quinta-feira, 15 de setembro de 2016

A reforma das leis eleitorais

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Henrique Neto, ontem saído no jornal i.

A democratização do regime político português é um dos últimos objetivos dos partidos e, a julgar pelo passado, o mesmo se passa com os Presidentes da República.


A reforma das leis eleitorais

De acordo com os jornais, o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, escreveu uma carta aos partidos a pedir a revisão da lei eleitoral para as autarquias, no sentido de acabar com as limitações impostas aos candidatos independentes relativamente aos dos partidos. O mesmo foi reivindicado há anos pelos subscritores do “Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade” e suspeito que Rui Moreira terá a mesma resposta dos partidos: abertura para, num futuro mais ou menos longínquo, mudarem as leis eleitorais no sentido da sua democratização, sem que alguma vez o façam.

A razão é simples: a democratização do regime político português é um dos últimos objetivos dos partidos e, a julgar pelo passado, o mesmo se passa com os Presidentes da República. De facto, todos os partidos políticos portugueses pretendem, antes do mais, servir as suas diferentes clientelas, e não a democracia, e todos os sinais, passados e presentes, vão nesse sentido. À esquerda e à direita, os partidos têm assistido ao crescimento da abstenção nos diversos atos eleitorais, à emigração de centenas de milhares de jovens e à desilusão generalizada dos cidadãos portugueses com a atividade política, sem que isso os incomode ou os faça mudar de rumo.

Todos os partidos se recusam a compreender que os sucessivos erros que foram e estão a ser cometidos na governação do país são o resultado da má qualidade do pessoal político, bem como dos interesses criados para servir as suas clientelas. Seja porque privilegiam a mediocridade passiva dos seus seguidores, seja porque lidam melhor com os interesses e a corrupção do que com a competência e a verdade, os partidos políticos portugueses tornaram-se maus gestores da crise permanente e convivem bem com o empobrecimento dos portugueses, limitando-se a defender o castelo partidário de todas as veleidades de democratização do regime.

A reforma das leis eleitorais não se faz porque nenhum partido se dispõe a abrir o castelo partidário à competição leal e democrática e a permitir dar alguma esperança à vida de milhões de portugueses. Até a tentativa das primárias internas foi rápida e convenientemente esquecida.

Portugal vive um impasse histórico em que cada novo governo se limita a iludir os grandes problemas nacionais, culpando sistematicamente os adversários políticos pelos erros cometidos, numa guerra sem fim à vista, ao mesmo tempo que, imparável, a dívida cresce, a economia definha e o Estado vai buscar cada vez mais dinheiro aos bolsos dos contribuintes. Trata-se de um impasse essencialmente político que pode e deve ser resolvido de forma democrática, como reivindicado no “Manifesto Por Uma Democracia de Qualidade”. Ao impedirem a reforma das leis eleitorais e o acesso livre e em igualdade de condições de todos os cidadãos ao poder político, quer nas autarquias quer no parlamento, os partidos com assento na Assembleia da República tornaram-se os coveiros do regime, os grandes responsáveis pelo estado de crise permanente em que vivemos e pelo desastre previsível resultante do impasse político, económico, financeiro, comportamental e social que criaram.

Esta tentativa de Rui Moreira no sentido de alertar os partidos políticos portugueses e, naturalmente, o governo e o Presidente da República, para as condições antidemocráticas das leis eleitorais cairá no mesmo vazio de outras tentativas já feitas por vários setores da sociedade portuguesa. Será mais um sinal seguro de que as mudanças urgentes no panorama político nacional só verão a luz do dia pela revolta dos cidadãos portugueses ao compreenderem que não faz sentido, 40 anos passados depois do 25 de Abril de 1974, continuar a votar nos mesmos partidos que conduziram Portugal ao endividamento, à estagnação económica, ao empobrecimento e à dependência externa. Nas atuais circunstâncias, como noutros momentos graves da nossa história, apenas os portugueses podem ainda salvar Portugal e vencer a batalha pela mudança, a transparência e a decência na vida política, a qual passa numa primeira instância pela democratização do regime eleitoral.

Henrique NETO
Gestor
Subscritor do Manifesto Por uma Democracia de Qualidade

NOTA:
artigo publicado no jornal i.

Sem comentários: