domingo, 29 de abril de 2012

O domingo da Maria José


Hoje, o domingo é certamente pela Maria José Nogueira Pinto. O evangelho de hoje é o do seu tema favorito, o tema do último artigo que nos deixou, no própria dia em que partiu e publicado no dia seguinte: o Bom Pastor.

Evangelho segundo S. João 10, 11-18. 
Naquele tempo, disse Jesus:
«Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas. O mercenário, e o que não é pastor, a quem não pertencem as ovelhas, vê vir o lobo e abandona as ovelhas e foge e o lobo arrebata-as e espanta-as, porque é mercenário e não lhe importam as ovelhas.
Eu sou o bom pastor: conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem-me, assim como o Pai me conhece e Eu conheço o Pai; e ofereço a minha vida pelas ovelhas.
Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil. Também estas Eu preciso de as trazer e hão-de ouvir a minha voz; e haverá um só rebanho e um só pastor.
É por isto que meu Pai me tem amor: por Eu oferecer a minha vida, para a retomar depois. Ninguém ma tira, mas sou Eu que a ofereço livremente. Tenho poder de a oferecer e poder de a retomar. Tal é o encargo que recebi de meu Pai.»
Era melhor poder escutar este Evangelho ainda estando ela connosco. Mas sabe bem poder recordar a Maria José aqui ou ali, porque pontuou aqui e ali a nossa vida. 

Creio, como ela, que a Maria José vive este 4º Domingo da Páscoa, na companhia do Bom Pastor, Ele mesmo. Faz a nossa mesma leitura. O Senhor é o Bom Pastor, nada nos faltará.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

As viagens do Dia de Portugal


Muitos ignoram que o 10 de Junho não foi sempre o "Dia de Portugal". E ignoram também que a designação dessa data tem algum grau de arbitrariedade política.

O feriado nacional do 10 de Junho foi instituído por Salazar, promovendo a grau nacional o feriado municipal que, em homenagem a Camões, fora estabelecido na cidade de Lisboa após a implantação da República. Foi, então, designado também o "Dia da Raça". Nos anos da guerra do Ultramar, o 10 de Junho ganhou um outro significado particular na memória dos combatentes, em razão da homenagem nacional de que os mortos eram objecto anualmente nas cerimónias militares no Terreiro do Paço. Não é, porém, esta importante memória dos combatentes que o feriado 10 de Junho hoje celebra.

A seguir ao 25 de Abril, a data da revolução veio a ser declarada como "Dia de Portugal" pelo Decreto-Lei n.º 210-A/75, de 18 de Abril (ver ou descarregar *.pdf). O 25 de Abril passou a ser o "Dia de Portugal". Assim aconteceria durante três anos: 1975, 1976 e 1977, como é documentado por cartazes guardados na Biblioteca Nacional, de que a foto acima é ilustração.

Seria somente em 1978 que, pelo Decreto-Lei n.º 39-B/78, de 2 de Março (ver ou descarregar *.pdf), o 10 de Junho, depois de ter deixado cair o "Dia da Raça" do regime anterior, ganharia a denominação actual: "Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas". No mesmo sentido disporia, mais tarde, o Decreto-Lei n.º 51/92, de 11 de Abril (ver ou descarregar *.pdf).

É. O "Dia de Portugal" teve dias...

Mas o Dia de Portugal, na substância das coisas, sem necessidade de assim ser declarado, foi sempre o 1º de Dezembro, em razão de assinalar a própria existência independente de Portugal. O Decreto que o estabeleceu em 1910, há mais de um século, definiu-o assim: dia da «autonomia da Pátria portuguesa».

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Ciclos da Férin: Carlos Magno e Maquiavel


Pode ouvir aqui, clicando no link em baixo, a gravação da conferência-debate de Carlos Magno sobre o  livro de Nicolau Maquiavel«O Príncipe».

Ouvir: Carlos Magno e Maquiavel.

Este programa foi emitido pela Antena Um, no passado dia 4 de Março, no quadro da parceria que mantém com a Livraria Férin e o "Avenida da Liberdade", quanto ao ciclo POLÍTICA & PENSAMENTO: A VOZ DOS LIVROS

conferência realizou-se no dia 13 de Fevereiro.

domingo, 22 de abril de 2012

A demagogia das "pensões milionárias"


Capa do CORREIO DA MANHÃ
22 de Abril de 2012
O jornal CORREIO DA MANHÃ volta hoje a fazer manchete com o tema das "reformas milionárias" e põe em título: «Pensões milionárias custam 250 milhões por ano ao Estado. 5235 reformados de luxo.»

É um tema recorrente. Volta e meia, desde há anos, aparecem títulos destes contra os sistemas públicos de segurança social, pondo pressão indistinta contra as pensões mais elevadas e não fazendo distinção sobre se tais pensões decorram de privilégios ou antes dos descontos feitos pelo pensionista para o Estado ao longo de vários anos.

O tema presta-se a demagogia fácil, sobretudo em clima de penúria de recursos, como actualmente. Mas façamos contas.

Desde logo, «pensão milionária» porquê? As pensões serão "milionárias" porque sejam de 1 milhão de euros por mês? Ou que fosse de 1 milhão por ano? Nada disso! Em Portugal, estes títulos referem-se à velha memória dos 1  000 contos = 1 milhão de escudos. Mas onde isso já vai, Santo Deus!... Porque não recuar um pouco mais e taxar também de "reformas milionárias" as pensões acima de 1 milhão de Reis, isto é, acima do "1 conto de Reis" propriamente dito, ou seja, hoje, acima 4,99 EUR por mês? Estes também são "milionários"?

«Pensão milionária», nesta ADEC (Abordagem Demagógica Em Curso) , é aquela que é igual ou superior a 5 000 euros por mês, evocando a memória velhinha dos "1 000 contos", que equivaliam a 1 milhão de escudos. É assim que nos tornamos um país de "milionários" e com «rendimentos de luxo»... Aliás, nem só isso, pois, se formos ver com atenção muitas das "notícias" deste tipo, que alimentam, volta e meia, o sensacionalismo jornalístico, verificamos que são já consideradas "milionárias" as reformas com valores nominais acima dos 4 500 ou dos 4 000 euros mensais. Um absurdo.

Sigamos ainda, com mais atenção e detalhe, o título de hoje do CM: 250 milhões por ano, a dividir pelos apontados a dedo 5 235 «reformados de luxo», equivale efectivamente a uma média de 47 750 EUR anuais por cada reformado. Se estes valores corresponderem à previsão clássica dos 14 meses por ano, este valor médio corresponderá a 3 410 EUR por mês. Se corresponderem somente a 12 meses, corresponderão a 3 980 mensais. Ora, independentemente de acharmos pouco ou muito, onde é que uma pensão nominal de 3 410 ou 3980 euros pode ser apontada como «milionária»?! Milionários são os que ganham mais de 1 milhão de euros!

Cabe acrescentar que, sobre aqueles valores, incidem ainda o IRS e outros descontos obrigatórios. Ora, se àqueles montantes deduzirmos uma média de 25% a 30% de carga tributária efectiva, verificamos que aquelas «pensões milionárias» ficam em média reduzidas a 2 380 ou 2 980 euros mensais, consoante consideremos 14 ou 12 meses por ano. "Milionários" estes reformados? Ridículo! E há mais. Nessas médias, haverá porventura alguns (poucos) com pensões muito elevadas. O que significa que haverá também outros (muitos) com pensões reais ainda mais baixas que os 2 380 euros mensais líquidos. Na verdade, chegámos ao império do ridículo e da mais grotesca demagogia.

O pior, porém, é que este noticiário, alimentado por alguns jornais de forma recorrente, não é inocente. Visa criar o clima de assédio favorável à quebra das responsabilidades do Estado. No tempo do governo de José Sócrates, em que se iniciou a linha de "Os velhos que paguem a crise!", já se quebrou, pela primeira vez, o princípio sinalagmático fundamental de toda a Segurança Social: os nossos descontos são a contrapartida do seguro  social que constituímos e do que vamos receber mais tarde. Foi Sócrates que, pela primeira vez, fixou um tecto máximo às pensões públicas - mas não aos descontos. Por outras palavras, transformou em imposto parte dos descontos feitos para a Segurança Social pelos titulares de remunerações mais elevadas.

Hoje, com a crise financeira agravada, a pressão continua e aumentou. Mas é preciso ser justo e ter cuidado. Uma coisa é pôr termo e reformar por completo os sistemas de pensões de privilégio, que não assentaram em descontos: os políticos (cujo sistema acabou de 2005 para cá), o Banco de Portugal, a Caixa Geral de Depósitos, algumas administrações, alguns sectores com regimes especiais, etc. Ou uma coisa, ainda, é agir por forma a reduzir os "direitos" dos que, de modo oportunista, andaram a construir laboriosas "engenharias de pensões", que, independentemente do respectivo valor, não assentem nos descontos efectivos e sua capitalização. Outra coisa, completamente diferente, é ignorar, desprezar e atropelar o facto dos descontos feitos ao longo de dezenas de anos da carreira profissional pelos reformados e pensionistas.

Noutra perspectiva ainda, uma coisa é, no plafonamento de que se fala, limitar as futuras pensões, mas também limitar na mesma medida os descontos actuais, permitindo ao trabalhador/funcionário poupar ou  aplicar a parte sobrante no sistema que melhor entender; e outra coisa completamente diferente é, à la Sócrates, limitar a pensão, mas o Estado continuar a mamar os descontos pela totalidade.

A diferença é entre o Estado-pessoa-de-bem e o seu contrário.

Se um banco ou uma companhia de seguros nos ficasse com o contravalor de poupanças aplicadas ao longo de vários anos, chamar-lhes-íamos de GATUNOS! - e com inteira razão. Não é esse um caminho que possamos apontar ao Estado. Não quero um Estado ladrão.

sábado, 21 de abril de 2012

O vexame que está preparado




A proposta de lei de revisão do Código de Trabalho que, por estes dias se discute na Assembleia da República contém, a respeito da questão dos feriados, uma norma assaz curiosa:

Artigo 9.º
Feriados religiosos

A eliminação dos feriados de Corpo de Deus e de 15 de Agosto, resultante da alteração efectuada pela presente lei ao n.º 1 do artigo 234.º do Código do Trabalho, apenas produz efeitos depois de cumpridos os mecanismos previstos na Concordata celebrada, em 18 de maio de 2004, entre a República Portuguesa e a Santa Sé e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 80/2004, de 16 de novembro.

O que quer isto dizer? Quer dizer que foi proposto aos deputados decretarem já a eliminação de dois feriados religiosos (o Corpo de Deus e a Assunção de Nossa Senhora, o que é feito no artigo 2º da mesma proposta de lei, ao alterar o artigo 234º do Código), mas sem que a respectiva decisão seja efectiva. A proposta é a de ser, nesta parte, aprovada uma lei sob condição suspensiva: os senhores deputados decidem, mas fica tudo em suspenso até que se conclua a pertinente revisão (ou ajustamento) da Concordata.

Nunca vi tal coisa. E, logo a 8 de Março, tomei posição a este respeito, escrevendo a alertar a Comissão de Segurança Social e Trabalho para coisa tão bizarra e obnóxia. Esta norma procura contornar uma inconstitucionalidade: se os feriados religiosos estão directamente fixados num instrumento de direito internacional público, regularmente ratificado e que vigora na ordem interna portuguesa (o artigo 30º da Concordata), não pode uma lei vir dispor diversamente contra o ali directamente estatuído, enquanto a Concordata não estiver revista nesse ponto. A habilidade da "condição suspensiva" não passa disso mesmo: uma habilidade; e uma habilidade inválida e inconsequente.

Deixemos, porém, a discussão jurídica de lado. Mesmo não havendo inconstitucionalidade, esta norma representaria um vexame para a Assembleia da República e uma indignidade para os deputados.

Porque é que o Governo a propôs? Porque ainda não concluiu o diálogo com a Santa Sé e ainda não sabe o que a Santa Sé aceitará, ou não. Mas, se fosse o Governo a legislar por decreto-lei, faria uma coisa destas? É evidente que não: concluiria normalmente a negociação diplomática com a Santa Sé e, depois de esta encerrada, decidiria, então, em conformidade com o acordado.

Esta esperteza saloia, algo sonsa, da "condição suspensiva" inscrita na proposta de lei traduz, assim, uma flagrante desconsideração e falta de respeito pelos deputados e pela Assembleia da República, «assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses» e sede, por excelência, do Poder Legislativo. Os deputados são olhados e tratados como funcionários manga-de-alpaca, uns meros tabeliães de turno, devidamente adestrados para irem adiantando o serviço sem saberem bem o que estão a decidir.

Os últimos dias, aliás, têm adensado as dúvidas e perplexidades sobre tudo isto. Primeiro, há abundante especulação sobre se haverá acordo, ou não, com a Igreja. Segundo, já se sabe que um dos feriados religiosos a eliminar não será provavelmente Assunção de Nossa Senhora (15 de Agosto), mas Todos-os-Santos (1 de Novembro), embora a proposta de lei mantenha uma previsão já ultrapassada.

Isto faz algum sentido? Nenhum! Já faltam poucos dias para sabermos se o(a)s deputado(a)s aceitam ser tratado(a)s como gansos de foie gras: carregar pela boca.

