quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Uma tarefa para a sociedade civil (1)

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Fernando Teixeira Mendes, ontem saído no jornal i.
Espera-se agora que a Constituição e a lei eleitoral permitam que os cidadãos escolham de forma muito mais profunda e completa os seus representantes.

Uma tarefa para a sociedade civil (1)

É frequente ler-se e ouvir-se que estamos perto do fim do regime. Não sei se é verdade, mas, a ser, tal deve-se à muito baixa qualidade da nossa democracia. Para evitar cenários trágicos mais vale juntarmo-nos e actuarmos para melhorar a nossa democracia, que tanto nos custou implementar e consolidar.

Concluirão facilmente os leitores deste pequeno artigo que essa importantíssima tarefa compete agora à sociedade civil. Os partidos políticos estão, há décadas, a informar que pretendem introduzir as melhorias necessárias para aproximar os cidadãos dos órgãos decisores da nação, mas pura e simplesmente não fazem nada para isso. Os seus planos de acção resumem-se a dar sinais errados à população e aos próprios políticos, para que se continue a pensar erradamente que algo de melhor se perspectiva para o futuro.

A génese da qualidade de uma democracia está na forma como os deputados eleitos para a Assembleia que legisla e avalia o governo são escolhidos pelos cidadãos.

Sistemas como o actualmente vigente em Portugal são pouco usuais e têm aspectos muito negativos, nomeadamente os seguintes: 
  • Listas de deputados emanadas quase exclusivamente pelos directórios dos partidos políticos; 
  • Impossibilidade de os eleitores avaliarem os candidatos, não permitindo a exclusão de uns e uma melhoria do posicionamento de outros nas listas, facilitando assim a sua entrada no hemiciclo; 
  • Listagens com muitos seguidores em exclusivo dos líderes partidários e, ainda pior, com muitos candidatos escolhidos com base em critérios duvidosos. 

É, para mim e para muitos, bem claro que, com uma lei eleitoral como a nossa, o regime terá dificuldade em equilibrar-se. Compete neste momento à sociedade civil dar sinais claros sobre o que espera dos partidos políticos nesta matéria.

Em minha opinião, espera-se agora que a Constituição e a lei eleitoral permitam que os cidadãos escolham de forma muito mais profunda e completa os seus representantes. Tal como já é prática em muitos outros países, também em Portugal seria fácil implementar-se um sistema eleitoral em que a título meramente de exemplo se apresenta um modelo já estudado para o nosso país, em que:

  • Existam círculos uninominais, por exemplo uns 130 ao longo do país, onde, como o nome indica, apenas seria escolhido o candidato mais votado e para os quais deveriam ser aceites candidatos independentes das estruturas partidárias. A estes círculos adicionar-se-ia o círculo nacional com aproximadamente 100 candidatos, com a possibilidade de avaliação destes pelos eleitores, como critério de acesso ao hemiciclo e às importantes comissões da Assembleia da República. 

A existência de círculos uninominais, tal como acima definidos, ajuda em muito a aproximar os cidadãos dos actos eleitorais e, consequentemente, da Assembleia da República, porque se consegue assim completar uma eleição nacional com uma variável de representatividade local, tão importante para que os cidadãos sintam que alguém nesta Assembleia luta efectivamente pelos seus genuínos interesses.

Contra este sistema optimizado, e usado em muitos países desenvolvidos, costumam alguns dos representantes dos nossos partidos políticos alegar que “não assegura a governabilidade do país”, comentário que não corresponde à verdade. Permito-me acrescentar que, se esses partidos têm receio dos círculos uninominais com candidatos independentes, a solução mais simples para resolverem esse problema é escolherem os melhores candidatos para esses círculos, para assim garantirem a sua eleição.

Julgo não ser difícil para o leitor aperceber-se da vantagem deste sistema ou de outro semelhante para aproximar os eleitores dos seus eleitos para a Assembleia da República, contribuindo assim definitivamente para o processo de melhoria da qualidade da nossa representatividade democrática.

Além do acima exposto, os portugueses devem preparar-se para uma discussão profunda sobre o nível das remunerações da nossa classe política, porque os seus salários, se demasiado baixos, além de outros efeitos, não servem de alento a que os melhores se dediquem à causa pública, situação que temos de conseguir alterar. Este aspecto e um outro ainda, associado ao controlo do financiamento dos partidos políticos, são importantes para a nossa democracia e poderão ser abordados num próximo artigo.
FERNANDO TEIXEIRA MENDES
Gestor de empresas, Engenheiro
NOTA: artigo publicado no jornal i.

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