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quarta-feira, 8 de novembro de 2017

A destruição de Portugal

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Clemente Pedro Nunes, hoje saído no jornal i.
Há que garantir que o repetido colapso do Estado português, nesses dias fatídicos de 17 de junho e 15 de outubro de 2017, não voltará nunca a repetir-se.

Pico da Melriça

A destruição de Portugal
Há que garantir que o repetido colapso do Estado português, nesses dias fatídicos de 17 de junho e 15 de outubro de 2017, não voltará nunca a repetir-se.
Do alto do pico da Melriça, centro geográfico de Portugal continental, no concelho de Vila de Rei, o cenário é vasto e grandioso: do castelo de Abrantes, a sul, à serra de Aire, a oeste, à serra da Estrela, a nodeste, e à Lousã, a norte, é a imagem deslumbrante do “Portugal telúrico” de Miguel Torga, em que se divisa ainda o castelo templário de Tomar de onde, há quase 900 anos, se organizou o povoamento que garantiu a existência de Portugal.

Mas, hoje, dali também se contempla a terrível destruição humana e material provocada pelo colapso do Estado português neste verão de 2017.

Custa a acreditar, mas no meio daqueles montes e vales estão, em Pedrógão Grande e em Castanheira de Pera, por exemplo, as casas e as estradas onde mais de 110 portugueses morreram este ano queimados pelo fogo, em devastações que nunca deviam ter acontecido. E esta tragédia arrisca-se a provocar o completo despovoamento daquelas terras “mágicas e rudes”, destruindo a obra iniciada pela aliança entre D. Afonso Henriques e os templários.

Agora, o que fazer para salvar estas terras no coração de Portugal? Em primeiro lugar, há que garantir que o repetido colapso do Estado português, nesses dias fatídicos de 17 de junho e 15 de outubro de 2017, não voltará nunca a repetir-se. Pra isso, proponho duas medidas prioritárias:

– Que o crime de fogo posto florestal seja imediatamente equiparado ao crime de terrorismo, de forma a que a respetiva moldura penal se torne mais severa e, sobretudo, para que seja dada prioridade máxima à investigação deste tipo de crimes;

– Que o combate aos fogos florestais seja comandado por profissionais especializados e que nunca mais se assista a chefias impreparadas da Autoridade Nacional da Proteção Civil a demonstrarem total incompetência técnica no combate aos fogos. Neste sentido, o exemplo espanhol duma divisão militar tecnicamente preparada para fazer face aos fogos florestais parece ser excelente.

Mas, depois, há que assegurar que haja atividades económicas geradoras de empregos que garantam a sobrevivência demográfica deste território. E, aqui, o país está face a uma emergência nacional em que, para se conseguir a sustentabilidade económica, terá de se prever uma discriminação positiva para todas as atividades económicas nos concelhos em estado de emergência – incluindo todas as atividades agrícolas, pecuárias e florestais que são a base da ocupação do território.

Numa lógica de sustentabilidade territorial, deve começar-se por uma medida fácil de aplicar em todos os concelhos declarados em estado de emergência:

– Para promover o emparcelamento, todas as escrituras de aquisição de terrenos rurais, até parcelas consolidadas de 50 hectares, devem ter nos próximos cinco anos isenção de IMT e de todos os impostos e taxas administrativas atualmente aplicáveis.

Mas outras medidas de promoção do emprego têm de ser tomadas nestes concelhos:

– Redução para 5% da TSU a cargo dos trabalhadores em todos os novos contratos de trabalho celebrados até 2022;

– Dado que um dos maiores problemas humanos e sociais destes territórios é a idade avançada de muitos pequenos produtores agrícolas e pecuários dos minifúndios, considera-se indispensável conceder-lhes um regime fiscal simplificado, a exemplo do que já acontece noutras regiões da Europa, para que apenas tenham de declarar às empresas a que vendem os seus produtos o seu número fiscal, estando automaticamente isentos de IRS se o total anual das vendas dos seus produtos, acrescido de eventuais reformas e pensões, não for superior ao limite da isenção do IRS;

– Isenção total do IRC em 2018 para todas as PME instaladas exclusivamente nestes concelhos;

– Isenção do IVA na venda de lenha, biomassa, pellets e brickets comercializados nestes concelhos, facilitando assim o escoamento dos muitos milhares de toneladas de material florestal que ficaram espalhados por todo este território;

– Dar uma majoração acrescida a cada MWh de eletricidade produzida nas centrais térmicas a biomassa instaladas nestes concelhos, para que se viabilize economicamente durante todo o ano a queima segura de resíduos florestais e agrícolas.

