esperar, centralizar todo o poder político no topo dos partidos, à custa da liberdade e do poder de intervenção política e social dos cidadãos e das instituições da sociedade, é o resultado da falta de competência e de seriedade, ética e política, dos escolhidos pelos partidos para governar Portugal, com a consequência lógica do crescimento da corrupção. Há, naturalmente, exceções, mas que não alteram a realidade do atraso crescente de Portugal relativamente à generalidade dos outros países da União Europeia, com sistemas eleitorais democráticos.

Assim, apesar de todas as promessas feitas e das bem-aventuranças prometidas pelos partidos políticos, Portugal é hoje um país doente, governado por impulsos de curto prazo, em que a grande preocupação é a conquista e a preservação do poder, afastados da realidade política e económica, nacional e internacional, ou de uma estratégia de desenvolvimento, que, aliás, verdadeiramente nunca existiu. O que existe é a incapacidade dos governos de prever e de antever o futuro, para centrar toda a sua atenção e recursos na conjuntura.

Não surpreende, portanto, que Portugal continue a afastar-se dos restantes países da União Europeia. Sobre isso, cito o prof. Nuno Garoupa: “Se os números não estiverem completamente errados, Portugal terá sido ultrapassado em 2018 pelos países do Alargamento. República Checa, Eslovénia, Eslováquia, repúblicas bálticas têm agora um rendimento per capita superior ao português . Não tinham há 15 anos. E eram países significativamente mais atrasados que Portugal há 30 anos. Mas as más notícias não param. Portugal desceu de 84% em 1999 para 78% do rendimento per capita europeu em 2018. Portugal está hoje mais distante da média europeia do que em 1999. E ainda há mais. Olhando os países que ainda estão atrás de Portugal em 2018, se as trajetórias de crescimento não forem significativamente alteradas, Croácia, Hungria e Polónia ultrapassarão Portugal na próxima década. Quer isso dizer que, dentro de dez anos, com enorme probabilidade, apenas a Bulgária e a Roménia serão mais pobres que Portugal. E veremos o caso grego.”
Não se trata de um acaso e, para compreender melhor algumas causas económicas do nosso atraso, bastará atentar em alguns dos erros que os governos portugueses cometeram ao longo dos anos e comparar com o que fizeram os outros países que previram a evolução futura da Europa e do mundo. Por exemplo:

– Desperdiçámos a oportunidade de ter uma estratégia euro-atlântica, de acordo com a nossa posição geográfica, a nossa história e a nossa experiência universalista;

– Privilegiámos os produtos e bens não transacionáveis à custa dos transacionáveis. Ler a este respeito o que escreveu em livro o economista Vítor Bento;

– Os governos desenvolveram uma logística interna – autoestradas – e privilegiaram o mercado interno à custa da logística externa – marítima e ferroviária – e das exportações;

– Quando toda a Europa apostou na ferrovia e no uso de energias renováveis nos transportes, os governos portugueses apostaram na rodovia e nas energias de origem fóssil;

– Sucessivos governos privilegiaram o transporte individual e desleixaram o transporte coletivo;

– Na educação, em vez de exigência, os governos escolheram o facilitismo, em detrimento de uma sólida formação de base – creches e pré-escolar –; privilegiaram o topo – ensino universitário – e, infelizmente, sem quaisquer critérios de empregabilidade. Como resultado, formámos jovens para o desemprego e para a emigração.

Em resumo, podemos dizer que aquilo que os governos portugueses fizeram é o contrário do que os outros países europeus andaram a fazer. De facto, os governos portugueses teriam acertado se tivessem feito o contrário do que fizeram e Portugal seria hoje um país diferente.

A nossa convicção é a de que tudo teria sido melhor se os portugueses tivessem escolhido os seus representantes de entre os cidadãos que conhecem e merecem a sua confiança. Infelizmente, não foi isso que aconteceu e os escolhidos pelas direções partidárias não têm sido suficientemente sérios, suficientemente competentes e suficientemente dedicados ao bem público para fazerem as escolhas que, estou certo, resultariam do debate democrático.

Com toda a probabilidade, teríamos tido governos e primeiros-ministros com maior visão estratégica, mais sérios e mais competentes do que tivemos. Na realidade, tivemos governantes que, sendo sérios, não eram competentes e outros que, sendo competentes, não eram sérios.

Repito para que não esqueçamos: se as regras eleitorais portuguesas fossem verdadeiramente democráticas, em que os eleitores escolhessem livremente os seus representantes, as virtudes do debate democrático teriam conduzido a melhores governantes e teriam sido evitados muitos erros e desperdícios Além disso, com melhores deputados e melhores governantes, teria sido evitada muita da corrupção que está a destruir a democracia portuguesa.

Termino com a pergunta: porque será que nenhum dos partidos sentados na Assembleia da República aceita rever as leis eleitorais?
Henrique NETO
Empresário
Subscritor do Manifesto Por uma Democracia de Qualidade

NOTA: artigo publicado no jornal i.

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Reformas com sentido: o caso da formação e da educação

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de José António Girão, hoje saído no jornal i.
Existe uma acentuada distorção entre oferta e procura no mercado do emprego. A legião de licenciados nos call centers e caixas de supermercado é uma prova inequívoca disso.


Reformas com sentido: o caso da formação e da educação 
É de há muito sabido e geralmente aceite que a economia portuguesa sofre de um conjunto de desequilíbrios significativos, resultantes de debilidades estruturais que têm de ser analisadas conjuntamente e objeto de políticas concertadas, como via indispensável à resolução dos mesmos e forma de conseguir um desenvolvimento sustentável. Em síntese, trata-se de uma estratégia que tenha em consideração a dependência entre desenvolvimento económico e as alterações necessárias na esfera sociopolítica. Estas situam-se ao nível das instituições e determinam a qualidade da governança, as quais são tanto mais importantes quanto menor o nível de desenvolvimento do país.

Se outras razões não houvesse, reside aqui uma das motivações subjacentes ao “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade” e da iniciativa de um grupo de cidadãos para que seja institucionalizada a existência de círculos uninominais e tornar possível a eleição de deputados diretamente escolhidos pelo voto individual dos cidadãos, em lugar de por diretórios dos partidos, como atualmente.

Retomando a questão das debilidades estruturais, uma das mais determinantes é a estrutura produtiva e seu impacto na competitividade. Neste domínio convém ter presente a teoria de Porter das três etapas do desenvolvimento. Na primeira, os países competem com produtos de baixo valor acrescentado, i.e., incorporando basicamente fatores produtivos primários ou rudimentares. A segunda fase é a da eficiência, resultante e tornada possível pela apropriada formação e valorização do fator trabalho, por forma a permitir a eficaz utilização da tecnologia e das economias de escala. Por último, a terceira fase é a da inovação, em que o conhecimento é o fator decisivo, gerador de atividades de alto valor acrescentado. Nesta fase, os agentes criativos, que detetam novas oportunidades de negócio (empreendedorismo), substituem tipicamente os empresários das empresas tradicionais de base tecnológica.