Ciclos da Férin: João Salgueiro e a crise das dívidas soberanas


Pode ouvir aqui, clicando no link em baixo, a gravação da conferência-debate de João Salgueiro sobre o  livro de Jacques Attali«Estaremos Todos Falidos Dentro de Dez Anos?».

Ouvir: João Salgueiro e a crise das dívidas soberanas.

Este programa foi emitido pela Antena Um, no passado dia 18 de Fevereiro, no quadro da parceria que mantém com a Livraria Férin e o "Avenida da Liberdade", quanto ao ciclo POLÍTICA & PENSAMENTO: A VOZ DOS LIVROS

conferência realizou-se no dia 6 de Fevereiro.

Qual é o dia primeiro?

Deixo aqui registo das palavras que disse na pré-apresentação, a 19 de Abril de 2012, do meu livro «1 de Dezembro, Dia de Portugal»

«1 de Dezembro, Dia de Portugal» 


Quis fazer, hoje, aqui, o pré-lançamento do livro «1 de Dezembro, Dia de Portugal» pela razão de um duplo simbolismo. Primeiro, o de estarmos no Palácio da Independência, o antigo Palácio dos Almada, onde reuniram e conspiraram os 40 conjurados que, a 1 de Dezembro de 1640, daqui partiram para libertarem Portugal e iniciarem a luta pela restauração da nossa plena soberania. Segundo, em homenagem aos 40 patriotas que, encabeçados por Alexandre Herculano, lançaram em 1861 o Manifesto da Comissão Central 1º de Dezembro de que resultou a movimentação continuada da sociedade civil e, anos depois, a instituição do respectivo feriado nacional - sendo que a Comissão Central foi renomeada, mais tarde, como Sociedade Histórica da Independência de Portugal e viria a fixar aqui a sua sede, que, hoje, me acolhe. Muito obrigado.

A dupla homenagem a esses dois "40" - os quarenta revoltosos da Restauração e os quarenta patriotas do Manifesto - não é um acaso: é uma convocação a outros novos quarenta nos dias de hoje. Se houvesse 40 deputados na maioria, com a mesma têmpera patriótica dos de 1640 ou dos de 1861, o grave problema com que estamos confrontados e que nos inquieta já estaria resolvido. E o 1º de Dezembro já estaria a salvo. Essa é a pergunta: haverá esses 40?

Este livro não tem a ver com o passado, tem a ver com o futuro. O 1 de Dezembro, eterno, de que falamos não é um 1º de Dezembro enclausurado em 1640. É a memória, o marco e o registo do valor fundamental de todos nós, de um valor fundamental da nossa Pátria, que aponta acima de tudo ao futuro: sermos e continuarmos a ser portugueses, livres e independentes. Nós somos livres para o futuro, não para o passado. Somos livres e independentes para fazer, não tanto para lembrar. Por isso, dedico o livro aos meus filhos e aos meus netos. É para eles - não tanto para mim, nem para meus pais, nem meus avós - que o livro faz sentido e que a data, este feriado nacional, tem o maior significado. O 1º de Dezembro é uma herança que é uma raiz. É um capital.

Neste transe em que o Governo nos colocou agora quanto aos feriados, a pergunta que temos que responder é esta: no calendário oficial de Portugal, qual é o dia primeiro? Qual é o dia número 1?

O dia primeiro, o dia n.º1, é o primeiro dia, é o 1º de Dezembro! É este o primeiro dia do resto da nossa independência, o primeiro dia da nossa liberdade reconquistada, o primeiro dia de todos os outros dias portugueses - o primeiro dia do Portugal eterno que celebramos. É o dia que só poderia ser apagado depois de todos os outros, o dia cujo apagamento seria o do nosso próprio apagamento.

O que são feriados civis? Feriados civis são momentos simbólicos e marcos referenciais de religiosidade civil.

Os feriados são tradicionalmente religiosos: correspondem a festas religiosas que a comunidade celebra em conjunto e se impuseram ao próprio Estado. Com esse exemplo da tradição, o Estado procurou copiar. E os feriados civis corresponderam, assim, a uma criação do Estado moderno, que procurou, ao modo religioso, ligar todo o povo em torno de determinados valores civis, tidos por fundamentais na coesão política da comunidade nacional: a liberdade, o Rei ou a Rainha, a República, a vitória numa guerra, a Paz, etc. e, à cabeça de todos, a independência nacional do país e a própria existência da Nação. Por isso, todos os Estados que lutaram pela sua independência e a conquistaram têm feriados da independência - e celebram-nos como dias fundamentais, como o seu dia primeiro. E, por isso também, não faz o menor sentido apagar esse feriado e deixar de o ter. Só se deixássemos de existir. Ou deixássemos de ser livres.

O conteúdo fundamental desta pré-apresentação de hoje é a divulgação de um inédito incluído neste livro «1 de Dezembro, Dia de Portugal»: um  anteprojecto de lei para restaurar o feriado, se ele viesse a ser eliminado. O que quero eu dizer com isto?

Quero mostrar o nosso estado de prontidão, como tenho sentido por todo o lado. Se, por desgraça, o feriado nacional do 1º de Dezembro fosse extinto, abolido, esmagado, apagado, eliminado, nesse mesmo dia nasceria em Portugal o MOVIMENTO DA RESTAURAÇÃO. Lutaríamos sem cessar pela reposição do feriado fundamental, do feriado dos feriados, deste feriado que é o Dia de Portugal pela natureza das coisas.

Por isso, chamo a este anteprojecto de lei o "projecto de lei do pleonasmo": Restaurar a Restauração. E tenho a acrescentar a minha profunda convicção: se da outra vez (em 1580/1640) levou 60 anos a restaurar a independência e se da outra vez (em 1861/1910) levou 49 anos a instituir o feriado, agora estou convencido que será muito mais rápido. Tão rápido, tão rápido que até confio que o feriado nem chegue a ser abolido.

À cautela, porém, aqui fica o sinal da nossa prontidão, para, caso seja necessário, partirmos em luta imediata,  inconformada, inconformista, incansável, pela reposição do feriado nacional do 1º de Dezembro, Dia de Portugal e da Independência Nacional. E estou absolutamente certo de que não passaria muito tempo até o termos conseguido restabelecer.

É com essa certeza que me ocorre fazer aqui uma prevenção especial dirigida à Igreja Católica, a quem o Estado está a pedir também dois feriados religiosos para serem eliminados ao lado do 5 de Outubro e do 1 de Dezembro, datas civis. A Igreja fará um muito mau negócio se aceder à abolição de dois feriados religiosos num quadro de decisão em que se tem tornado manifesta a falta de amadurecimento suficiente e a ausência de consenso social e político minimamente consistente. 

O que é resultaria daí, se o Governo levasse avante um mero capricho e uma teimosia absurda contra aquelas datas simbólicas? Bastaria a mudança de ciclo político, para aquelas datas simbólicas civis serem, de imediato, repostas como feriados nacionais no calendário oficial - e as datas religiosas, essas, seriam esquecidas e ficariam apagadas, porque a Igreja teria anuído à sua abolição.

Estas matérias são de carga colectiva, histórica e simbólica tão acentuada que só podem ser decididas, revistas e reformadas em quadros decisórios de grande consistência, ponderação e maturidade. Tudo exactamente ao contrário do que, infelizmente, foi feito e acontece.

Vou continuar até ao fim. Não me incomodam os incómodos. Só me importam dois PP: a palavra e Portugal. Vou prosseguir, sem nunca virar a cara, porque este caminho é justo, porque este caminho é recto. Viva o 1º de Dezembro! Viva Portugal!

José Ribeiro e Castro

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Absoluta confusão na saga dos feriados religiosos


Ninguém consegue perceber ao certo em que pé está a questão da eliminação de dois feriados religiosos. Primeiro, disse-se que acabariam a Quinta-feira Corpo de Deus e o 15 de Agosto (Nossa Senhora da Assunção) - e é isto que consta da proposta de lei do Governo. Depois, disse-se que a Santa Sé preferiria manter o 15 de Agosto, aceitando antes a eliminação do 1 de Novembro (Todos-os-Santos). E, nos últimos três dias, a confusão explodiu em grande festival.

Primeiro, há três dias, a imprensa deu conta de que um "enviado" do Vaticano expressou reservas quanto a aceitar a eliminação de feriados religiosos. Pouco depois, o porta-voz da Conferência Episcopal, Padre Manuel Morujão, veio corrigir o efeito destas notícias, dizendo que os comentários de Monsenhor Fabio Fabri eram meramente «pessoais» e repondo o seguinte: «É consensual o [fim do feriado de] Corpo de Deus e depois provavelmente será a celebração de Todos os Santos a ser suprimida, se for por diante a última sugestão apresentada à Santa Sé»

Porém, o Cardeal Patriarca de Lisboa levantou, ontem, a voz para dizer que a Igreja preferia não mexer em nada: «as festas não são assim tantas para podermos negociar e as festas em questão têm um grande impacto popular», salienta, exprimindo o receio de que a eliminação dos dias santos corresponda «à perda das referências religiosas e católicas na vida social portuguesa». Na véspera, tinha sido a Conferência Episcopal a dizer que não havia nenhuma urgência nisto. E, hoje, foi a vez do arcebispo de Braga, D. Jorge Ortiga, vir defender que os feriados religiosos «deveriam continuar como estão», embora acrescentando, a contragosto, que a Igreja «está disponível» para os reduzir, satisfazendo a imposição do Governo.

Estes factos e contradições, num processo que já tem largos meses, mostra a absoluta falta de condições para decidir o que quer que seja nesta altura. E, por mim, acho muito bem que a Igreja se cuide e se precate. 

A falta de consenso social e político quanto à eliminação dos feriados do 5 de Outubro e do 1º de Dezembro é tão flagrante que não é preciso ser bruxo para prever o seguinte: se fosse por diante a imposição do Governo, bastaria uma mudança de ciclo político para serem de imediato restaurados aqueles dois feriados civis - no dito popular, seria "trigo limpo, farinha amparo". Alguém duvida disso? Mas, já quanto aos entretanto eliminados dois feriados religiosos, esses ficariam obviamente no caixote do lixo com o acordo e bênção da Igreja - uma vez extintos, com anuência eclesiástica, não haveria quaisquer condições para os repor no calendário.

Por isso, enquanto o Governo continua apenas a dizer está a fazer as «diligências necessárias com a Igreja», o que é de recomendar à Igreja é o velho remédio: muita prudência e caldos de galinha. 

E como é que pode admitir-se que a Assembleia da República possa ser levada a tomar decisões sem saber ao certo, preto no branco, o que é o Governo já acordou, ou não, exactamente, com o Vaticano? Sobretudo em matéria tão sensível. Só nós... Pobre país, pobre sistema político.

Ora aí está uma boa ideia!


O presidente da CIP, António Saraiva, veio, agora, dizer que a alteração da orientação quanto ao fim de feriados implicaria a reabertura de negociações no quadro da concertação social. É capaz de ser uma boa ideia, tão fraquinho e incerto foi o texto acordado em matéria de pontes e feriados.

António Saraiva, em tom de aviso, afirma que «quando agora se alteram as regras de jogo, isso desequilibra o acordo e nesse sentido temos que voltar à concertação social para encontrar os equilíbrios para os desequilíbrios que foram introduzidos». E acrescenta: «Quando agora vêm dizer que já não são quatro, que podem ser só dois agora e depois para o ano vemos quais são os dois religiosos que se vão considerar, estamos a adulterar as regras do jogo». 

Deixando de parte o pormenor - importante - de que o acordo de concertação social de 18 de Janeiro não fala do corte de "quatro feriados", mas de "três a quatro", tudo o que se tem passado, neste domínio, mostra a  ligeireza do processo seguido e a absoluta falta de maturidade política e social para estabelecer o que foi "acordado". E, assim sendo, o melhor é mesmo capaz de ser voltar ao princípio. 

Ciclos da Férin: Pedro Lomba e a Doutrina Social da Igreja


Pode ouvir, clicando no link em baixo, a gravação da conferência-debate de Pedro Lomba sobre o «Compêndio da Doutrina Social da Igreja».

Ouvir: Pedro Lomba e a Doutrina Social da Igreja.

Este programa foi emitido pela Antena Um, no passado dia 21 de Janeiro, no quadro da parceria que mantém com a Livraria Férin e o "Avenida da Liberdade", quanto ao ciclo POLÍTICA & PENSAMENTO: A VOZ DOS LIVROS

A conferência realizou-se no dia 10 de Janeiro, estreando o ciclo.

Reformar não é fazer tábua rasa de tudo

Divulgamos a intervenção feita pelo General Garcia Leandro, membro do Conselho Supremo da SHIP - Sociedade Histórica da Independência de Portugal, na pré-apresentação, a 19 de Abril de 2012, do livro «1 de Dezembro, Dia de Portugal» da autoria de José Ribeiro e Castro.


LANÇAMENTO DO LIVRO
1º DE DEZEMBRO – DIA DE PORTUGAL
de
José Ribeiro e Castro

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

Encontramo-nos hoje nesta Sociedade Histórica para formalmente apresentarmos o livro sobre o significado do 1º de Dezembro, do Deputado José Ribeiro e Castro, mas verdadeiramente o que está em causa é Portugal, os seus valores e o seu futuro.

Com grande visão, sentido de Pátria e coragem desencadeou o Dr. Ribeiro e Castro um conjunto de acções alertando para as consequências nefastas da abolição do feriado do 1º de Dezembro, comemorativo da Restauração de 1640.

A SHIP assumiu, como era sua obrigação, este processo e esta luta já que na sua origem se encontra esta marca histórica de um renascimento nacional após um desaparecimento de 60 anos do concerto das Nações; foi a Comissão Central do 1º de Dezembro de 1640, criada em 1861 por um grupo de 40 patriotas que deu origem, mais tarde, à SHIP.

Neste momento tornou-se necessário voltar ao processo de 1861, envolvendo um largo especto de portugueses responsáveis de todas as profissões e sensibilidades políticas, já que por uma iniciativa governamental descuidada e superficial se pretende acabar com o feriado nacional que comemora uma accção única da nossa vida colectiva.

O livro fala por si e vem, além do mais, dizer que existem alternativas para esta decisão alarmante.

Mas, é preciso um enquadramento conceptual, histórico e do momento em que vivemos.

Posso dizer que todos os sócios da SHIP e todos os subscritores deste Manifesto compreendem a conturbada situação internacional actual, as dificuldades de Portugal e do seu Governo; por isto, muitos de nós temos dado apoio público à acção deste Governo.

Mas as dificuldades da actual governação do País não permitem tudo, de qualquer modo, sem qualquer cuidado; como em qualquer rota da vida individual e colectiva, há sinais, indicações, perigos a evitar e proibições.

Não se pode roubar a alma e os valores de uma sociedade nacional; se assim fosse o seu desaparecimento seria apenas uma questão de tempo.

Ora a governação de um País obriga a conhecer a sua História, a sua realidade actual, a situação internacional e o que se pretende para o seu devir.

Se se pretenderem apenas aplicar receitas importadas e avançar com medidas superficiais e pouco pensadas, sem se conhecerem a História, o País real e a máquina do Estado, não existe um quadro delimitado de actuação e os erros vã-se acumulando.

Começa a ser muito visível que, neste Governo, responsáveis existem que nada disto conhecem, nem da História, nem do País real, nem da máquina do Estado e das suas obrigações.

Infelizmente, citando o Dr. António Vitorino em declaração recente, desde a nossa entrada na CEE que as opções dos Fundos Europeus e a sua gestão não foi a melhor levando-nos à actual situação, em que se têm de tomar muitas medidas correctivas num curtíssimo espaço de tempo.

Mas o acto de reformar não pode significar fazer tábua rasa de tudo, para tudo voltar a reconstruir; os exemplos históricos desta tentação acabaram sempre com grandes prejuízos. Os erros podem surgir, mas também podem ser corrigidos; é o que se pretende com este Manifesto e com este livro.

Também se tem a consciência que este ponto pode ser apenas uma gota de água nas preocupações do Governo, mas o seu valor tem uma dimensão e qualidade perante o qual a SHIP e todos os patriotas não podem ceder.

Gostaria de lembrar um pouco da História.

Se Portugal acedeu à Independência em 1139 com D. Afonso Henriques viveu durante muitos anos na guerra da reconquista cristã, sempre em acampamento militar, só vindo a ter fronteiras definitivas em 1297 com o Tratado de Alcanizes.

O Estado, verdadeiramente, só surgiu com D. Diniz, mas o grande e sólido sentimento de Nação só emerge e se consolida com a crise de 1383/1385 e as suas consequência que vão até Aljubarrota, onde ficou definido que esta parcela ocidental da Península Ibérica tinha decidido seguir um caminho separado dos seus vizinhos peninsulares.

Depois foi a expansão e o Império no norte de África, no Oriente e no Brasil que termina, depois de anos de decadência, no desatre de Alcácer Quibir e na perda da independência, com a monarquia dual e o domínio de Madrid.

Foram 60 anos de grandes dificuldades, cujo final começou a terminar nesse 1º de Dezembro de 1640, mas cuja consolidação demorou 28 anos de guerras até 1668 quando a Espanha aceitou finalmente de novo a nossa independência.

E tivémos de lutar contra uma situação internacional desfavorável, obrigando a uma grande actividade diplomática junto das diferentes potências da época; não será dispiciendo lembrar que o último Estado a reconhecer a Restauração foi o Vaticano, só depois da Espanha ter aceite a nova realidade imposta pela vontade de um povo e pela força das armas. Curiosamente, o mesmo Vaticano que actualmente não aceita eliminar feriados religiosos.

Se até aqui, tínhamos estado afastados intencionalmente das querelas europeias tal deixou de ser possível para o futuro.

A Europa envolveu-nos na Guerra da Secessão de Espanha, na Guerra dos Sete Anos, na expansão napoleónica, na I Guerra Mundial e em toda a dinâmica do difícil século XX.

Será de lembrar que a marca de 1640 é tão importante que mesmo na NATO tivémos o cuidado de negociar de modo a que nunca estivéssemos no mesmo Grande Comando Estratégico com a Espanha.

Com 1986 e a entrada na Europa das Comunidades, com a nova situação mundial pós queda do Muro de Berlim, com a globalização crescente de todas as actividades que desembocou na crise financeira mundial iniciada em 2008, com os sucessivos Tratados Europeus apontando para uma maior integração, o mundo é já muito diferente.

E vão acontecer mais mudanças a um ritmo talvez maior. Por isso temos de nos preservar em todas as frentes.

Hoje aquilo que nos liga a Espanha é mais forte do que o que nos separa, mas dentro de um conceito em que os Estados e as Nações são separados.

Trabalha-se em conjunto e para um futuro europeu melhor, mas com a consciência de que existem Nações e identidades diferentes; em nenhum lado se pensa de outro modo. E ainda há povos que lutam diariamente pela sua independência e todas as Nações comemoram oficialmente as suas datas históricas mais relevantes.
Ora isto, obriga-nos a voltar a 1640 e ao 1º de Dezembro.

Para quem não tenha percebido, trata-se do único evento dos últimos 400 anos sem o qual Portugal não existiria; foi a restauração e o renascimento pela vontade de um Povo.

Eu repito: trata-se do único evento sem o qual o Portugal acual  não existiria.

Se assim é, como se pode aceitar que este, ou qualquer outro, Governo venha legislar de modo a matar este momento que permitiu o nosso renascer?

Que autoridade histórica, patriótica, moral, de cidadania e social, de respeito por nós próprios, existe para querer impor este assassínio de um valor colectivo?

Apenas existe a autoridade jurídica que, para este caso, é insuficiente.

Como o livro que hoje é apresentado aponta, há soluções alternativas que permitem ao Estado ter menos feriados sem tocar no 1º de Dezembro que deve ser inviolável - é só uma questão de conhecer e compreender a História e os valores da nossa vida colectiva.

Estamos, assim, a publicitar esta situação e a dar aos responsáveis políticos opções que lhes permitam encontrar alternativas para o seu objectivo que é só económico.

Uma palavra especial de parabéns e agradecimento ao Deputado Ribeiro e Castro pela sua iniciativa e trabalhos que permitiram acordar a população portuguesa para a gravidade desta situação.

Lisboa, 19 de Abril de 2012

José Eduardo Garcia Leandro
Membro do CS da SHIP
Cadeira nº 9

O que posso fazer pelo meu Portugal?

Divulgamos a intervenção feita pelo Presidente da Direcção da SHIP - Sociedade Histórica da Independência de Portugal, José Alarcão Troni, na pré-apresentação, a 19 de Abril de 2012, do livro «1 de Dezembro, Dia de Portugal» da autoria de José Ribeiro e Castro.


O que posso fazer pelo meu Portugal?
Posso e devo defender-lhe a Memória, a Identidade e a Autoestima.

Faz poucos meses que estou na presidência da Direcção da SHIP – Sociedade Histórica da Independência de Portugal – fundada em 1861, há pouco mais de cento e cinquenta anos, por quarenta patriotas anti-iberistas, de entre os quais avulta a figura de Alexandre Herculano, tendo por objecto estatutário a defesa da Independência, Individualidade, Identidade, Memória, Autoestima, Língua e Cultura do nosso velho Estado-Nação. Agora, acabo de levar um murro no estômago – e comigo, creio que quinze milhões de Portugueses, residentes no País e na Diáspora –,  murro que consistiu na agressão tecnocrática da nossa actual classe política, a qual  nos pretende privar do feriado nacional identitário do 1º de Dezembro de 1640.

Ora, se há feriado indiscutível, este é o do 1.º de Dezembro, data sine qua non dos demais. Na verdade, se não tem existido a Restauração da Independência, em 1 de Dezembro de 1640, não haveria 5 de Outubro, 10 de Junho, 25 de Abril ou qualquer outro, porquanto a agenda dos feriados nacionais seria fixada por Madrid. Quanto muito, a Região Autónoma de Portugal, provavelmente com o título honorífico de Reino, celebraria o seu Dia da Autonomia.

Se há feriados indiscutíveis, estes são o 1.º de Dezembro e o 10 de Junho, datas que unem a Nação Portuguesa, em torno dos seus Bandeira, Hino, Valores, Memória, Identidade, Língua, Cultura, Gentes e Heróis.

Há pouco mais de cem anos, o Governo Provisório da Iª República, cerca de uma semana decorrida sobre o 5 de Outubro de 1910 – concretamente, a 12 de Outubro – definiu com lucidez os feriados incontornáveis de Portugal, sem distinção de civis e religiosos.

Foram nomeadamente o 1.º de Dezembro, o 5 de Outubro, o Natal, o Ano Novo... Os Portugueses, durante um século, evocaram as efemérides referidas – sem contestação nem divisões – às quais acrescentaram, mais tarde, o 10 de Junho, o 25 de Abril e o 1º de Maio.

Os feriados do 1º de Dezembro e do 10 de Junho são, indiscutivelmente, insubstituíveis, por neles se evocar a essência da Portugalidade. Sem a Restauração, no dia 1º de Dezembro de 1640, Portugal não celebraria quaisquer outros feriados, porquanto a Portugalidade estaria dissolvida na Hispanidade e a Língua Portuguesa subalternizada à Língua Castelhana. Ao 1.º de Dezembro deve Portugal a sua Independência e a universalidade da Língua e Cultura Portuguesa.

Também, sem o 1.º de Dezembro de 1640, provavelmente não existiriam Brasil, Angola ou Moçambique, como grandes Estados-Nação de Língua Portuguesa. E os demais países e regiões da Lusofonia ou Luso-esfera – unidos pelo Mar que Portugal sulcou – seriam distantes reminiscências de uma muito remota soberania lusitana.

Um Estado que não comemora, como seu principal feriado, o dia da Independência é um Estado bastardo, sem dignidade nem valores. Alguma vez os Estados Unidos pensariam em deixar de evocar o Independence Day?

Recorda-se que a Guerra da Restauração se não travou só com a Espanha, na Terra e no Mar, mas também contra a França, no Brasil, e os Países Baixos, no Brasil, em África e no Oriente. 

A Restauração mobilizou a Nação Portuguesa, na Europa e no Ultramar, combateu e venceu as potências que a ela se opuseram. E Portugal recuperou a sua Independência plena.

Na União Europeia a 27, são 18 os países cujo Dia Nacional - o feriado mais importante – anuncia a respectiva fundação ou independência.

A Assembleia da República não pode apagar do calendário oficial de Portugal aquele feriado em que celebramos o valor incontornável da nossa independência nacional – a Assembleia da República tem o dever de não votar nesse sentido. E, se isso acontecesse, o Presidente da República não o poderia subscrever e avalizar – como representante máximo da República Portuguesa e garante da independência nacional, o Presidente da República deveria exercer o veto político contra tamanho ataque ao espírito de Portugal e da sua História.

A SHIP – Sociedade Histórica da Independência de Portugal – hoje como no decurso dos últimos 150 anos – convoca os Portugueses para que, fazendo prevalecer o bom senso, defendam a preservação do Feriado do 1.º de Dezembro de 1640. O feriado sine quod non.

José Alarcão Troni
(Presidente da Direcção da SHIP)

terça-feira, 17 de abril de 2012

Outra cartinha da EDP



Sonhei e vi. Sonhei e li.

A carta tem por assunto: Abolição de rendas garantidas no mercado eléctrico nacional - Decreto-Lei n.º 151/2012, publicado no Diário da República, 1ª série, de 1 de Junho de 2012. E dirige-se amavelmente ao «Caro(a) Accionista e/ou Produtor». Circularam-me uma cópia, pois não sou eu. A carta tem origem na ERSE, mas é distribuída também pela EDP.

Na melhor linha do Memorando da troika e do estudo internacional que vitimou o ex-secretário de Estado Henrique Gomes, a carta vem comunicar que, já a partir de 1 de Julho de 2012, acabam os privilégios administrativo-tarifários que, em laborioso novelo, se foram acumulando ao longo de vários anos e diferentes circunstâncias, para benefício instalado de alguns produtores e  accionistas (e prémio de gestores) e em sobrecarga dos consumidores e da economia nacional.

Atenciosa, com espírito de verdadeira solicitude cristã, a carta não deixa de pensar naqueles produtores, accionistas ou gestores «economicamente vulneráveis», abrindo-lhes um «regime transitório de renda social», com um «pequeno encargo de registo»

E, também para os accionistas que pudessem vir alegar razões para recalcitrar, a carta anuncia-lhes, generosa, a possibilidade de continuação de um regime de benefícios por mais um ano e meio a dois anos, consoante a data de aquisição das respectivas acções, embora cominando um ligeiro «factor de agravamento, o qual visa induzir a adesão gradual ao mercado».

