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terça-feira, 31 de maio de 2016

Um dia igual, um dia diferente

Publicamos, aqui, o texto integral do artigo com o mesmo título, de que uma versão mais curta foi publicada hoje no jornal Público, no contexto das comemorações do Dia dos Irmãos.


O Fernando e eu, na festa dos meus 60 anos

Um dia igual, um dia diferente

- por José Ribeiro e Castro


É lema conhecido: todos iguais, todos diferentes. O mesmo pode dizer-se dos dias: têm 24 horas, mas todos são diferentes – pelo tempo que faz, pela hora a que o sol nasce ou se põe, pelo calendário. Repetem-se, todos os anos; e, repetidos, podem ser diferentes. O traço distintivo é a memória que assinalam ou o valor que celebram: um aniversário; ou a referência social que lhe associamos.

O dia de hoje distingue-se por ser Dia dos Irmãos – festejamos os irmãos e a sua relação. Foi em 18 de Setembro de 2014 que a assembleia geral da Confederação Europeia de Famílias Numerosas (ELFAC) resolveu instituir o Dia dos Irmãos, fixando-o a 31 de Maio a nível europeu, e iniciou a sua celebração anual, na sequência de uma primeira experiência estreada em Portugal nesse ano.

Já havia dias para praticamente tudo, não ainda para celebrarmos irmãs e irmãos. E, todavia, termos irmãos, sermos irmãos, é tipicamente a relação mais forte, mais próxima, mais duradoura na nossa vida. As experiências não são iguais. Há irmãos que se dão mal, não só os que se dão bem – estes predominam largamente sobre aqueles e são o exemplo que guardamos. Variam também os quadros e circunstâncias. Há os que só têm um irmão ou irmã e os que têm muitos. Há os irmãos de idade próxima e os de idades muito afastadas. Há irmãos dos dois pais e meios-irmãos, só de mãe ou só de pai. Há ser o mais velho e ser o mais novo. Há os gémeos e os que o não são. Há ter só irmãos, ou ter só irmãs, ou tê-los de ambos os sexos. Mas seja qual for o quadro, é singular e fortíssima a relação de irmãos. Prolonga-se e alarga-se por tios, primos e sobrinhos. Há sobrinhos, filhos de irmãos, que nos são tão queridos como filhos. Há primos, filhos de irmãos dos pais, com que enturmamos como irmãos – os primos-irmãos, propriamente ditos. E os tios, irmãos dos pais, são os que frequentemente têm connosco as conversas que os pais não têm, grandes camaradas de rectaguarda. É a relação de irmãos que estrutura a ampla e alargada relação familiar.

A lacuna já não existe. Ary dos Santos escreveu no poema que Fernando Tordo musicou para Paulo de Carvalho: “Natal é quando o homem quiser”. Assim é o Dia dos Irmãos: é quando o quisermos – não só quando nos lembramos dos irmãos, mas também neste Dia que, a partir da afirmação civil, escolhemos para os celebrar socialmente. Escolhemos 31 de Maio, hoje.

Existe, é certo, uma petição. Aliás, três: uma, dirigida à Assembleia da República; outra, para as instituições europeias; e outra, para as Nações Unidas. Essas petições são instrumentos de divulgação e agregação – não se destinam a pedir para ser criado o que já está criado. O Dia dos Irmãos existe desde 2014, instituído pela ELFAC.

Claro que será bom que qualquer dessas instituições públicas, superando partidarismos, o abrace e afirme também. Mas estes “Dias” existem fora de qualquer deliberação política. Onde está a lei ou a resolução que criou o Dia do Pai? Ou o Dia do Mãe? Ou o Dia dos Namorados? Não há. Vivem de afirmações sociais. O Dia Mundial do Escutismo resultou dos próprios escuteiros, que adoptaram o Dia de S. Jorge. O Dia Mundial da Terra decorreu da proclamação de um senador americano que foi fazendo o seu caminho. O Dia Mundial da Voz foi a escolha e decisão das associações de otorrinolaringologistas.

O Dia dos Irmãos já está aí para o celebrarmos; e só existe na medida em que o celebremos. De que serviria qualquer instituição proclamá-lo, se os irmãos não o festejássemos? O que seria do Dia da Mãe se não lembrássemos a nossa mãe, não lhe falássemos com um mimo ou uma graça, não lhe déssemos um beijo ou um abraço, não lhe escrevêssemos um bilhete, não lhe levássemos aquela flor?

De tão habituados estarmos aos eventos do “Portugal sentado”, perguntam-nos por vezes: o que vai acontecer no Dia dos Irmãos? O que vão fazer no Dia dos Irmãos? Será como cada um quiser. Ninguém pode substituir-se à singularidade da nossa relação com os nossos irmãos e à imaginação que cada um escolher. Pode ser uma almoçarada ou jantarada. Aquele encontro alargado de família que se adia há tantos anos, fazendo até o plenário dos irmãos, isto é, com tios, primos e sobrinhos também. Uma conferência telefónica via Skype, entre os que estão longe. Começar um jornal de família ou estrear uma página ou grupo no Facebook. Buscar e partilhar fotografias e vídeos antigos. Um concurso de textos, pequenas histórias, quadras, desenhos. Uma futebolada ou um torneio de matraquilhos, malha ou ping-pong. Redescobrir as caricas e os berlindes e fazer um campeonato. Um festival de karaoke. Um simples reencontro. Isso! O mais importante de tudo: reencontro.

Os irmãos marcam-nos para sempre. São como nossa segunda natureza. Na minha circunstância, só tive um irmão. Melhor dito, só tenho um irmão. É facto que já morreu; mas nunca deixei de o ter. Só vivendo, percebemos o que estou a dizer. Não o entendia antes; entendo-o agora.

Um cancro levou-o de repente: ainda novo, com 61 anos. Um cancro de pulmão de células pequenas: terrível! Um cancro de fumador, particularmente agressivo. Num ano, deixámos de o ter connosco. Foi diagnosticado em Fevereiro; morreu em Março do ano seguinte.

O meu irmão tinha qualidades extraordinárias, não só de inteligência, trabalho e dedicação, mas também de temperamento e alegria. Crescemos muito, cultivando sentido de humor diante da vida, das situações e das dificuldades. O desenvolvimento do cancro teve duas fases: uma, em que pensou num milagre; outra, de contra-ataque inexorável do bicho. Numa das últimas semanas, fui almoçar com ele perto do seu trabalho. Não tinha cabelo, por causa da quimioterapia. Ao sairmos para o restaurante, cruzámo-nos com umas jovens, colegas dele, que fumavam à porta do edifício. O meu irmão, sorrindo muito, olhou para elas e disse-me: “Zé! Eu já disse a estas meninas para terem cuidado: fumar faz cair o cabelo.” Elas sorriram também. Sorriso contido.

Nunca o ouvi lamentar a sua sorte. Mas o meu irmão gostava muito de viver. Adorava a vida. Sinto que partiu triste. Gostava de ter mais tempo. E tinha muito para fazer.

Tenho sempre dúvidas sobre se estas coisas funcionam, pois também fui grande fumador e as recomendações não funcionavam comigo. Mas sinto que a prevenção do meu irmão a quem fuma é esta: “Cuidado! Fumar faz cair o cabelo.”


domingo, 22 de março de 2015

O meu irmão


Fez na passada sexta-feira, 20 de Março, um ano que o meu irmão morreu. Tinha 61 anos, a idade que eu tenho agora. Um cancro levou-o. De repente, assim no espaço de um ano. Já falei disso, há um ano.

Na missa de anteontem, em São Domingos de Rana – a sua Rua Sésamo –, falei do luto, de como as palavras vão lavando a tristeza e o vazio e deixando apenas o rasto que inspira e a presença. Sempre a presença - vaga, mas real. É uma coisa pascal, quadra que vivemos nesta altura: damo-nos conta de que é quando vemos que não é, sentimos que está quando reparamos que já não está. Foi assim com as mulheres cristãs que primeiro viram o túmulo vazio; e é assim com todos nós, quanto aos nossos que lembramos partidos.

Falei também dos seus filhos, treze irmãos: o Miguel, a Catarina, a Filipa, o Rodrigo, o João, a Madalena, a Carmo, o Marcos, o David, o Bernardo, o Samuel, o Lourenço e a Teresa. Foi este currículo que fez dele o fundador, o grande animador e o primeiro presidente da APFN – Associação Portuguesa das Famílias Numerosas, uma obra e um legado extraordinários. E também o líder europeu da ELFAC – European Large Families Confederation.

Diversamente dos meus sobrinhos, eu não tenho mais nenhum irmão. Éramos só o Fernando e eu. Não tinha escolha, nem ele. Não tínhamos “irmãos p’rá troca”, mas apenas a nós os dois. Talvez isso fizesse crescer entre nós uma cumplicidade fortíssima. Mesmo nos tempos de silêncio e de distância.

Em criança, zangámo-nos muitas vezes e bulhámos outras tantas. A espécie humana não é imune à luta animal pelo território; também isso temos de aprender a ocupar e a partilhar, a descobrir o que é reservado e o que é comum. Mas tínhamos, e desenvolvemos, uma cumplicidade fortíssima. E, talvez porque, nos conflitos, não tínhamos mais nenhum outro a quem recorrer, nem para pedir consolo, ou apoio, ou abrigo, nem para buscar uma qualquer arbitragem, soubemos – e aprendemos – que era entre nós os dois, mesmo, que tínhamos de reencontrar a paz e os seus termos. Só nós dois podíamos resolver os problemas que nós dois havíamos gerado ou entre nós dois haviam surgido. Nunca ficou nenhum por resolver.

Éramos diferentes. Por isso, complementares – nunca me lembro de rivais, nem eu dele, nem ele meu. Éramos uma parelha bem-disposta. É esse espírito e essa memória que tenho presente quando me empenho na instituição do Dia dos Irmãos, um projecto APFN e ELFAC. (Já agora, assine também a petição nacional e as internacionais.)

Ele era o mais velho e, desde muito miúdo, manifestamente engenheiro. Muitas engenharias fizemos lá em casa!

Uma vez, teríamos entre 11 e 13 anos – estaríamos, portanto, em 1965 ou por aí – resolvemos modernizar a casa e o conforto do nosso quarto. O meu pai, que era melómano, havia comprado, uns anos antes, um pick-up (assim se dizia) Blaupunkt, que era o seu orgulho: um móvel rádio e gira-discos, estereofónico, o último grito das maravilhas da técnica alemã. Tinha um pequeno inconveniente o aparelho: só dava para ouvir música na sala-de-estar. 

Lembrámo-nos, por isso, de instalar uma extensão para o nosso quarto. Comprámos longos metros de fio eléctrico, duas pequenas colunas de som em segunda mão e pregos e braçadeiras em abundância. E com mestre engenheiro à frente e eu de operário aprendiz, esventrámos a parte traseira do pick-up Blaupunkt do meu pai e ligámos as suas colunas estereofónicas ao fio eléctrico, que meticulosamente estendemos, em duplicado, até ao nosso quarto, bordejando os rodapés e os alizares (i.e., as ombreiras) das portas de passagem. Chegada a ligação ao nosso quarto, foi ligar as extremidades dos dois fios às novas colunas adquiridas – e aí estava a estereofonia a soar em pleno no nosso quarto. Uma revolução tecnológica nos anos ’60!

Como eram os pick up Blaupunkt do final dos anos '50
O que mais nos surpreendeu, ao fim do dia, é que o nosso pai não se zangou muito, ao chegar a casa e a minha mãe, que tinha estado fora o dia todo enquanto os dois operários trabalhavam, lhe mostrar a novidade. Ralhou um pouco, mas não demasiado. Sobretudo não mandou desmontar o inovador engenho – ganhámos! E até nos pareceu ouvir risota entre a mãe e o pai, fechados no quarto deles. Sempre nos ficou a ideia de que o meu pai ficou dividido entre a lesão traseira infligida ao seu prodigioso pick-up Blaupunkt e a admiração pelo engenho inventivo das suas adoráveis criancinhas. 

A qualidade do trabalho era, aliás, magnífica: o som funcionava quer na sala (o que o meu pai logo quis verificar), quer no quarto; e o fio estendido pela casa fora estava cuidadosamente pregado a rodapés e alisares, sem que a coisa chocasse minimamente. Um trabalho de categoria!

Uns dias depois, face à tolerância paterna, resolvemos introduzir mais um melhoramento – isto é, decidiu o meu irmão e eu fui atrás de aprendiz. Acrescentámos mais um circuito de fio, por aquela extensão toda, que interrompia o circuito de alimentação eléctrica do rádio. Assim, manejando no nosso quarto um pequeno interruptor de candeeiro, que adquirimos para o efeito, podíamos ligar e desligar o rádio à distância, sem termos que nos levantar. É certo que não dava para manejar o gira-discos, nem para mudar de estação de rádio; mas tínhamos música em directo a partir da nossa estação preferida, sempre que queríamos. Um telecomando da década de ’60, novo prodígio tecnológico!

Tudo o que sei de bricolage – e muita coisa aprendi e faço – devo-o a essa relação com o meu irmão. Imaginação e inventiva, em que éramos ambos bons, conjugadas com engenharia, que era o seu ofício inato. Fizemos grandes exercícios de química (para grandes sustos da nossa mãe), fizemos fotografia, muitas e variadas construções, tornámo-nos reparadores domésticos para os mais diversos usos (o que reforçava as amnistias paternas), fizemos filmes, que montámos e sonorizámos.

Depois, ele foi para engenheiro – e oficial de Marinha. E eu para outra vida.

Foi o primeiro do seu curso na Escola Naval. E, em Boston, no M.I.T. - Massachusetts Institute of Technology, de novo o primeiro do seu curso como engenheiro construtor naval. Deve-se unicamente à crise do país e ao declínio prolongado em que mergulharam as questões do mar, que não pudesse ter dado mais contributo à sua área de especialidade e excepcional vocação. Foi um grande oficial de Marinha, um estimado professor da Escola Naval, um quadro reputado do Alfeite e um engenheiro de altíssimas competências e aptidões.

Nunca desistiu do mar, que era bem mais de metade dele próprio. E os baldões da vida acabaram por o levar de volta a esse seu domínio, destacando-se como o grande motor do Fórum Empresarial para a Economia do Mar, uma convicção profunda, mais do que um emprego, já nesta última década em que Portugal parece querer voltar a reencontrar o mar que nos bordeja e nos preenche.

Mas foi na família que se tornou socialmente mais conhecido. A partir da sua família numerosa fez um promontório de luta pela família e pelos valores familiares, tornando-os mais vivos e mais sonoros, num tempo e num espaço em que precisamos tanto deles. E de porta-vozes. Foi um soldado incansável dessa causa. Uma causa que fundou e que continua. Foi aí que o Presidente da República escolheu, agora, distingui-lo a título póstumo. Obrigado.

O meu irmão foi sempre um apaixonado, irradiando optimismo, vontade e confiança.

Em tudo o que fez, o Fernando pôs a sua alma. Por isso, nos é tão fácil reencontrá-la em tanto que deixou feito. E, assim, seguir.


José Ribeiro e Castro
22 de Março de 2015

terça-feira, 25 de março de 2014

Dia dos Irmãos e Irmãs


Depois das palavras que disse, aquando da morte do meu irmão Fernando, lembrando uma conversa com a Margarida Neto, a ideia do “Dia do Irmão” pegou por aí. Tenho recebido reacções e apoios. Uma sobrinha-neta minha, a Andreia, já começou mesmo uma página no Facebook: "Queremos o Dia do Irmão". Foi ela que me convidou para aderir - e já aderi. E a Margarida Neto também me diz querer não largar o assunto. Voltámos a falar, ontem.

