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sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

PGV - parte 2


Ao modo de grandes sagas do cinema (Guerra das Estrelas, Rambo, Rocky, Missão Impossível, Die Hard) também o PGV - Parlamento Grande Vitesse teve hoje a segunda parte. Em São Bento, foi uma triste fita.

Num manobrismo parlamentar do pior recorte, à última hora, o PS e o PSD requereram a baixa à Comissão sem votação dos projectos de lei que haviam apresentado para revisão da lei da Procriação Medicamente Assistida, no baile que havia sido aberto pelo Bloco de Esquerda. Eu, por exemplo, que queria votar contra, já não pude fazê-lo, tal como muitos outros. Assim, acabaram por só ser votados - e chumbados - o projecto de lei do BE e o de alguns deputados do PS. Aliás, também este último, noutra manobra de último segundo, foi alterado oralmente, sendo expurgado da parte referente à chamada "maternidade de substituição". 

É deplorável que tanto o PS, como o PSD se escudassem num puro truque regimental, protegido por uma  longa praxe parlamentar, para evitarem a clarificação política a respeito de questões que ajudaram demasiado a provocar e a engrossar. Compreendo muitíssimo bem o tremendo embaraço e as grossas dificuldades em que se sentiram. Mas, por isso mesmo, o melhor era que não tivessem entrado sequer na procissão do Bloco de Esquerda. Como eu sempre disse - e diligenciei para evitar.

Dirão muitos: do mal, o menos. E, quanto ao fundo das questões, para já, é verdade: não foi alargada a PMA, não foram introduzidas as "barrigas de aluguer" e não foi mais liberalizada a investigação destrutiva de embriões. O que devia ter acontecido de uma forma clara e não escusa e obscura. A "maioria de aluguer" que estava a ser preparada retirou e atirou a toalha para o ringue. O PGV descarrilou. Mas o processo político e a seriedade da tramitação legislativa levaram mais umas valentes amolgadelas.

Os que se se retiraram da arena em cima do "gong" saíram-se  muito mal. E deixam ficar pior o prestígio parlamentar. 

É possível tratar questões da maior seriedade e de enormes implicações humanas e sociais com este tipo de ligeireza, superficialidade e manobrismo processual? Não, não é.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

PGV - o Parlamento "Grande Vitesse"


Não chegámos a ter o TGV cavalgado por Sócrates, que nem no Poceirão encalhou. Em contrapartida, temos o Parlamento acelerado, o Parlamento TGV, o Parlamento que carimba as coisas a correr: o PGV - "Parlement à Grande Vitesse".


Hoje, foi uma evidência disso. 

Discutiam-se quatro projectos de revisão da lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA), da autoria do BE, do PS (dois projectos: um oficial, outro da JS e mais alguns deputados) e do PSD. São várias as questões complexas que, no seu conjunto, esses projectos provocam: ampliação da PMA a mulheres sós; ampliação da PMA a uniões homossexuais; possibilidade de recurso à PMA sem diagnóstico de infertilidade; introdução da possibilidade de recurso à maternidade de substituição, vulgo "barriga de aluguer"; liberalização ainda maior do uso dos embriões "excedentários" para investigação científica.

Pois bem. No plenário, o debate não chegou a demorar mais do que uma hora mal medida! Os partidos deste debate - PSD, PS e BE - passaram por este debate como cão por vinha vindimada. Sinal de embaraço geral? Sintoma de desconforto? Má consciência por uma clara fífia de agenda político-legislativa? 

A coisa não se compreende, a começar pelo Bloco, que abrira a romaria e marcou a agenda. Mas fica também muito mal aos outros envolvidos (os dois PS e o PSD) e, sobretudo, deixa mal a Assembleia da República. Apenas se compreende a actuação de CDS e PCP, que marcaram as posições próprias.

O Parlamento tem uma função política e social de sintonia com a sociedade. Se os debates parlamentares são obscuros e fugazes, a sociedade não entende. Em matérias tão carregadas de significado, de valores e de consequências, o debate legislativo deveria durar dois ou três dias, para que todos os pontos de vista pudessem ser ouvidos e ponderados, as opiniões fossem integralmente confrontadas, todos os argumentos se percebessem, a voz da sociedade fizesse ouvir-se nas diferentes incidências, a opinião pública pudesse entender e assimilar a discussão e, fosse qual fosse o resultado, o país pudesse entender o regime que viesse a ficar estabelecido. Hoje... nada disso!

No princípio da Assembleia da República, era assim. Lembro-me de grandes, extensos e profundos debates sobre a Reforma Agrária, o Arrendamento Rural, a reforma do Ministério Público, o Serviço Nacional de Saúde, etc. Depois as coisas foram evoluindo e sendo sucessivamente formatadas, até chegarmos a este extremo do debate legislativo "tipo-bitoque". Isso é muito mau. Não o digo apenas para as leis de hoje, mas para outras. Pode discutir-se a nova Lei do Arrendamento assim? Podem rever-se leis de combate à corrupção assim? Pode reformar-se o quadro das leis laborais assim?

É preciso deixar respirar os grandes debates legislativos. Alguém aceita, por exemplo, que as "barrigas de aluguer" possam vir a ser introduzidas em Portugal, no quadro de um debate tão pobre, tão fraquinho, tão clandestino, tão fugidio, tão PGV, como tivemos hoje? Podemos aceitar processos que enfraquecem, senão destroem mesmo, a própria legitimidade social das leis?

Nem de propósito, o jornal "Público" destacou, hoje, em primeira página, que «o primeiro grande estudo sobre a percepção da democracia em Portugal aponta para a existência de uma "desconsolidação" do sistema democrático», acrescentando que «apenas 56% dos portugueses consideram que "a democracia é preferível a qualquer outra forma de governo".» - estudo "A Qualidade da Democracia em Portugal: a Perspectiva dos Cidadãos", da autoria de António Costa Pinto, Pedro Magalhães, Luís de Sousa e Ekaterina Gorbunova.

O debate parlamentar do dia de hoje é uma das explicações para esse fenómeno preocupante: o afastamento da sociedade relativamente ao Parlamento, e vice-versa, só servem para alienar a população da democracia.