Esta reflexão é particularmente relevante se tivermos em conta as baixas qualificações da população portuguesa. Estima-se em cerca de 50% a proporção da população entre os 25 e os 64 anos com instrução somente ao nível de nove anos de escolaridade (na UE, essa proporção é apenas de 25%). Do mesmo modo, a taxa de abandono precoce da escolaridade (sem o 12.º ano) situa-se nos 12,6% (maior no sexo masculino e inferior no feminino), contra 10,6% na UE. Convém no entanto assinalar que, em larga medida, tal resulta de um ensino largamente desajustado das preferências e aptidões de uma parte significativa dos estudantes, que não revelam motivação e apetência para um ensino básico regular, predominantemente orientado para um ensino secundário como porta de entrada para um ensino superior de tipo universitário, em que a dimensão vocacional e profissionalizante está largamente ausente.

Urge, pois, alterar a presente situação, em grande parte resultante da preocupação (legítima), sentida no pós-25 de Abril, de eliminar a margem de discriminação social associada ao ensino técnico, resultante da reforma educativa de 1947-48. A questão do acesso ao ensino superior passou, assim, a ser entendida como uma condição de igualdade de oportunidades. Contudo, as novas e atuais condições económicas e sociais tornam evidente a insuficiência quantitativa e qualitativa da formação profissional gerada pelo atual sistema educativo. Existe claramente uma acentuada distorção entre a oferta e a procura no mercado do emprego: as empresas não conseguem recrutar os profissionais de que necessitam; em contrapartida, há cursos para cujos diplomados não há procura. A legião de licenciados nos call centers e caixas de supermercados são prova inequívoca desse desajustamento.

Além da desmotivação que daqui resulta para a juventude, acresce a má afetação de recursos daí resultante, na medida em que o suposto investimento no sistema educativo não conduz a uma taxa de retorno que o justifique. Impõe-se, assim, a reforma do sistema educativo atual, prestigiando a componente profissionalizante do ensino, tornando-a atrativa aos gostos e apetências dos estudantes e mais valiosa, porque devidamente articulada com as necessidades do mercado de trabalho; simultaneamente, deverá oferecer possibilidades reais de evolução efetiva para outras níveis e vias de ensino.

Em matéria de políticas públicas no âmbito da educação, face às necessidades decorrentes da inovação e desenvolvimento económico, convém igualmente ter em mente as que decorrem das profundas alterações a que estamos a assistir e que se acentuarão ainda mais no futuro, nomeadamente nos domínios das tecnologias da informação e plataformas digitais e suas implicações ao nível das diferentes profissões e competências. Parece, pois, oportuno começar a pensar nas consequências que daí decorrem a nível formativo.

Com efeito, não parece ousado pensar que a prática profissional no futuro comporte exigências e competências em certos domínios específicos, independentemente da área profissional de exercício, dando origem a novas áreas de especialização. É o caso da informática e análise de grandes bancos de dados (big data mining), que poderão vir a integrar diferentes especializações, ou áreas de competência novas, com evidentes repercussões a nível curricular. Por exemplo, poderemos vir a assistir a que os curricula dos diferentes cursos deixem de ter o formato que hoje conhecemos e em seu lugar surjam cursos tailor made de acordo com os interesses, vocação e aptidões dos alunos, disponibilizando as universidades não as licenciaturas “tradicionais “ que conhecemos, mas um conjunto de módulos de disciplinas nas diferentes áreas científicas, de entre os quais o aluno selecionará cinco ou seis (no respeito pelas correspondentes condições de acesso) por forma a adquirir o perfil e competências do seu agrado. Seria, assim, possível que certos domínios da informática passassem a integrar a formação de médicos, engenheiros e economistas (por exemplo) e que certos domínios da formação destes profissionais passassem igualmente a fazer parte de certas áreas da formação em ciências comportamentais e de âmbito social.

Se a inteligência artificial (IA) é parte do mundo novo que antevemos, convém não esquecer que é a inteligência que tem ditado o progresso da humanidade e que, artificial ou não, ela terá de continuar a estar ao serviço da humanidade e a ter em conta a dimensão e diversidade humana... Estamos em crer que será mais útil e eficaz o governo preocupar-se com toda esta problemática do que ocupar-se em reduzir propinas de forma indiscriminada ou tentar, através de quotas, afetar a distribuição dos estudantes. Afigura-se preferível que se centre na promoção da atividade regional, por forma a conseguir uma melhoria da sua oferta, incluindo a formativa/educativa, sem impor limitações à atuação das regiões do litoral, as quais importa igualmente continuar a valorizar, no quadro da competição global, com vista ao seu desenvolvimento.

José António GIRÃO
Professor da FE/UNL
Subscritor do Manifesto Por uma Democracia de Qualidade


sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Portugal, a Europa e as interligações elétricas com França

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Clemente Pedro Nunes, ontem saído no jornal i.

A abertura ao “mercado elétrico europeu” vai pôr em causa vários interesses instalados que têm vivido protegidos, nomeadamente pelas FIT, que são por si só o maior atentado à livre concorrência, pelo que resta alguma expetativa sobre a concretização do que ficou acordado na Cimeira de Lisboa.

Portugal, a Europa e as interligações elétricas com França
A realização da cimeira em Lisboa, a 27 de julho de 2018, que contou com o presidente de França, o primeiro-ministro espanhol, o comissário europeu para a Energia e a vice-presidente do Banco Europeu de Investimento, para reforçar drasticamente as interligações elétricas entre a França e a península Ibérica foi muito relevante para Portugal e para a Europa.

Nunca os mais altos responsáveis de França, de Espanha e de Portugal se haviam encontrado para darem urgência a um projeto estratégico da maior relevância prática: construir uma nova interconexão elétrica com uma potência de 5500 MW que irá ligar o sul de França a Espanha, ao longo da costa do golfo da Biscaia.

Numa altura em que perde terreno relativamente aos gigantes económicos – os Estados Unidos da América e a China –, é da maior importância que a União Europeia não se deixe afundar ainda mais e aposte em projetos que reforcem a competitividade económica e a utilização racional de todas as formas de produção de eletricidade na Europa.

No caso português, as empresas e as famílias têm sido vítimas, há mais de 12 anos, duma política nefasta que visa introduzir sob pressão legislativa” as renováveis intermitentes no sistema elétrico, obrigando os consumidores a pagar por esse facto um preço exorbitante e a acumular uma enorme dívida tarifária que atinge ainda 3.800 milhões de euros.

O que esteve na origem desta desgraça foi o “cocktail explosivo” dos preços de eletricidade, proveniente da “mistura” das feed-in tariffs (FIT) concedidas às renováveis intermitentes com os CAE/CMEC concedidos às centrais térmicas clássicas, que não vai ser resolvido pelo reforço em 5500 MW das interligações elétricas com França.

Todavia, esta nova interligação elétrica com França vai proporcionar, logo após a sua concretização, quatro importantes vantagens:

a) Os 15% de eletricidade que estão em mercado passarão a estar sujeitos a mais ofertas, o que permitirá uma baixa do respetivo preço;

b) Dado que as FIT abrangem hoje 6000 MW de potência intermitente – muito mais do que os 3800 MW de consumo nas horas de vazio –, esta nova interligação permitirá alargar os potenciais compradores dos excedentes assim artificialmente criados;

c) Os produtores elétricos sem FIT, sempre que fiquem sem consumidores em Portugal devido à entrada no sistema de fontes intermitentes com FIT, poderão ter alternativas de consumo de forma a reduzir o número de situações de pára-arranca a que estão sujeitos;

d) Esta redução do número de paragens/arranques contribuirá para reduzir o desperdício de energia primária de que o sistema tem sido vítima devido à intermitência das eólicas e das fotovoltaicas.

Esta abertura ao “mercado elétrico europeu” vai pôr em causa vários interesses instalados que têm vivido protegidos, nomeadamente pelas FIT, que são por si só o maior atentado à livre concorrência, pelo que resta alguma expetativa sobre a concretização do que ficou acordado na Cimeira de Lisboa.

E foram dois os vetores de atuação a curto prazo definidos nesta cimeira:

– Elaborar o projeto de engenharia da conexão elétrica de 280 km que vai ligar Cap Breton a San Sebastián e passar depois à fase de adjudicação dos equipamentos e à respetiva instalação no terreno;

– Negociar as cláusulas comerciais que definirão as regras das transações de eletricidade entre França e o atual Mibel. Sendo certo que o princípio básico será a regra do “preço mais baixo em cada momento”, haverá que definir ainda quais os agentes que poderão atuar nesse mercado e em que condições serão negociadas, executadas e liquidadas essas transações.

Note-se que, com esta nova interligação, a potência da totalidade das interligações entre a França e a península Ibérica passará a ser da ordem dos 9300 MW, o que exigirá certamente “plataformas de negociação” altamente eficazes e fiáveis.

Mas, aqui chegados, voltamos a uma questão fundamental:

Se os dirigentes europeus preveem que este Mercado Elétrico do Sudoeste Europeu, envolvendo França, Espanha e Portugal, entre em funcionamento até 2023, como irá ele articular-se com o “cocktail explosivo” do Sistema Elétrico Português que, no atual quadro legal, se irá prolongar até 2033?

Este é certamente um problema da mais alta importância que a Cimeira de Lisboa não irá só por si resolver, até porque só menos de 15% da produção de energia elétrica portuguesa é negociada em mercado.

O que a Cimeira de Lisboa revela é que este enorme problema que há anos estava esquecido neste canto da Europa passou a ter uma dimensão europeia e, por isso, foram agora concedidos 578 milhões de euros para esta nova interligação.

E a forma como este problema vai ser resolvido vai depender da qualidade da democracia em Portugal, bem como da determinação dos dirigentes europeus para resolverem os problemas concretos dos cidadãos e das empresas europeias, neste momento crucial de preparação das eleições para o Parlamento Europeu, que irão decorrer em maio de 2019.


Clemente PEDRO NUNES
Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade

NOTA: artigo publicado no jornal i.

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

O Palácio do Vento e o Palácio de S. Bento

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de António Pinho Cardão, saído ontem no jornal i.
No Palácio do Vento, em Jaipur, a concubinagem era às claras e permitida pela lei que o próprio marajá decretava. Em S. Bento, a regra tem sido escondê-la ou mostrá-la como acasalamento sólido e estável, mas nunca selando qualquer contrato de vida conjunta.
O Palácio do Vento e o Palácio de S. Bento  
A fachada rosa do Palácio do Vento, em Jaipur, na Índia, que há uns anos visitei, permite adivinhar um edifício grandioso. Mas não é assim. Trata-se apenas da fachada de cinco andares de varandas rendilhadas de um palácio inexistente, mas que acaba por ser um extraordinário monumento.

As concubinas do marajá de Jaipur andavam desgostosas por estarem confinadas ao palácio real. Não vendo ninguém a não ser o marajá e os eunucos, e só conversando entre elas, invadiu-as uma grande monotonia. Temendo falta de motivação das damas para as suas nem sempre fáceis tarefas, que a prática do Kama Sutra continha exigências de elevado nível qualitativo, e procurando preservar a sua qualidade de vida, o marajá resolveu oferecer-lhes uma varanda de onde pudessem recriar a vista com os passantes e o movimento da cidade. A fachada constitui um dos símbolos de Jaipur.

Lembrei-me que, rimando com Palácio do Vento, temos cá o Palácio de S. Bento, inicialmente um virtuoso convento beneditino e, depois, um não menos puro Palácio das Cortes, virtude certamente aumentada com o palacete construído nas adjacências traseiras. No entanto, não estou totalmente seguro de que a semelhança entre os dois palácios se fique pela rima e que o Palácio de S. Bento nunca tenha seguido a vocação do Palácio do Vento, metaforicamente falando, claro está.

É verdade que com regras diferentes: no Palácio do Vento, a concubinagem era às claras e permitida pela lei que o próprio marajá decretava, enquanto em S. Bento, ainda metaforicamente falando, a regra tem sido escondê-la. Ou, em certas ocasiões, mostrá-la como acasalamento sólido e estável, mas nunca selando qualquer contrato de vida conjunta, já que diferenças mal assumidas entre as partes o poderiam reverter a todo o momento, tornando mais cara a separação.

Concubinagem política existe quando, sobrelevando-se ao bem comum, interesses pessoais, partidários ou políticos, económicos e corporativos se cruzam para promover o poder dos marajás de ocasião e daí retirar as ajustadas contrapartidas pessoais e políticas. A outorga de contratos de escandalosa rentabilidade e nulo risco ou a reserva privilegiada de lugar à mesa do Orçamento a quem, pessoas ou corporações, possa favorecer a renovação do poder, em troca ilegítima de serviços a custo do cidadão, é concubinagem pura e dura.

