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quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O PCP e a Coreia do Norte


No dia que vai a enterrar Kim Jong-il, o segundo da dinastia comunista norte-coreana, e ascende ao trono não o primogénito, mas o favorito Kim Jong-un, terceiro da linhagem, seria oportuno que o PCP esclarecesse, de uma vez por todas, a sua posição sobre o regime despótico que condena o povo à fome e à miséria e constitui permanente ameaça à paz regional e mundial.


José Lello deixou o repto irónico na Assembleia da República, em reacção à votação dos comunistas contra Václac Havel: não se curvando perante o grande democrata checo, curvar-se-ia o PCP perante Kim II? Não houve resposta ao desafio. Mas, de facto, é oficial, o PCP enviou as suas condolências à Coreia do Norte e não consta que as mandasse à República Checa.

O regime norte-coreano é um quebra-cabeças permanente para os comunistas portugueses. Quando, em 2003, Bernardino Soares exprimiu as suas "dúvidas" sobre se a Coreia do Norte "não seria uma democracia", esse excesso de zelo gerou reacções entre outros comunistas. Mais tarde, Bernardino terá mudado a sua posição ou, pelo menos, a sua verbalização. Mas aquele desabafo ficou-lhe colado como uma segunda pele de que dificilmente se libertará: muitos o recordam em debates parlamentares, a propósito e a despropósito.

Noutras ocasiões, o posicionamento perante a tirania caricatural de Pyongyang voltou a dividir os comunistas portugueses. Mas estamos ainda para saber os fundamentos genuínos dessa reverência patética perante um regime ignóbil. Aguarda-se declaração política do PCP na Assembleia da República, na abertura do Ano Novo. A aplaudir ou a repudiar.

Entretanto, ficam as imagens do enterro, hoje de manhã:


As cerimónias ainda vão durar mais três dias.

O dissidente


Na votação do PCP contra o pesar pela morte de Havel, não foi suficientemente comentada a saída do hemiciclo do secretário-geral Jerónimo de Sousa. Na altura, muitos deputados (a começar por mim próprio) nem se deram conta do facto. Mas contou a imprensa, sentada mesmo ao lado da bancada parlamentar comunista: «Durante a votação, o secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, abandonou o hemiciclo, tendo regressado logo após os deputados votarem.»

Por que seria? Por que não quis Jerónimo votar com a sua bancada? Por discordar da orientação do Comité Central, obediente à ortodoxia e ao passado? Ou, pura e simplesmente, por não querer ficar na fotografia?

Às vezes, sou assaltado pelo sentimento de que a fractura absoluta entre as bancadas do PS e do PCP, que afecta a esquerda portuguesa e também o sistema democrático, já não faria muito sentido, trinta e seis anos depois do "gonçalvismo" e vinte e um anos após a queda do Muro e o fim da "guerra fria". Contudo, é sempre o PCP, reavivando ciclicamente a velha fractura histórica entre bolchevistas e menchevistas, que se encarrega de avivar a memória e consolidar a fractura. 

É pena. O sentido de serviço do interesse público de que muitos comunistas são sinal fica impedido de contribuir mais para o bem comum, por virtude dessa marginalização num gueto anacrónico de anti-democracia e de ameaça à liberdade. É que esta forma de os comunistas portugueses votarem, falarem e agirem, em matérias sensíveis da História e dos direitos humanos, não são apenas peças de museu, barrocas e irrelevantes; mas sinais políticos inquietantes de que, se as circunstâncias o proporcionassem, estariam prontos a repetir esse mesmo passado de horror. Perseguições, assassinatos políticos, prisões arbitrárias, execuções sumárias, ditadura de partido único, esmagamento das liberdades fundamentais, campos de concentração, tortura, imperialismo totalitário? - Não! Nunca mais!

Nem a "renovação" da bancada do PCP, com a entrada de novos deputados de novas gerações, tem servido para alterar o que quer que seja. Os comunistas portugueses querem guardar ciosamente o seu brio estalinista: "o mais estalinista dos partidos comunistas da Europa Ocidental", como se fizeram conhecidos. Às vezes, dá ideia de que é mesmo pior.

Já uma vez ofereci à deputada Rita Rato o "Arquipélago Gulag", de Alexander Solzhenitsyn, que a jovem comunista, quando se estreou em 2009, afirmou que "não conhecia, nunca lera". [Por sinal, nunca soube os ecos dessa oferta.] O actual secretário da Assembleia da República, Jorge Machado, aparenta frequentemente ser o digno sucessor no invejável título de "o Sectário-geral", expressamente criado para Mário Castrim. Bernardino Soares, um líder parlamentar competente e correcto, dificilmente se libertará dos desabafos, que em tempos fez, sobre a "democracia" na Coreia do Norte. E há vários outros casos de jovens velhos do ortodoxo PCP da mesma linha do antes "estalinar" que torcer.