Ao ler as deliberações do último Conselho de Ministros dedicado aos fogos florestais deste último Verão, verifica-se que estas medidas não estão lá contempladas – o que é preocupante, porque mais importante do que dar dinheiro para reconstruir casas é fazer com que os agentes económicos se sintam motivados para trabalhar e investir nestes concelhos numa lógica de médio e longo prazo, em fileiras económicas que acrescentem valor à economia nacional.

O povoamento do território tem de ter uma base de produtos transacionáveis assente na agricultura, na pecuária e na floresta. A partir daqui é que os investimentos no turismo rural podem fazer sentido. O turismo deve ser protegido como uma atividade económica relevante nestes concelhos, mas, com as tragédias deste ano, “ninguém vai fazer turismo no Verão para territórios despovoados onde se pode morrer queimado”.

Este conjunto de medidas urgentes para salvaguarda da sobrevivência de 40 mil quilómetros quadrados de território nacional deve ser uma prioridade duma democracia de qualidade.

Oxalá os nossos decisores políticos assim o entendam, para que não se concretize a destruição de Portugal.


Clemente PEDRO NUNES
Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade

NOTA:
artigo publicado no jornal i.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Ainda está aí alguém?


O grande apagão demográfico de Portugal vai-se cumprindo, com a impressionante regularidade de um relógio. É um relógio que anda para trás - mas com cadência certa.

A última notícia foi esta: Portugal perde quase 0,5% da população num ano (Jornal de Notícias). Notícia que já tinha aparecido mais correcta (os números são referentes a 2014 e não 2015) e completa, aqui: Portugal "perde" 200 mil pessoas em cinco anos e isso é preocupante (Público). 

Há, porém, ainda, quem desdenhe destes dados ou desvalorize o seu significado; ou que considere os números não representativos e os qualifique de alarmistas. Vale a pena, portanto, recapitular algumas fundamentais informações objectivas.

Já escrevi alguns posts sobre este tema, a saber: Portugal do futuro: a catástrofe demográfica (Fevereiro 2012); A encolher... (Junho 2013); e O abismo demográfico (Setembro 2013). 

O primeiro dava conta das previsões demográficas das Nações Unidas para este século, com grande extensão, pormenor e variedade de dados - notícia com que deparei em Maio 2011, em plena campanha eleitoral para as legislativas de há quatro anos e a que ninguém ligou importância, nem debate motivou. E o título já assustava: Portugal vai perder 4 milhões de pessoas até 2100.

Ora, aquilo a que estamos exactamente a assistir, ano após ano, é ao cumprimento pontual desse quadro previsional. 

Os números de 2012 já o indicavam, como sublinhei no post A encolher...  - no ano anterior, a perda de população portuguesa fôra de 55 mil habitantes. E é isso mesmo que, agora, se confirmou de novo quanto a 2014: uma perda de 52.500 pessoas em 2014. 

Este cenário é, aliás, um pouco pior do que o apresentado pela "variante média" das Nações Unidas, que foi noticiada em Maio 2011 e que previa, naquele ano, uma perda média na população portuguesa de 47.000/ano para os anos futuros - como ilustrei, significava perder o equivalente à cidade do Porto a cada cinco anos! Esta "variante média" já foi corrigida, entretanto, para um pouco melhor, pelas Nações Unidas, passando a apontar, no final do século, para uma população portuguesa de 7.457.000, com uma perda acumulada de população de cerca de 3,1 milhões desde 2010 e uma perda média de 34.811 habitantes/ano.

Ora, a realidade está a ser bem pior do que isso: com números de perdas superiores a 50.000 habitantes/ano, o cenário assemelha-se mais à hipótese de "variante fertilidade constante" das Nações Unidas, perdendo-se a cada cinco anos o equivalente ao somatório dos concelhos de Cascais e Oeiras e chegando a 2100 com uma população de 6 milhões e uma perda acumulada de 4.587.000 de pessoas entre 2010 e ao final do século (perda média anual de 50.966 habitantes).

Portanto, não é tema com que devamos brincar, nem desdenhar. As Nações Unidas apresentam, aliás, uma previsão ainda mais pessimista, dita de "variante baixa": nesta hipótese, a população portuguesa será (não desmaiem...) de 4.425.000 no final do século, com uma perda acumulada de população de cerca de 6,2 milhões a seguir a 2010 e uma perda média de 68.500 habitantes/ano.

São, em qualquer caso, números de catástrofe. Com consequências económicas e efeitos sociais terríveis. Quando iremos todos despertar?