Num comentário num post no meu mural do Facebook (hoje, de facto, vê-se tudo pela internet…), indicaram-me que já havia um Brothers and Sisters Day nos Estados Unidos, a que se somou, mais tarde, outro comentário, acrescentando que o mesmo se passaria no Brasil.

Fui, por isso, fazer uma busca mais demorada e usando também outras línguas, nomeadamente o inglês. Em espanhol, francês, alemão ou italiano, não encontrei nada de novo ou diferente.

Como disse no meu texto inicial, só tinha encontrado referências a um Dia do Irmão, na Índia, celebrado a 5 de Setembro - e com indicações muito escassas e incertas. Ver: aqui; ou aqui; ou aqui.

A indicação fornecida para a escolha desta data é a de que foi escolhida por ser o 10º aniversário da morte de Madre Teresa de Calcutá, que efectivamente faleceu a 5 de Setembro de 1997. Ora, salvo o devido respeito, isto não faz muito sentido, por duas razões: primeiro, o dia é sempre o mesmo, seja o primeiro, o segundo … o décimo ou o centésimo aniversário; e, segundo, não se intui facilmente, nem se percebe muito bem o que é que a morte de Madre Teresa de Calcutá tem a ver com a celebração dos irmãos no sentido familiar ou biológico do termo.

Vasculhando por aí, verifiquei que é esta data também que estará a chegar ao Brasil e é referida nalgumas fontes brasileiras. Uma fonte pergunta: «você viu na novela né?» E outra fonte comenta: «Na cultura da Índia é dia 5 de Setembro. Como o Brasil importa tudo, tem uns birutas tentando emplacar isso aqui.» Mas há quem não esteja sequer muito certo da coisa: aqui. Enquanto um outro procurou lançar um "Dia do Irmão", a fim de tentar localizar os seus irmãos que não conhecia - e acabou por desistir: aqui.

Penso que essa história do "10º aniversário" será provavelmente outra: terá correspondido à primeira vez em que se assinalou esse "Dia do Irmão" ou a fonte deu por isso, em 5 de Setembro de 2007. E, depois, o mal-entendido prosseguiu, como é habitual nestas coisas da internet, quando são mal verificadas e não estudadas. 

E, buscando melhor, nomeadamente numa fonte católica credível (o Zenit), sou levado a pensar que este 5 de Setembro – que, em qualquer caso, é muito recente e creio que não oficialmente assumido de forma significativa, nomeadamente a nível internacional – celebra o “irmão” no sentido cristão, evangélico e espiritual (todos somos irmãos em Cristo) e não no sentido de celebração da relação familiar propriamente dita a que me referi e que procuro. É o que, na verdade, se lê e verifica claramente por aqui - e, nesta perspectiva, a relação com a extraordinária figura de Teresa de Calcutá já faz todo o sentido.

Porém, entre fontes brasileiras, há quem situe esta mesma data como tendo origem no Nepal e a relacione com cerimoniais hindus - ver aqui. Teríamos que investigar melhor as singularidades da cultura nepalesa e o rigor dessa informação, para verificar se a data viajou do Nepal para a Índia (a que está ligada a vida e obra de Madre Teresa de Calcutá) ou se, ao contrário, foi da Índia que passou também ao vizinho Nepal. E apurar em definitivo, ao mesmo tempo, se esse 5 de Setembro tem a explicação acima relatada ou outra qualquer com origem na cultura nepalesa ou, mais amplamente, hindu.

Nos Estados Unidos é que, na verdade, encontrei outras notícias sobre o nosso dia no sentido de família: o Dia do Irmão, como dele falei, ou, para ser mais completo e exacto, um Dia dos Irmãos e Irmãs.

De facto, há um Brothers and Sisters Day, para que Irene Grais me alertou, no seu comentário no meu mural do Facebook. Há até uma página-portal na Internet. Será um dia que se celebra no último sábado do mês de Março, nalguns lugares norte-americanos – neste ano, portanto, festeja-se já no próximo sábado, 29 de Março de 2014. É uma iniciativa muito recente, que começou em 2007, e resulta do impulso particular de uma mulher em homenagem a um seu irmão falecido: «a woman who realized - too late - when her brother died, that she had never let him adequately know how much he meant to her.» Também tem página no Facebook, além do portal próprio. A sua oficialidade é duvidosa e a divulgação parece ainda fraca.

Para complicar as coisas, há outros datas para que se reclama a mesma celebração, também nos Estados Unidos.

Há fontes que situam um outro Brothers and Sisters Day a 2 de Maio, não tendo ainda conseguido descobrir nem o porquê deste dia, nem a extensão e efectividade que esta celebração já terá. As fontes não são muitas: ver aqui e aqui. Também parece ser uma coisa muito recente e ainda em movimento. Uma fonte italiana também aponta para este dia - Giorno dei Fratelli e delle Sorelle - embora esta fonte, isoladamente, não pareça muito fiável.

E aparece ainda um Siblings Day ou Dia dos Irmãos ("siblings” é o nome colectivo em Inglês para “irmãos” sem distinção de género), que se celebra, anualmente, a 10 de Abril.  Também resultou de uma iniciativa particular de uma mulher (Claudia Evart), em homenagem a um irmão e a uma irmã que faleceram tragicamente (ambos em acidentes). Este dia também é de invocação muito recente, desde 1997, e já terá alguma expressão nos Estados Unidos da América, embora ainda sem adopção oficial. Há uma fundação que o promove, a Siblings Day Foundation (com portal na internet e página no Facebook), e também é mais conhecido como National Siblings Day (Dia Nacional dos Irmãos). O dia 10 de Abril era o dia de anos da irmã Lesette Evart, como é explicado neste vídeo por Claudia Evart, a dinamizadora do movimento - ver também no YouTube.

Este é, portanto, como consegui recolher até este momento, o estado da arte.

Tirando o 5 de Setembro, que celebrará os “irmãos” noutro sentido (o sentido evangélico e cristão), temos já estas datas em circulação, tudo carecendo de melhor verificação e prova: o último sábado de Março (em dia móvel, portanto), o dia 10 de Abril e o dia 2 de Maio.

Temos já muito por onde escolher e a que nos associarmos, para instituirmos capazmente e passarmos a celebrar, como faz falta, o Dia dos Irmãos e das Irmãs. Ou, então, temos que fixar outra data, que faça mais sentido e tenha mais sólidos fundamentos na nossa avaliação. A meu ver, é muito importante que nos fixemos numa data que tenha condições para a respectiva internacionalização.

Até lá, como disse, o meu Dia do Irmão é 31 de Maio. É o dia em que nasceu o meu irmão Fernando. É também o último dia do mês de Maio (mês de Maria, que é, para os cristãos, a Mãe de todos). É a véspera do dia 1 de Junho, Dia Mundial da Criança – e como é mais feliz a criança se, desde a véspera, sabe que tem irmãos e/ou irmãs ou os vai ter. Como dizia o meu irmão Fernando, presidente e fundador da APFN e da ELFAC: «Se queres ver uma criança feliz, dá-lhe um irmão. Se queres ver uma criança muito feliz, dá-lhe muitos irmãos.»

Temos que nos organizar, auscultar e escolher. E, depois, instituir e fazer instituir o "Dia do Irmão" ou, mais exactamente, "Dia dos Irmãos e Irmãs".


Fernando Ribeiro e Castro: “Vai ser o meu último mandato!”

A Ana Cid Gonçalves, secretária-geral da APFN - Associação Portuguesa das Famílias Numerosas, escreveu, no mural da página de Facebook do meu irmão Fernando, este testemunho, que aqui agradeço e partilho, de forma reconhecida. É tudo verdade. Também fui testemunha.