E se no palácio real de Jaipur havia geringonças de apoio aos exercícios mais acrobáticos do Kama Sutra, também por cá elas vão aparecendo para os exercícios menos democráticos do poder. Mas enquanto lá as peças se ajustavam e as geringonças ainda podem ser vistas, na geringonça caseira, não figurando o acasalamento das peças em qualquer manual conjunto, a fragilidade da quadripeça aparece tanto mais evidente quanto cada qual se apressa a reivindicar a importância decisiva da sua contribuição e a maior performance pessoal entre os parceiros – no fim, mera traficância de serviços entre si, mascarada de benefício público.

Assim, é na proclamação ideológica que o acasalamento se sustenta: a saúde pública, a escola pública, o transporte público ou a reposição de direitos dos funcionários tornam-se slogans para abafar o ruído do avolumar das filas de espera nos hospitais, das dificuldades do ensino e transportes, da falha clamorosa dos serviços públicos, com o cidadão a pagar no privado o serviço público que lhe falta, mesmo com a maior carga fiscal de sempre.

A fachada monumental do Palácio do Vento escondia a dramática realidade de concubinas aprisionadas, aparentando para o exterior invejáveis condições de bem-estar.

A fachada do Palácio de S. Bento esconde muitas vezes uma democracia sem qualidade, em que a política se tornou um bem transacionável ao sabor de interesses partidários ou de corporações amigas.

E se, no Palácio do Vento, os eunucos eram úteis para pôr fim a concubinais rivalidades, no Palácio de S. Bento também não faltam, para justificar políticas de todo indefensáveis ou divulgá-las como inestimável serviço aos cidadãos.

Afinal, não será apenas a rima que une o Palácio do Vento e o Palácio de S. Bento. Caricatura? Mas não é a caricatura, acentuando traços, que tantas vezes melhor traduz a realidade?

A Sedes e a Associação Por Uma Democracia de Qualidade realizam hoje uma conferência sobre a reforma do sistema eleitoral. Oxalá que seja mais um passo para acabar com tal rima e adocicar a caricatura. 

António PINHO CARDÃO
Economista e gestor
Subscritor do Manifesto por Uma Democracia de Qualidade

NOTA: artigo publicado no jornal i


quarta-feira, 29 de agosto de 2018

A obrigatoriedade de uma reforma do Sistema Eleitoral para a Assembleia da República

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Fernando Teixeira Mendes, saído hoje no jornal i.
O país está cheio de problemas hediondos cuja origem está no deficiente funcionamento da Assembleia da República.
A obrigatoriedade de uma reforma do Sistema Eleitoral para a Assembleia da República
Exactamente há uma semana José Ribeiro e Castro deu-nos nesta coluna, sob título “Círculos uninominais: problemas & soluções” uma grande lição sobre como implementar, em Portugal, um Sistema Eleitoral com círculos uninominais integrados num sistema misto de representação proporcional personalizada. Tal Sistema está de acordo com a revisão constitucional de 1997, feita há mais de vinte anos e que, por interesse dos partidos políticos com assento parlamentar, nunca passou à prática!

O artigo de José Ribeiro e Castro é de leitura obrigatória porque esclarece muitas dúvidas e desmonta muitas das infundadas críticas que alguns políticos e comentadores insistem em propalar sobre a existência de círculos uninominais nas eleições dos deputados à Assembleia da República.

À minha posse voltou, recentemente, um artigo de José Gomes Ferreira, escrito em Novembro de 2015, sob título De regresso ao subdesenvolvimento sem o percebermos? em que este Jornalista (que de propósito escrevo com J maiúsculo) afiança que para além de um conjunto de perigos que Portugal corre por razões financeiras, orçamentais e fiscais o nosso país está sujeito a um perigo bem maior: Somos “Um país a gangrenar de corrupção. Que estamos a redescobrir mais uma vez”.

Tem razão José Gomes Ferreira. O nível de corrupção pública e privada é enorme num país que vive também numa “corrupção moral na gestão da causa pública’’. Compartilho, sem rodeios, as suas afirmações e registo que a situação se vem agravando com o passar do tempo.

Nunca podemos esquecer que todas as brutais ineficiências acima mencionadas e muitas outras, que obviamente não caberiam neste texto, são suportadas com grande sofrimento por empresários e cidadãos indefesos através de mais impostos, mais taxas, menos emprego, menos desenvolvimento económico, pior Sistema Nacional de Saúde, pior Ferrovia, pior Justiça, pior Administração Pública, custos inaceitáveis de Energia, e tudo moldado ao abrigo de muitas negociatas graves ou muito graves.

Perguntará o leitor, mas há alguma ligação entre os textos de José Ribeiro e Castro e de José Gomes Ferreira?

Os dois artigos estão muito ligados. Um apresenta uma grande listagem de problemas e o outro apresenta soluções que são a génese para a melhoria da consciência de dever de servir a causa pública, hoje muito arredada dos nossos políticos. O país está cheio de problemas hediondos cuja origem está no deficiente funcionamento da Assembleia da República, não se debatendo nesta os assuntos que não interessam aos directórios partidários, e legislando a Assembleia muitas vezes ao abrigo de interesses que não os verdadeiros interesses do país. A Assembleia da República não funciona correctamente porque os deputados não estão minimamente ligados aos cidadãos, estando apenas ligados às únicas entidades de quem dependem, os directórios partidários, que têm grande tendência para os escolherem de forma absolutamente ditatorial. Um grave erro institucional que urge corrigir enquanto é tempo.

Em Democracia, corrige-se esse problema alterando o Sistema Eleitoral para a Assembleia da República, introduzindo círculos uninominais em que em cada círculo é eleito o candidato mais votado numa votação específica para esse fim. Sinceramente não vejo outra forma de mudar a forma de trabalhar da nossa Assembleia dentro dos limites permitidos pela nossa Constituição.

A Associação Por Uma Democracia de Qualidade, APDQ, escreveu o seu Manifesto em 2014, cujo o objectivo foi sempre e continua a ser, mostrar aos partidos políticos com assento parlamentar que seria bom que se organizassem para implementarem as alterações que a Constituição permite desde 1997. Foi esse o propósito da modificação da Constituição. Se fosse para que tudo ficasse na mesma, porque se alteraria a Constituição?

Se os partidos com assento parlamentar continuarem a auto proteger-se e a não implementarem as alterações ao Sistema Eleitoral que além de nós várias outras entidades sugerem, então pessoalmente acredito que se irão verificar alterações no espectro partidário, que de alguma forma facilitarão a introdução das medidas preconizadas. Perante o que enunciei é óbvio que me preocupa muito a passividade da Sociedade Civil, mas não acredito que esta vá continuar a sofrer como tem sofrido, sem se manifestar de forma determinada, exigindo mudanças que possibilitem importantes resultados a curto e a médio prazo.

A APDQ juntamente com a Sedes vão realizar no próximo dia 12 de Setembro, de manhã (9h00 às 13h00), uma sessão pública de grande importância e interesse, no Auditório da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, na qual será apresentada e debatida a Revisão do Sistema Eleitoral para a Assembleia da República, tal como foi projetada por estas duas Organizações. A sessão contará com a presença de Sua Excelência o Senhor Presidente da República.

Democracia de Qualidade só com a melhoria da nossa classe política e isso só virá a acontecer se se fizer uma Reforma do Sistema Eleitoral para a Assembleia da República, tal como defendemos no importante Manifesto “Por uma Democracia de Qualidade”.
Contactos e informações através do email: porumademocraciadequalidade@gmail.com
Fernando TEIXEIRA MENDES
Gestor de empresas, Engenheiro
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade

NOTA: artigo publicado no jornal i.

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Globalização, democracia e populismo

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de José António Girão, hoje saído no jornal i.
Sejam de esquerda ou de direita, os populismos conduzem a uma governação musculada e autocrática. Só com o reforço da democracia representativa se consegue evitar as consequências nefastas que lhes estão associadas.

Cabeçalho da proposta SEDES/APDQ

Globalização, democracia e populismo 

Múltiplos e variados factos recentes parecem apontar para o emergir de uma nova ordem (político-económica) internacional. A que vigorou até agora, alicerçada nas consequências desastrosas de duas grandes guerras à escala global, assentava na cooperação e integração entre nações como via para o desenvolvimento sustentável e a prosperidade e como forma de evitar a autossuficiência e os nacionalismos extremos, de que o nazismo foi paradigmático. É neste contexto que surge a moderna globalização, resultante da eliminação de barreiras à livre circulação de bens, serviços e fatores de produção (capital e trabalho) entre nações, facilitada pela inovação e pelos grandes avanços tecnológicos (transportes e comunicações) registados nos últimos 50 anos.

Não obstante a teoria demonstrar e a experiência confirmar as vantagens da globalização, resultantes do comércio livre, via economias de escala e vantagens competitivas, é igualmente sabido que os ganhos assim realizados não se distribuem equitativamente entre todos os participantes no processo. Com efeito, os custos e benefícios associados ao mesmo repartem-se de forma assaz assimétrica entre nações e classes sociais. Daí a necessidade de monitorização criteriosa de todo o processo, com vista à implementação de políticas suscetíveis de promover a harmonia entre todos os participantes e de assegurar o bem-estar coletivo. Caso contrário, em vez destes, teremos desavenças, conflitos e a desintegração do processo, com todos os custos inerentes. É este o momento que, tudo indica, estamos a viver. E é neste cenário que se agiganta a importância da democracia e das suas elites políticas. Com efeito, torna-se agora ainda mais premente garantir a vitalidade da democracia, se necessário revitalizando-a, zelando pelo seu correto funcionamento e pondo fim à abordagem laissez-faire (i.e. desregulada) da globalização pelos mercados. Assim se contrariará de forma eficaz o populismo. Contudo, é aqui que reside a dificuldade e o aparente paradoxo.

O populismo apela à vontade da maioria, mas rejeita os controlos e contrapesos (checks & balances) fornecidos pelas instituições da democracia representativa do Estado de direito. No fundo, o populismo resulta de um antagonismo entre as elites e/ou os culturalmente diferentes e o povo, traduzindo-se em larga medida num apelo a formas de democracia direta. Contrapõe-se, assim, à democracia representativa, já que a identificação que faz com a “vontade do povo” implica a marginalização e desconsideração das “vontades minoritárias”. É aqui que reside a essência do populismo e é por isso que é possível considerar existirem populismos de esquerda e de direita: os primeiros identificáveis com regimes defensores da democracia direta e os segundos resultantes de visões nacionalistas extremas. No fundo, ambos conduzem a uma governação musculada, de tipo autocrático, por líderes ditos “fortes”. A conclusão básica e essencial que daqui se extrai é a de que só com o reforço da democracia (representativa) se consegue evitar o populismo, com todas as nefastas consequências que lhe vêm associadas.

Ora, como todos sabemos e é patente no caso português, é o fraco/mau desempenho dos ditos representantes eleitos que gera descontentamento popular, desinteresse pela causa pública e pela participação política e a elevada abstenção eleitoral a que estamos assistindo. Que via de solução adotar? Estamos convictos de que ela passa necessariamente por melhorar de modo significativo a qualidade dos agentes políticos, por forma que também a governação possa melhorar de modo significativo, incluindo nela não só o governo propriamente dito como o funcionamento das suas instituições e órgãos de Estado – em particular, da Assembleia da República, enquanto órgão de representação dos cidadãos e seus anseios. No contexto presente do país, tal exige, como vem sendo referido por muitos, uma reforma do sistema eleitoral para a AR, tendo em vista, nomeadamente: (1) retirar a exclusividade aos partidos políticos na escolha dos candidatos a eventuais representantes eleitos, i.e. permitir que os cidadãos eleitores que assim o desejem possam igualmente propor-se como candidatos a deputados; (2) que a votação nas listas apresentadas pelos partidos possa passar a ser objeto de votação nominal; (3) que os eleitos passem a ser o conjunto dos nomes mais votados pelos eleitores, sejam eles candidatos a título individual ou inseridos em listas partidárias; eventualmente (4) que os votos considerados nulos ou em branco passem a corresponder a lugares de “não eleitos”, assim traduzindo (percentualmente) o descontentamento dos eleitores com os programas eleitorais apresentados pelos partidos e pelos candidatos, os quais não possibilitaram a adesão e não mereceram a necessária confiança duma parte do eleitorado.

Os princípios enumerados são, obviamente, suscetíveis de serem inseridos e traduzidos numa lei eleitoral para a Assembleia da República que garanta a justeza da representatividade e proporcionalidade dos escolhidos face aos resultados expressos. Sendo possíveis várias formulações para a lei, deixamos esse trabalho para consideração dos especialistas e dos partidos atuais. Na ausência de outras, existe para já a proposta “Reforma eleitoral em Portugal”, apresentada conjuntamente pela SEDES e pela Associação Por Uma Democracia de Qualidade (APDQ), que pode ser consultada em http://sedes.pt/multimedia/File/ 180404_APDQSEDES_ReformaEleitoral.pdf.

Resta formular o voto de que o poder partidário em Portugal se dinamize por forma a que o atual sistema eleitoral possa ser revisto antes de se completar meio século sobre o pós-25 de Abril e, obviamente, antes de o populismo poder ganhar foros de representatividade em Portugal.