A novidade foi mesmo Jerónimo de Sousa. Por que seria?


Kremlin doméstico


A votação, na Assembleia da República, do voto de pesar pelo falecimento de Václav Havel, na passada quinta-feira, surpreendeu quase toda a gente, embora não fosse novidade, nem surpresa. Tendemos a esquecer o que é realmente o PCP - e é sempre o PCP que faz questão de nos querer lembrar o que é.

Este 22 de Dezembro de 2011 merece ficar na História, pelo menos desta XII Legislatura. 

Vinte e dois anos depois da queda do muro de Berlim e da "revolução de veludo", que devolveu a independência e a democracia à Checoslováquia, a bancada comunista em São Bento votou contra a História, opondo-se ao pesar pela morte do histórico dirigente checo.

O voto do PCP é mais do que apenas o alinhamento passivo pelo que seria o pensamento de Estaline, Kruschev ou Brejnev, e talvez ainda Andropov, se estivessem vivos e ainda reinassem no Kremlin. É mais do que a mera rejeição da "revolução de veludo" e da democracia checa. É ainda o eco pesado dos mesmos tanques soviéticos que esmagaram a "primavera de Praga", em 1968, esse marco de tantas dissidências entre os comunistas do mundo inteiro e também nos comunistas portugueses. E é o sinal de ódio especial a um líder do antigo "bloco comunista" que provou não esquecer o que sofreu e foi sempre, até ao último dia de vida, especialmente consequente na denúncia dos regimes comunistas sobrantes e na promoção internacional da causa da liberdade e da democracia: Václav Havel, precisamente. Em Cuba, o regime castrista detesta-o. Em Lisboa, a bancada do PCP também.

O voto do PCP foi um manifesto. Um manifesto activo contra a democracia. Um manifesto contra a liberdade dos povos. Um manifesto contra o futuro.

É muito curioso este tique recorrente dos comunistas portugueses: em política externa, continuam a agir como "5.ª coluna" do imperialismo soviético. Repete-se sempre, uma e outra vez, já o observei noutras ocasiões: sempre que se trata de matéria de política internacional, o PCP age, em reflexo condicionado, como "franchising" póstumo da Praça Vermelha e dos velhos senhores do Kremlin. 

Quanto a democracia, liberdade, direitos do Homem fundamentais, o que nos safa não são os comunistas domésticos; é o Kremlin soviético que já lá não está.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

URSS - a abolição da memória



Não deixa de ser sintomático e surpreendente que o facto de passarem, hoje, exactamente 20 anos sobre o fim da União Soviética (a URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas), tenha passado praticamente despercebido nos noticiários. Não mereceu qualquer destaque na imprensa, na rádio e na televisão e, na generalidade, nem sequer uma simples menção. Se alguém leu, viu ou ouviu alguma coisa sobre a efeméride, agradecemos que nos diga para fazermos uma breve estatística.

Que o fim de uma das duas potências que dominaram o século XX; de um regime nascido de uma revolução brutal, com frio poder assassino, e de uma terrível Guerra Civil; de um país, ou melhor, um regime autor dos maiores horrores e atrocidades de toda a História da Humanidade (nomeadamente no período do Estalinismo); do epicentro de exportação da revolução comunista para dezenas de países, explorando fracturas de injustiça e manipulando ilusões; do Estado que, depois de ter integrado os Aliados que derrotaram o nazismo de Hitler, fez dividir a Europa e o mundo com o Muro de Berlim e a "cortina de ferro"; de um dos pólos da "guerra fria", que nos colocou nos anos '60 a '80 à beira da III Guerra Mundial e do pavor de um Holocausto Nuclear - é mais do que simples mostra de falta de memória. É um péssimo sinal do fim da memória, de abolição da memória.

Uma das frases mais citadas de Georges Santayana diz que «quem não se lembra do passado está condenado a repeti-lo». Esperemos que não - ninguém merece voltar a viver a ruína, a brutalidade, o atraso, a ameaça, os horrores da União Soviética. Uma vez chega.




 e a AFP fizeram excelentes e curtos trabalhos de evocação da efeméride. 


Não custava nada usá-los ou referi-los.

Em 8 de Dezembro de 1991, acabou a URSS. Saudemos o fim da União Soviética! 

Façamos-lhe o inventário. E que não volte.