“Vai ser o meu último mandato!”
Foi o que o Fernando declarou nas últimas eleições da APFN em que ainda se candidatou a Presidente da Direcção após a nossa insistência para que o fizesse. 
Longe estávamos, ele e nós, de saber do terrível cancro que o viria a levar tão precocemente… 
Conheci-o há 10 anos quando um amigo me pediu que desse uma ajuda na organização do II Congresso Europeu de Famílias Numerosas que se realizou em Portugal em 2004. O Fernando que eu conheci fazia de tudo na APFN: colava etiquetas, atendia telefones, fazia apresentações, escrevia, angariava artigos e compunha o boletim, geria os sócios numa aplicação informática integralmente criada por ele e que ainda hoje usamos... Mas também realizava trabalhos de fundo que exigiam muito tempo de recolha e tratamento de dados, pesquisa e compilação de informação (como os primeiros cadernos da APFN) e até mesmo o desenho conceptual de políticas públicas que hoje se mantém totalmente actual. Isto tudo de forma totalmente generosa e voluntária, noite dentro, após o seu horário de trabalho profissional e contribuindo muitas vezes com recursos próprios seus, como quando correu o país para arranjar delegados a expensas próprias.  
Fui totalmente contagiada por esta energia e generosidade, e um assunto que para mim nem sequer era assunto, passou a ser o assunto da minha vida.  
Sempre admirei a sua frontalidade e transparência. Nada na manga… Tudo o que pensava se conhecia. Muito directo e nada politicamente correcto, afirmava as suas fortes convicções de forma desabrida. Tinha sempre opinião que invocava muito seguramente mas, da mesma forma que o fazia, também era capaz de, no minuto seguinte e com toda a humildade, reconhecer razão na outra pessoa. 
Era muitas vezes mal interpretado, o que às vezes me entristecia. Frequentemente lhe atribuíam palavras, ideias e pensamentos que nunca teve. E ele sabia isso e, também por essa razão, queria que mais pessoas falassem em nome da APFN. 
Totalmente liberto de protagonismos, não procurava as luzes da ribalta. Sempre teve a preocupação e o cuidado de garantir que, como ele dizia, “a APFN não pode ser a Associação do Fernando”. Tudo fez para que tivéssemos uma equipa profissional capaz de dar resposta aos desafios com e sem ele. 
Apesar de profissionalmente ter tido sempre profissões exigentes e trabalhosas em termos de tempo, nunca deixou de dar pronta resposta a todas as necessidades da APFN e acredito que também de outros assuntos como, por exemplo, os da Confederação Europeia de Famílias Numerosas a que também presidia. Milagrosamente, arranjava sempre tempo para responder a todos os assuntos, muitas vezes no minuto seguinte. Extraordinariamente inteligente e rápido.  
Um maravilhoso sentido de humor. Achava tanta graça às nossas palhaçadas que chegámos a fazer capas de boletim falsas e outras brincadeiras só para ouvir as suas gargalhadas estrondosas. Era rara a vez que estávamos juntos e que não brincássemos a propósito de qualquer coisa.  
Mal entrava na sede, dava-se por ele. Acompanhava e estava próximo do nosso trabalho. Valorizava e entusiasmava muito a equipa. Distribuía os louros e agradecia constantemente o trabalho dos outros. 
Muito exigente, pensava em tudo e tudo fazia com enorme dedicação, mas também era muito compreensivo quando alguém falhava e as coisas não corriam exactamente como deviam. Podia até ficar bastante zangado num minuto mas, no minuto seguinte, já não era nada. 
Sempre apaixonado pela sua querida Leonor e pelos seus filhos e netos, vivia aquilo em que acreditava: uma família estável, unida e forte, e muitos irmãos, "é o melhor que se pode dar aos filhos". Os olhos brilhavam e sorriam quando falava deles e falava muitas vezes. 
Foi um visionário e antecipou muito do que hoje vivemos e do que teremos que enfrentar no futuro. Mesmo sabendo das dificuldades, era um optimista com uma enorme alegria de viver. Mas, tal como adorava viver, entregou-se tranquila e corajosamente à realidade de uma morte prematura anunciada.  
Embora sabendo que continuas connosco, sentimos e sentiremos muito a tua falta, Fernando.  
Agradeço muito o tanto que me deste. O exemplo, o testemunho, a força, o entusiasmo… Também tudo o que deste à APFN.  
Ana Cid Gonçalves