José António GIRÃO
Professor da FE/UNL
Subscritor do Manifesto Por uma Democracia de Qualidade

NOTA: artigo publicado no jornal i.

quarta-feira, 25 de julho de 2018

Bolseiros pós-doc: um colapso estratégico

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Clemente Pedro Nunes, hoje saído no jornal i.
O Estado, para investir no recrutamento de doutorados, tem de ter chefias que os saibam gerir e enquadrar numa perspetiva estratégica de interesse nacional.
 
Bolseiros pós-doc: um colapso estratégico
Um dos mais graves sintomas da falta de uma estratégia para o desenvolvimento económico-social de Portugal que a atual solução governativa tem evidenciado é a forma como tem lidado com o problema dos doutorados que têm vivido de bolsas de pós-doutoramento, sucessivamente renovadas. E isto fora de qualquer sistema estruturado para promover a prosperidade económica e a coesão social do nosso país.

É lamentável vermos milhares de pessoas com as mais altas formações académicas e que, ao mesmo tempo, têm graves dificuldades em se inserirem no mercado de trabalho. Só que as soluções para que o atual governo aponta apenas irão agravar a situação, em termos duma estratégia nacional digna desse nome.

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) tem olhado para esta questão apenas de um ângulo “político-social”, considerando os doutorados com bolsas como um problema corporativo de trabalhadores em situação de “precariedade” que têm vindo a pressionar o governo reivindicando uma situação de “estabilidade laboral”. O que, na prática, quererá dizer o terem direito a adquirir um “lugar na administração pública”.

Numa perspetiva de valorização de recursos humanos de que o país dispõe, é de facto trágico! Mas não tem de ser assim!

Desde logo porque, em termos de coordenação estratégica, não faz qualquer sentido ser apenas o MCTES a tratar duma questão tão relevante para pôr o conhecimento tecnológico ao serviço do desenvolvimento económico-social do país.

A atual Agência Nacional de Inovação articula obrigatoriamente as perspetivas de dois ministérios: o da Ciência/Ensino Superior e o da Economia. Por isso, como já referido em anterior artigo, em abril de 2017, considero prioritário que seja retomado um programa de inserção de doutorados nas empresas, semelhante àquele que foi incompreensivelmente descontinuado em 2006 e pelo qual a então ADI (a Agência de Inovação, entretanto substituída pela Agência Nacional de Inovação) suportava o custo de 50% dos vencimentos dos três primeiros anos de trabalho efetivo de doutorados contratados pela primeira vez para trabalhar nas empresas – incluindo, como é óbvio, as startups e as “novas digitais”, atualmente tão fomentadas – para os doutorados serem incentivados a ir reforçar, com as suas competências, o “músculo competitivo” do tecido empresarial.

Mas, além disso, fica-se perplexo com o facto de, mesmo em termos do setor público, o MCTES, para resolver o problema reivindicativo que tem em mãos, apenas ter ido bater à porta (nalguns casos parece querer mesmo ir arrombar a porta…) das universidades.

É que vivemos num país que tem pelo menos um organismo do Estado que soube articular com sucesso a ciência, a tecnologia e a engenharia e pô-las ao serviço do desenvolvimento económico-social da sociedade: o LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia Civil. Ora, o LNEC foi criado já há cerca de 70 anos pela visão de Manuel Rocha e de Eduardo Arantes e Oliveira, mas, depois disso, os casos de sucesso não abundam nesta área.

A gestão estratégica do trabalho de pessoas altamente qualificadas em termos científicos, como é o caso dos doutorados, é sempre uma tarefa difícil que exige, simultaneamente, elevadas competências científico-tecnológicas e de gestão estratégica, incluindo a capacidade de liderança de equipas multidisciplinares.
E mesmo em áreas não tecnológicas, como é o caso das ciências sociais e políticas/relações internacionais, certamente alguns destes bolseiros pós-doc poderiam dar um contributo em termos operacionais, por exemplo apoiando a nossa diplomacia no reforço do “músculo económico e político” de Portugal na cena mundial.

Mas o Estado, para investir no recrutamento de doutorados, tem de ter chefias que os saibam gerir e enquadrar numa perspetiva estratégica de interesse nacional. Porque, se as não tiver, estará apenas a destruir os recursos que os cidadãos e as empresas lhe pagam através dos impostos para pagar “subsídios para empregos avulsos”. E estará também a destruir uma perspetiva de carreira digna aos que assim permanecem à custa do contribuinte num “limbo tolerado”.

Estamos, pois, a assistir a um colapso estratégico nesta área fundamental por parte do governo, que apenas se propõe pôr dinheiro para resolver uma reivindicação laboral. Mas uma democracia de qualidade tem de ser muito mais que isso. Tem de saber transformar os desafios em oportunidades que reforcem a sociedade no seu conjunto, e não apenas uma pequena parte em detrimento de todas as restantes.
 
Clemente PEDRO NUNES
Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade

NOTA: artigo publicado no jornal i.


quarta-feira, 4 de julho de 2018

Funcionários políticos

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Eduardo Baptista Correia, hoje saído no jornal i.
Uma democracia de qualidade não compactua com o funcionário político e exige novos modelos eleitorais, novos modelos de comportamento, ética e transparência. 
Funcionários políticos  
A conjuntura política é demonstrativa da falta de compreensão de que a generalidade dos partidos padece relativamente à relação que os cidadãos mantêm com a política. A evidência mostra-nos que este afastamento, bem visível à escala europeia, é agravado pela excessiva burocratização de Bruxelas, dos Estados, dos aparelhos públicos e da generalidade dos partidos, que se transformaram em plataformas de acesso a estas diversas “repartições”.
Este fenómeno é uma consequência direta da transformação dos partidos políticos em centros de emprego público para os funcionários políticos que por lá vão crescendo, na sua maioria sem noção nem sentido da essência da política e do serviço público. É dentro dos partidos, pela forma como o sistema político está organizado, que se decide quem governa. A dependência da nomeação dos candidatos à generalidade das eleições relativamente aos partidos é de tal forma vincada que o prodígio da interajuda entre pares é a condição para o acesso ao poder. É neste círculo vicioso que os partidos vivem. Uns ambicionam o poder; outros, apenas um cheque ao fim do mês numa qualquer repartição ou cargo de adjunto. A interdependência entre estes dois grupos constitui a essência do sistema político português.

Este fenómeno trouxe-nos duas terríveis consequências: o gradual afastamento dos cidadãos relativamente à política, aos políticos e aos partidos políticos, e a gradual degradação qualitativa dos políticos, asfixiando a criatividade na visão política, elemento essencial à evolução da sociedade e da pessoa humana.

