quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Reforma do sistema eleitoral – a génese indispensável para a melhoria da nossa democracia

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Fernando Teixeira Mendes, saído hoje no jornal i.

Uma reforma destas só não é feita porque a classe política portuguesa se protege, dentro do seu castelo, para não ser atacada e não ter concorrência.


Reforma do sistema eleitoral – a génese indispensável para a melhoria da nossa democracia

A preocupante degradação da democracia em Portugal está a afetar gravemente a vida dos cidadãos.

O sistema eleitoral em vigor permite que os sete líderes das bancadas parlamentares decidam os assuntos que os deputados vão comunicar no hemiciclo. Esta situação não pode continuar, porque assuntos de grande interesse para a sociedade civil não são aí debatidos.

Porque é que para a nossa Assembleia da República não se podem apresentar, por sua iniciativa e em círculos uninominais, candidatos independentes das estruturas partidárias?

Porque é que a revisão da Constituição de 1998 (há aproximadamente 20 anos!), permitindo círculos uninominais, não foi implementada seguidamente pelos partidos políticos? Foi um teatro o que andaram a fazer durante a revisão da Constituição?

Seria de grande interesse para o país que a Assembleia da República tivesse um grupo de deputados que debatesse e tomasse posição sobre, por exemplo, as perigosíssimas fragilidades atuais da nossa administração pública.

O que em 2017 se passou com os incêndios no interior do país foi vergonhoso, absolutamente inaceitável e só possível pelo facto de a frágil administração pública não permitir que as florestas e os incêndios sejam tratados e assumidos de forma correta e eficaz. Estamos muito pior do que há 50 anos.

Volto também a escrever sobre uma fragilidade que está a ser criada numa área que conheço bem: a da inspeção e certificação das instalações elétricas, em que o decreto-lei 96/2017, publicado em 10 de agosto passado, isenta de inspeções as instalações mais pequenas e passa as atribuições da CERTIEL – Associação Certificadora de Instalações Elétricas para a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) – isto depois de serem publicadas três portarias ao longo de dois anos anunciando um concurso público para escolha de uma entidade certificadora, o que nunca veio a verificar-se!

Reconheço as enormes capacidades técnicas e humanas dos poucos recursos da DGEG, mas sei que esta está sem capacidade para absorver a carga de trabalho que pretendem que assuma já a partir do início de janeiro de 2018.

As consequências da aplicação do decreto-lei 96/2017 vão ser graves para as populações.

Pergunto: porque é que, em termos de segurança de instalações elétricas, aqueles que têm casas pequenas não são tratados da mesma maneira que aqueles que têm casas grandes? Não se trata de uma discriminação inaceitável para os de menos posses? Todos lidam com a eletricidade, que pode produzir incêndios, e usam a mesma tensão mortal de 230 V, com potências de curto-circuito também de igual valor para todos.

Será mesmo lançado um concurso para auditorias técnicas por amostragem a serem efetuadas a instalações elétricas já em uso, tal como define o despacho 7394/2017? E se houver lugar a alterações obrigando a obras em casas habitadas ou em estabelecimentos comerciais em funcionamento?

Que se cuidem os partidos que têm ambições governativas porque, se continuarmos a ter alternância democrática em Portugal, o governo afeto ao PS faz a lei e, depois, os outros que estiverem no governo à época sofrerão as consequências!

Se os deputados da Assembleia da República sentissem a sua eleição verdadeiramente ligada aos cidadãos que os elegem, debateriam estes e outros assuntos com uma outra profundidade.

Para a melhoria da qualidade da nossa democracia e do nível da classe política, defendemos na APDQ – Associação Por Uma Democracia de Qualidade que cada eleitor possa exercer o duplo voto no seu boletim, assinalando: a força política (partido ou coligação) que prefere no respetivo círculo territorial intermédio e o deputado que escolhe no respetivo círculo uninominal de base.

Tal como em importantes países, como a Alemanha, o sistema é constituído por forma a que se ajuste no seu todo o peso das várias forças partidárias.

Uma reforma destas só não é feita porque a classe política portuguesa se protege, dentro do seu castelo, para não ser atacada e não ter concorrência. Conclusão simples: terá de ser a sociedade civil a iniciar o processo, dando indicações claras de que só apoiará partidos que defendam este tipo de reforma. É a sociedade civil que tem as ferramentas para a atuação na sua posse.

Não posso deixar de fazer aqui um grande elogio ao texto bem pragmático de José Ribeiro e Castro, recentemente escrito ao abrigo destes artigos:
“(...) Basta um só deputado com voz livre para a diferença logo se sentir. E, se todos forem de voz livre, não presos e vergados a tribos, não dependentes do chefe, mas pertencentes aos eleitores, o caso muda por completo de figura. A democracia vive porque a cidadania se afirma. Se a reforma eleitoral de 1998 tivesse acontecido, a corrupção teria chegado onde chegou? Não. Os bancos ter-se-iam degradado como aconteceu? Não. As negociatas teriam o terreno livre de escândalo que vimos? Não. A má gestão teria campeado? Não. A desertificação do país teria progredido como está? Não. Após os incêndios de 2003 e 2005, o país teria crescido na extrema vulnerabilidade ao inferno de 2017? É claro que não. Então estamos à espera de quê? Reforma política urgente, pois claro!”
Esta é uma reflexão cheia de propriedade e de enorme atualidade.

Na próxima segunda-feira 27 de novembro, às 18h30, na Livraria Buchholz, Rua Duque de Palmela, 4, em Lisboa, vamos lançar o livro “Reforma Política – Urgente”. Não deixe de comparecer!


Fernando TEIXEIRA MENDES
Empresário e gestor de empresas, Engenheiro
Subscritor do Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade

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