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

O abismo demográfico



A notícia mais grave, mais preocupante, mais terrível dos últimos dias, em Portugal, foi a de que, neste ano, nasceram no primeiro semestre menos 4.000 crianças em Portugal! Isto é, fazendo as contas:
  • nasceram, em média, menos 22 crianças em cada dia; e
  • estamos em rota para, pela primeira vez, ficarmos abaixo da fasquia dos 80.000 nascimentos num ano.
O precipício demográfico português tem sido vertiginoso neste século. Como podemos verificar pelas tabelas da PORDATA, em Portugal tivemos mais de 120.000 nascimentos em 2000, caindo pela primeira vez para baixo dos 100.000 em 2009, para recuperarmos ligeiramente em 2010 e voltarmos a cair dos 100 mil em 2011, para baixo dos 90 mil em 2012 e, a continuarmos assim... para baixo dos 80 mil neste ano de 2013.

Na década de '60, era normal nascerem mais de 200 mil crianças todos os anos em Portugal - e, assim, entre outras coisas, gerámos as bases dos sistemas sociais que pudemos construir.

A notícia desta última quebra de natalidade foi, agora, uma notícia da LUSA, que apenas conseguir furar o bloqueio noticioso, salvo erro, nas edições online do PÚBLICO e do DN. A notícia já nem saiu sequer nas edições em papel destes jornais e não a vi, nem a ouvi em qualquer rádio ou televisão. 

Tão-pouco se ouviu uma só palavra a um único líder ou dirigente partidário. E estamos em plena campanha eleitoral, com todos os líderes e principais dirigentes a falarem todos os dias! O que faria se não fosse assim...

Não é só deserto, é também silêncio.

Vivemos tempos de superficialidade, em que não é importante o que tem importância. 

Já lá vão três dias e é como se não soubéssemos o que se sabe.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

A encolher...


Já aqui tenho abordado o tema do declínio demográfico. Um dos meus posts foi "Portugal do futuro: a catástrofe demográfica", há mais de um ano.

É um problema a que não se liga a devida atenção, apesar de, desde pelo menos há dez anos, ser notícia regular na comunicação social. E já antes os mais lúcidos e atentos alertavam para isso. Mas é um tema que vem... e vai. Perante a indiferença geral e dos poderes públicos, o inverno demográfico é que é cada vez mais grave e alarmante.

Hoje, a notícia vem no PÚBLICO: Portugal acabou 2012 com menos 55 mil residentes. É um facto que não surpreende. Dói, mas não espanta. [Também no jornal i: População residente em Portugal em 2012 continua a cair. ]

Por mim, naquele post, tinha estimado, em linha com as projecções divulgadas pelas Nações Unidas para o final do século, que iríamos perder uma média de 47.000 habitantes por ano - o equivalente a um concelho como o Porto, a cada cinco anos.

Já estamos, afinal, pior que isso. Se nada for feito, perderemos, não 4 milhões, mas quase 5 milhões de habitantes até 2100.

Um país decadente, envelhecido e em declínio, uma economia anémica e miserável, os sistemas sociais em cacos - é o que espera quem cá estiver, se nada inverter a rota do desastre.

domingo, 11 de novembro de 2012

Dá que pensar...


Sem palavras. Este gráfico não precisa de legenda. Somos um país que desaparece. 

Portugal tem a segunda taxa de fecundidade mais baixa do mundo - noticiava, há dias,a TSF. Fez notícias e um debate público. Mas, apesar dos alertas repetidos, pouca gente faz alguma coisa. 

Qualquer dia, é demasiado tarde para fazer qualquer coisa de jeito. Já é tarde, aliás. Convém é que não seja demasiado tarde.

O gráfico foi importado daqui.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

O futuro é de África

[clique para ampliar]

Estou farto de ouvir que «África é um continente perdido». Só gente sem visão pode pensar e dizer esse tipo de coisas. Sempre pensei o contrário. 

Acharão talvez que exagero na minha "africofilia". E não compreenderão o título deste post, quando são tão más - ainda - as notícias dominantes que nos chegam do continente africano. Perguntarão por que digo eu que o futuro é de África.

É fácil. Basta analisar e estudar os números e quadros das previsões demográficas das Nações Unidas, constantes do "World Population Prospects: The 2010 Revision". Basta olhar para o gráfico acima, cujo original pode ser consultado aqui. Que nos diz o gráfico?

O continente africano tem, hoje, apenas 14,8% da população mundial. Subirá para 23,6% em 2050 e  para 35,3% em 2100 - por outras palavras, África corresponderá a 1/4 e a 1/3 do mundo, respectivamente a meio e no final deste século. Conhecerá sensível melhoria da situação sanitária, contínuo crescimento económico, progresso social e assinalável aumento do peso político global. Mora aí o futuro. 

A Europa é que, se não se cuida, coitadinha... Cairá de 10,7% da população mundial, para 7,7% em 2050 e 6,7% em 2100. Ainda por cima envelhecida e fraca.

Portugal do futuro: a catástrofe demográfica


Não sei o que me surpreende mais: se a notícia em si, publicada em Maio do ano passado; se o facto de não ter gerado reacções. Não houve nem alarme, nem nenhuma mostra de preocupação nas altas esferas de decisão.

E, todavia, só o título em si arrepia: Portugal vai perder 4 milhões de pessoas até 2100 - uma previsão do relatório "World Population Prospects: The 2010 Revision", publicado pelas Nações Unidas. 

Esta é, aliás, apenas a previsão média, de acordo com a qual, estudando um pouco mais, verificamos que Portugal irá perder, em média, a cada 5 anos, 235.000 habitantes, ou seja, perdemos um concelho como o do Porto todos os cinco anos. Nesse cenário, evoluiremos ao longo do século num quadro demográfico desastroso: seremos cada vez menos e mais velhos - a idade média da população passará para cima dos 50 anos de idade por alturas de 2030 e por aí se manterá grosso modo. Apesar de essa previsão apontar para uma recuperação progressiva do índice de fertilidade a partir de 2020 (hoje, nos 1,3), a recuperação é muito lenta e insuficiente: ainda estaremos em 1,99 em 2100, abaixo dos 2,1 que asseguram a mera reposição das gerações. E evoluiremos de uma pirâmide demográfica invertida (situação em que estamos a entrar e a que chegaremos por volta de 2050) para um quadro de tronco demográfico em 2100: população igual em todos os estratos etários dos 0 aos 70 anos, com quebra apenas a partir daqui.

Se analisarmos a previsão baixa, os números são ainda mais assustadores: um verdadeiro cataclismo demográfico. Em 2100, a população portuguesa terá caído para 3,7 milhões de habitantes, perdendo nós, em média, 410 mil habitantes a cada 5 anos - Portugal perderia todos os cinco anos o equivalente aos concelhos de Sintra e Mafra, incluindo Agualva, Cacém, Algueirão, Mem Martins, Queluz, Monte Abraão, Massamá, Rio de Mouro, Colares, Ericeira, etc. A idade média dos portugueses passaria para cima dos 60 anos a partir de 2060, arrastando-se depois nesse patamar. Perderíamos, neste século, 7 milhões de habitantes, caindo para cerca de 1/3 do que somos.

Por seu turno, numa hipótese de taxa de fertilidade constante, a população portuguesa cairá para 5 milhões até ao final do século. Nessa hipótese, perderemos todos os cinco anos o equivalente aos municípios de Cascais e Oeiras, incluindo Estoril, S. Pedro, S. Domingos de Rana, Parede, Carcavelos, Santo Amaro, Paço d'Arcos, Algés, Carnaxide, Miraflores, Linda-a-Velha, etc. - iremos perder, em média, 335.000 habitantes a cada 5 anos. Nesta hipótese, a idade média dos portugueses passará para cima dos 50 anos em 2035 e dos 55 anos em 2065. E seríamos, no fim do século, metade do que somos hoje. Note-se ainda que esta hipótese, por sinal, estima a taxa de fertilidade actual em 1,36, quando efectivamente já estamos pior que isso: 1,31.

É verdadeiramente terrível o declínio a que a cultura anti-família e anti-natalidade nos conduz, desde os anos '80 e de forma cada vez mais aguda: seremos menos, muito poucos, envelhecidos, mais pobres, mais sós e mais fracos. 

Teremos cada vez mais aldeias abandonadas, porventura vilas desertas e cidades de bairros decadentes. O quadro será de falta de dinamismo económico e crise social profundíssima - porventura a completa insustentatibilidade. Não percebo por que não houve ainda um sobressalto.

Leio no EXPRESSO que o Presidente da República irá retomar os "Roteiros do Futuro" e dedicará o próximo (17 de Fevereiro) justamente ao tema do declínio da fecundidade na Europa e em Portugal. Faz bem. Tem sido dos poucos a tocar esta tecla. O Bloco e a esquerda socialista continuam alegremente a brincar às agendas fracturantes. E os partidos dominantes continuam sem capacidade ou sensibilidade para assumirem uma clara agenda pró-família e pró-natalidade. Uns por falta de convicção, outros por complexo.

Temível futuro se prepara a Portugal. Sobretudo para as mais novas gerações. Esses que vão chegar a 2100 serão, quase todos, aqueles que ainda não nasceram. Coitados!

E, todavia, é bem possível dar a volta.