São estes funcionários políticos quem, dentro dos partidos, decidem em função dos seus interesses e alinhamentos pessoais quem são os candidatos a primeiro-ministro. São também as mesmas pessoas quem decide quem dos partidos é candidato às diferentes eleições. Estas escolhas são baseadas em critérios que pouca ligação têm com os reais interesses dos eleitores. É um mundo à parte, totalmente hermético à sociedade que, em teoria, deveria representar.

A atual solução governativa de esquerda é um exemplo bem evidente dessa forma de estar na política. Dir-se-ia que a fragilidade do modelo, a ausência de reformas e criatividade política que caracterizam este governo e o PS poderiam constituir o incentivo para a renovação, há muito aguardada, do PSD no que à visão sobre o sistema político, organização do Estado e desenvolvimento económico diz respeito. Contudo, a evidência mostra um partido estagnado, sem projeto e sem ideias, também ele refém dos funcionários políticos. Espera-se do PSD, partido fundado por Francisco Sá Carneiro, muito mais. Espera-se uma JSD com intervenção social e de voluntariado para que possa ser a escola de serviço público que se exige a modelos políticos orientados para a evolução da sociedade. Esperam-se propostas concretas de reforma do sistema político e governativo, reforma da burocracia interna e da redução do Estado onde efetivamente não acrescenta valor aos cidadãos. Espera-se do PSD uma visão clara para a forma como Portugal se enquadra na Europa e para o que deve a Europa ser num séc. XXI cheio de novos desafios.

Sobre estas matérias, os funcionários políticos têm poucas convicções e o partido mantém o estilo amorfo a que nos foi habituando.

Saúdo aqui os novos responsáveis pelo Instituto Sá Carneiro pela exceção que constituem neste universo e pela forma como têm, ao longo do tempo, defendido as suas convicções, bem como a visão inovadora, reformista, ética e meritocrática que consigo carregam, bem distinta do posicionamento do comum e generalizado funcionário político.

Uma democracia de qualidade não compactua com o funcionário político e exige novos modelos eleitorais, novos modelos de comportamento, ética e transparência na vida em sociedade.

Eduardo BAPTISTA CORREIA
Activista político
Gestor e Professor da Escola de Gestão do ISCTE/IUL
Subscritor do Manifesto "Por uma Democracia de Qualidade"

NOTA: artigo publicado no jornal i


quarta-feira, 27 de junho de 2018

Uma sociedade civil que não tenha fortes ambições para o seu país mais não faz que afundá-lo

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Fernando Teixeira Mendes, saído hoje no jornal i.
Ao apertar da malha da supervisão bancária responderam a maioria dos partidos, no fim de 2017, com um acordo que incluía uma medida de que sou muitíssimo crítico, a da eliminação do limite do valor máximo dos donativos aos partidos.


Uma sociedade civil que não tenha fortes ambições para o seu país mais não faz que afundá-lo

A situação económica e social em Portugal complica-se a olhos vistos. A sociedade civil tem de intervir e não pode esquecer-se que é ela que tem de estar ao leme desta embarcação.

Neste momento em que as exportações diminuem, reduzindo-se por consequência as receitas do Estado; quando ainda não foi feita uma verdadeira reengenharia para simplificação das funções do Estado que possibilite uma importante redução da sua despesa; em que continuamos a sofrer o impacto da destruição infringida por alguma banca, cuja influência originou a destruição de mais de 25% da nossa riqueza nacional; e em que precisamos desesperadamente de uma justiça confiável, célere e eficaz que não temos (apesar das enormes melhorias introduzidas por Joana Marques Vidal face aos seus antecessores na Procuradoria-Geral da República), constato que em vez de os problemas serem resolvidos, continuam a agravar-se de forma inequívoca.

Certos estavam os que previam que, enquanto não alterássemos o nosso sistema eleitoral para a escolha de deputados para a Assembleia da República, não conseguiríamos contribuir para uma verdadeira solução dos graves problemas que continuam a afetar-nos.

Foi por isso que escrevemos em 2014 o importante “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”, em que defendemos, no seu ponto 1, a alteração do sistema eleitoral para a Assembleia da República, pugnando pela introdução de círculos uninominais para se aproximarem os eleitos dos eleitores – o que a nossa Constituição, aliás, já prevê há mais de 20 anos!

Recentemente apresentámos ao senhor Presidente da República e aos partidos políticos com assento parlamentar a nossa proposta de uma assembleia com 229 deputados, sendo 105 eleitos pelo mesmo número de círculos uninominais, 105 eleitos em círculos distritais, quatro eleitos pela emigração e 15 eleitos por um círculo nacional de compensação, para assim se poder implementar o sistema de representação proporcional personalizado. Desejamos que em breve esta nossa proposta venha a ser amplamente debatida.

Quando escrevemos o “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”, em boa hora inserimos também o «ponto 2 - Alteração do sistema de financiamento dos partidos políticos», que sinto obrigação de citar neste momento. Alertámos, na época, para que este é «um problema fundamental do nosso doente sistema democrático».

De facto, ao apertar da malha da supervisão bancária responderam a maioria dos partidos, no fim de 2017, com um acordo que incluía uma medida de que sou muitíssimo crítico, a da eliminação do limite do valor máximo dos donativos aos partidos. Tudo feito, à época, no maior dos secretismos. Os deputados que, de facto, com o sistema eleitoral vigente não nos representam, representando exclusivamente os partidos políticos, mostraram mais uma vez do que são capazes!

O senhor Presidente da República não quis ou não pôde manter o veto presidencial original e esta vergonhosa medida foi promulgada. Assim não é possível termos uma democracia de qualidade e foi lançada uma acha para mais um incêndio que a sociedade civil terá de debelar.

Advogámos quando escrevemos o manifesto que:

«Há que aperfeiçoar o quadro atual do sistema de financiamento partidário:

– Receitas de fonte maioritariamente pública, com verbas alocadas pelo Orçamento do Estado.

– Receitas privadas apenas por contributos de pessoas individuais em moldes estritamente regulamentados na lei (quotizações, donativos limitados ou eventos de angariação de fundos) e permitindo a respetiva fiscalidade pública, nomeadamente pelas deduções na coleta em sede de IRS ou por outros mecanismos de cruzamento com o sistema tributário.»


Advogámos ainda que fosse um corpo de auditores especiais no âmbito da Procuradoria-Geral da República ou uma secção especializada do Tribunal de Contas a auditar as contas dos partidos políticos. Contudo, fogem dessa auditoria como o diabo da cruz, vá-se lá saber porquê!

O sistema, tal como o descrevemos, dificultaria enormemente que as empresas andassem à procura de indivíduos para efetuarem os seus donativos aos partidos.

Está além disso demonstrado que com receitas maioritariamente públicas, quer isto dizer, com verbas alocadas no Orçamento do Estado, se consegue que o financiamento partidário seja mais barato para os cidadãos e mais justo para os pequenos partidos que não têm acesso ao poder.

Atendendo ao comportamento de grande parte dos deputados, que mais não fazem do que seguir incondicionalmente os chefes para não ficarem fora das listas seguintes, só a sociedade civil, no futuro, espera-se, também com o apoio eficaz do senhor Presidente da República, pode atingir o importante objetivo que para bem do país traçámos.

Não duvidem os leitores: compete à sociedade civil estar ao leme!

Democracia de qualidade só com a melhoria da classe política e isso só virá a acontecer se vierem a implementar-se círculos uninominais na eleição dos deputados para a Assembleia da República, tal como defendemos no importante “Manifesto: Por uma Democracia de Qualidade”.

Contactos e informações através do email: porumademocraciadequalidade@gmail.com

Fernando TEIXEIRA MENDES
Gestor de empresas, Engenheiro
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade

NOTA: artigo publicado no jornal i.


quarta-feira, 13 de junho de 2018

A destruição do investimento na habitação

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Clemente Pedro Nunes, hoje saído no jornal i.
O governo criou um imposto de confisco, designado popularmente por “imposto Mortágua” e destinado exclusivamente a imóveis para habitação. Sim, caro leitor. Se tiver uma casa alugada a uma família, mesmo com contrato vitalício, tem de pagar o imposto Mortágua. Mas se tiver alugado para um bar de alterne, estará isento!
Obra parada
A destruição do investimento na habitação
Um dos fundamentos da economia social de mercado é a mobilização das poupanças para investimentos social e economicamente eficientes. Por isso, desde os inícios do séc. XX e até 1974, a promoção imobiliária para habitação foi em Portugal uma das aplicações diretas das poupanças das famílias e das pequenas empresas.

Em 1975, o processo revolucionário então em curso manteve o congelamento das rendas em Lisboa e no Porto, que já vinha do Estado Novo, e alargou-o a todo o país mesmo, com uma inflação anual acima dos 20%! O que arruinou os proprietários que, ao longo das décadas de 80 e 90 do século passado, se viram obrigados a vender ao desbarato os seus imóveis para não caírem na insolvência, devido a uma legislação que tornara os custos da manutenção dos edifícios mais altos do que as rendas congeladas por lei. Isso levou à ruína de muitas zonas urbanas e acabou com o investimento para arrendar. Ou seja, uma política de pretensa proteção social dos “inquilinos vitalícios” entregou aos bancos o encargo de financiarem em exclusivo a promoção imobiliária.

Face à degradação dos imóveis arrendados, a nova lei de 1992 permitiu a celebração de contratos de arrendamento com prazo certo, bem como a atualização periódica das rendas em função da inflação. Mas o valor extremamente baixo das rendas dos mais de 200 mil contratos habitacionais vitalícios estabelecidos antes de 1992 fazia com que a respectiva gestão continuasse a ser um verdadeiro suplício. E isso impedia novos investimentos para arrendar, pois permanecia bem viva a espada de Dâmocles do congelamento de rendas.

Os efeitos tenebrosos que esta política teve nos bancos nacionais são bem conhecidos. Forçados politicamente a dar crédito para compra de habitação às famílias das classes médias com prazos de empréstimo de 40 anos, mas dispondo apenas de fontes de crédito a cinco anos, os bancos criaram o caldo de cultura para o colapso que os atingiria com a crise financeira de 2008.

Para permitir a retoma do investimento direto de poupanças em habitação, foi criada a lei de 2012, que visava resolver progressivamente o fardo económico das rendas degradadas herdadas do período do “congelamento gonçalvista”. E essa lei permitiu, de facto, uma notável recuperação do património urbano, bem visível nas grandes cidades, e potenciar também o forte boom turístico de que Portugal tem beneficiado graças à instabilidade vivida nos principais destinos turísticos do Mediterrâneo e do Médio Oriente.
Quando o atual governo chegou ao poder, em finais de 2015, herdou assim uma notável recuperação urbana a par das consequências duma procura turística que ultrapassava tudo o que se podia ter imaginado em 2012.

Face a este novo quadro, o governo tomou em 2016 duas medidas desastrosas para a confiança de qualquer investidor: 
– Decidiu abolir os subsídios de renda previstos na lei de 2012 para apoiar os inquilinos com dificuldade em pagar as rendas sociais estabelecidas pela própria lei, obrigando assim os proprietários a continuarem a fazer assistência social num horizonte a perder de vista;
– Criou um imposto de confisco, designado popularmente por “imposto Mortágua” e destinado exclusivamente a imóveis para habitação.

Sim, caro leitor. Se tiver uma casa alugada a uma família, mesmo com contrato vitalício, tem de pagar o imposto Mortágua. Mas, se tiver alugado para um bar de alterne, estará isento!

Sempre fiquei na dúvida se os proponentes desta lei se aperceberam da monstruosidade social do que legislaram. Mas pelo menos uma pessoa da atual maioria se apercebeu: o presidente da Câmara de Lisboa. Fernando Medina resolveu fazer um desconto no IMI para quem for proprietário de casas arrendadas para habitação, ou seja, precisamente as vítimas do imposto Mortágua. Mas só em Lisboa estas têm uma ligeira compensação. Resumindo, uma total e absurda contradição interna das políticas de habitação!

E agora, perante a quebra do investimento para arrendar, o governo mantém o imposto Mortágua e fez mais dois avanços no sentido de regressar ao “congelamento das rendas”: 
– Tornar vitalícios os contratos temporários para inquilinos maiores de 65 anos; 
– Bloquear as ações de despejo.

Face a esta calamidade anunciada, os incentivos da redução do IRS para contratos de arrendamento a mais de dez anos nada significam e o investimento para arrendar continua parado. E a monstruosa burocracia de concursos públicos para a seleção de candidatos para atribuição de “rendas acessíveis “ em imóveis privados retira qualquer vantagem a esta proposta. Pelo que as famílias à procura de casa não encontram habitações para arrendar, o que agrava os problemas sociais e demográficos do país.

Como, por outro lado, os bancos dão aos aforradores taxas negativas, estes, em desespero, vão investir em fundos que, provavelmente, vão financiar economias estrangeiras em vez de promoverem a habitação em Portugal. E isto num país terrivelmente descapitalizado! Mas certamente que o ministro Mário Centeno, agora também presidente do Eurogrupo, estará atento a este desastre na aplicação das poupanças dos portugueses que irá arruinar de novo a estabilidade do próprio sistema bancário. E desacreditar ainda mais a qualidade da nossa democracia. 
Clemente PEDRO NUNES
Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade

NOTA: artigo publicado no jornal i.