Feitas as contas às diferentes equações apresentadas, verifica-se que quer o «pequeno encargo de registo», quer o «factor de agravamento», são singularmente superiores aos benefícios proporcionados transitoriamente, num caso e noutro. Mas isso não passa de um pequeno pormenor perfeitamente justificado pelo espírito de «induzir a adesão gradual ao mercado», em nada ensombrando a delicadeza da carta, a solicitude do gesto e a generosidade dos propósitos.

Obrigadinho.

Como costuma dizer-se: ou há moralidade, ou comem todos.

Uma cartinha da EDP

Fotografia retirada da notícia que anunciou:
EDP com lucros de 1 125 milhões de euros. O melhor resultado de sempre.

Acabo de receber na minha caixa de correio electrónico uma cartinha da EDP. Gente simpática.

A carta tem por assunto: Extinção das tarifas reguladas Baixa Tensão Normal (Potência Contratada inferior ou igual 41,4 kVA) - Decreto-Lei n.º 75/2012, publicado no Diário da República, 1ª série, de 26 de Março de 2012. E dirige-se amavelmente ao «Caro(a) Cliente». Sou eu.

O propósito da carta é informar que «as tarifas reguladas de venda de energia eléctrica a clientes com consumos em Baixa Tensão Normal (BTN) vão ser extintas, ficando a respectiva venda submetida ao regime de preços livres.» E comunica o calendário da eliminação das tarifas reguladas de venda de electricidade a clientes finais em BTN, consoante tenham potência contratada superior ou igual a 10,35 kVA, ou inferior a esta.

Tanta gentileza da EDP, que só me escreve para enviar facturas ou avisar de chatices, dá para desconfiar. Vem aí, pela certa, novo assalto ao cidadão. E a desconfiança aumenta  quando a carta refere aquele delicioso eufemismo dos «preços livres». Livres, para quem?

A ideologia da coisa fica ainda mais nítida na linguagem doce com que anuncia um regime transitório com duração de ano e meio a dois anos, consoante os clientes tenham potência contratada superior ou inferior aos 10,35 kVA: «Os clientes da EDP Serviço Universal com consumos em BTN que não exerçam o seu direito de mudança de comercializador continuarão a ser fornecidos de electricidade pela Empresa, aplicando-se tarifas de venda transitórias, fixadas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), que incluem um factor de agravamento, o qual visa induzir a adesão gradual ao mercado.» 

Apetitoso este “factor de agravamento”, que, gentil, “visa induzir a adesão gradual ao mercado”. Uns verdadeiros cavalheiros!

Resumindo: para os clientes do serviço universal, não há contrato que lhes valha. Pega lá decreto-lei! Para os interesses clientelares que se instalaram a cavalo da EDP é que há “contratos” blindados. Em matéria de adesão ao “mercado”, os consumidores entram, mas os produtores ficam à porta, uns estimulados por um “factor de agravamento”, outros almofadados por rendas garantidas. 

Se eu e a minha família já pagávamos demasiado pela electricidade que consumimos, iremos pagar ainda mais. Para quê? Para que aqueles que já ganhavam demasiado de forma garantida por lei e regulamento, possam ganhar ainda mais e por mais tempo. Ficamos todos esclarecidos com o conceito de “eficiência energética” que preside a esta política. O traço distintivo da carta nem é ter mais ou menos de 10,35 kVA de potência contratada. O traço distintivo é montar a EDP ou ser cavalgado por ela.

Noção curiosa de mercado! Só não percebo uma coisa: se esta política, a continuar, é a EDP que me assalta através do Estado ou será o Estado a assaltar-me através da EDP. Andam tão de mão dada que é difícil distinguir.

domingo, 15 de abril de 2012

Geração Erasmus, sinal do futuro

Em 6 de Março, o meu amigo Rui Marques, sempre a dinamizar o Forum Estudante, convidou-me a participar num seminário de um novo projecto que anima: GERAÇÃO ERASMUS. Fui como Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da República e foi uma experiência interessantíssima.


Agora, vi que puseram online aquilo que disse e o que gravei. Fica, aqui, também , o registo das minhas ideias.

Primeiro, o resumo, em texto, da palestra que apresentei:
Eu gosto muito dessa expressão Geração ERASMUS. Acho que é uma expressão muito feliz e que traduz uma Geração que tem sido beneficiada e privilegiada nos últimos 20 anos com uma experiência única.
O programa ERASMUS marca uma diferença qualitativa muito sensível na juventude portuguesa. As gerações que passam pelo ERASMUS vêm dessa experiência mais maduras. Amadurecem do ponto de vista pessoal, abrem horizontes e também aprendem a ter dupla cidadania: somos cidadãos nacionais, mas também europeus. É uma aprendizagem que se faz ao vivo. É a experiência mais popular no quadro da União Europeia (UE) e também com uma grande atração fora da UE. O programa ERASMUS está hoje em 33 estados, portanto está à frente da Europa, pois somos 27 estados membros. É um programa de grande sucesso, vamos a caminho do estudante "três milhões", que atingiremos provavelmente no ano 2015. Quando o programa começou em 1987, em toda a Europa, movimentaram-se três mil e poucos estudantes. Hoje movimentam-se por ano 250.000 estudantes. Também Portugal tem essa experiência de crescimento. Quando o programa começou, 25 estudantes beneficiaram do programa ERASMUS. Hoje, movimentam-se mais de 5.000 estudantes portugueses que todos os anos podem ter uma frequência de seis meses a um ano de estudos superiores na sua área de especialidade. É também uma experiência de ida e volta, nós enviamos e recebemos estudantes. Somos, aliás, um país com saldo líquido positivo: são mais os estudantes que nos procuram (mais de 6 mil por ano atualmente) do que portugueses que vão lá fora.
O que devemos melhorar?
1º Devemos continuar a captar estudantes estrangeiros que vêm às nossas instituições de ensino superior. Isso é sinal da sua qualidade e também permite que a juventude portuguesa beneficie desse influxo de estudantes que aqui vêm estudar e conviver connosco. E temos também que melhorar a estratégia de integração desses alunos. É preciso que os nossos estudantes os acolham quer no espaço de convívio e de circulação, quer na estratégia de trabalho académico, nos trabalhos de grupo, na consolidação de amizades e de relações. Isso é muito importante, faz parte da estratégia da Geração ERASMUS essa criação de relações.
Aumento da duração média dos estudos. Nesta altura, está na média dos seis meses e eu creio, da minha própria experiência pessoal, com filhos meus, que esse «choque de amadurecimento» que é uma experiência ERASMUS é muito melhor se for num ano escolar e não apenas num semestre. Portanto, parece-me indispensável que nós consigamos que a UE desenvolva estratégias que permitam anualizar a experiência de mobilidade.
Melhoria dos apoios financeiros e uma melhoria da capacidade de oferta. Portanto, mais gente todos os anos em mobilidade ERASMUS, com um valor mais elevado das bolsas. O valor médio das bolsas na UE é insuficiente.
Cruzar a estratégia europeia com a estratégia CPLP nessa área. Devemos levar por arrasto para o programa ERASMUS, irmãos nossos da CPLP permitindo-lhes beneficiar desse grande programa europeu. Podemos ser seus cicerones em língua portuguesa deste projecto europeu. Creio que isso é muito importante, o cruzamento de estratégias europeias com a estratégia CPLP deve ser uma constante nas diferentes estratégias de afirmação portuguesa e creio que aqui também deve ter uma «tradução».
Depois, o vídeo que gravei:


GERAÇÃO ERASMUS é mais uma iniciativa privada de serviço público com a marca de qualidade do Forum Estudante. É um portal que vale a pena conhecer e por onde se aprende muito a viajar. Viajar e conhecer.

sábado, 14 de abril de 2012

Guiné-Bissau: desarmamento, JÁ!

Carlos Gomes Júnior, o primeiro-ministro da Guiné-Bissau e candidato presidencial,
preso pelos militares insurrectos e cujo paradeiro é desconhecido

Defendo que a comunidade internacional defina e faça adoptar para Guiné-Bissau um plano de desarmamento completo dos seus militares. Chega de meias-palavras e de meias-medidas. A Guiné-Bissau não está sob nenhuma ameaça externa; a única ameaça é interna. A única ameaça é constituída por militares que, agindo não como uma força nacional, mas como bando armado, desde há demasiados anos que fizeram refém as instituições do país e capturam, de modo recorrente, o presente e o futuro da Guiné e dos guineenses. 

Hoje, o director do DIÁRIO DE NOTÍCIAS tem palavras fortes a respeito dos últimos acontecimentos na Guiné-Bissau. Escreve, em Editorial, João Marcelino:
«Mais um golpe na Guiné-Bissau. Já se perdeu a conta aos golpes militares nesta antiga colónia portuguesa. Mortes muitas, e entre elas as dos líderes Nino Vieira e Ansumane Mané. Cavaco Silva, em nome do Estado português, mais uma vez, condenou "energicamente". Coisa estéril. O que os guineenses certamente apreciariam é que Portugal, atual membro do Conselho das Nações Unidas, utilizasse a sua posição para denunciar internacionalmente as causas do drama guineense: o País tornou-se uma plataforma de distribuição de droga entre a América Latina e a Europa. É este miserável negócio que alimenta ambições, distribui dinheiro, fabrica golpes, mata pessoas e não deixa espaço para a Liberdade e a Democracia. Se os políticos portugueses não querem assumir a verdade, ao menos calem-se com os lugares-comuns.»
João Marcelino está carregado de razão. A comunidade internacional, Portugal incluído, tem sido demasiado branda e contida nos pronunciamentos e medidas a respeito da Guiné-Bissau. Essa brandura tem responsabilidades cúmplices no arrastamento - e agravamento - contínuo de um quadro  político e militar absolutamente intolerável.

Desde há demasiados anos que, na Guiné-Bissau, reina um clima político de crime e impunidade, com demasiada complacência internacional. Essa complacência é inspirada por sussurradas "boas razões": o receio de que agir conduza a ainda pior e a convicção de que a paciência e a tolerância permitam paulatinamente a alteração da relação de forças ou mesmo a reconversão dos "bandidos". Os factos têm mostrado que não.

Acompanhei de perto os acontecimentos do golpe anterior a este - na Guiné, desde há largos anos que há sempre um golpe anterior e um golpe seguinte... Esse "golpe anterior" ocorreu em 1 de Abril de 2010 - e o "golpe seguinte", que está a acontecer agora, é ainda um efeito remoto e arrastado desse de 2010. 

No começo de 2010, a Guiné-Bissau parecia, finalmente, poder vir a estabilizar-se numa boa fase, depois de graves incidentes anteriores, com os assassinatos de Nino Vieira e de Tagmé Na Waié, um à catanada, outro à bomba. (Ah! Para não me esquecer... Os responsáveis destes crimes nunca foram encontrados, denunciados, nem levados perante a Justiça. A intriga política também se alimenta desse vazio judiciário.)

Tinha havido eleições presidenciais e legislativas: Malam Bacai Sanhá era o novo Presidente da República e Carlos Gomes Júnior assumira a chefia do Governo. Apesar das conhecidas diferenças e contradições entre ambos, o primeiro-ministro Gomes Júnior começara a conduzir uma boa governação, conseguindo a estabilização de pagamentos e o restabelecimento de alguma respeitabilidade internacional. O povo apreciava o seu governo. Malam Bacai Sanhá e Carlos Gomes Júnior fizeram visitas oficiais a Portugal em Fevereiro e Março de 2010. Reuniram a alto nível. Inspiraram declarações promissoras. Tudo parecia rolar sobre rodas. Até que, a 1 de Abril, tudo desabou outra vez...

Na altura, eu era Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros da Assembleia da República e pude acompanhar, não na primeira fila, mas na segunda, aquilo que se seguiu: os segredos, a prudência, os compromissos embrulhados, o receio de agir forte, o medo de represálias locais mais violentas sobre os detidos ou sobre as próprias instituições da Guiné, as tergiversações, a esperança de que "o tempo sara tudo", as manobras de circumnavegação em torno do problema real, as tentativas de cerco e contra-cerco aos diferentes actores - enfim, o caldo complicado da política internacional à volta da Guiné-Bissau, que se foi acumulando ao fim de vários anos de indiferença e tibieza, de hesitação e laboriosa "engenharia político-diplomática".

Apenas nestes dois anos, sem necessidade de ir mais atrás, aquilo que se passou então e de então para cá daria um best-seller e um filme que seria certamente blockbuster: êxito de livraria e êxito na bilheteira. Tem os ingredientes todos: golpes e contra-golpes, espionagem, suspense, intriga política, narcotráfico, envolvimento criminoso, corrupção, tortura e violência, aventura, conspiração, chefes que sobem e chefes que logo caem, militares e bandidos, diplomatas e espiões, alta política internacional, coragem e medo, esperança e desilusão.

Em Abril de 2010, um chefe militar, António Indjai, prendeu outro, Zamora Induta, que era o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA). Prendeu também um chefe das informações, Samba Djaló. Ameaçou prender o primeiro-ministro, Gomes Júnior, mas acabou por recuar, face à reacção popular e internacional. Os insurrectos agiram coordenados com outro chefe militar anterior, Bubo Na Tchuto, que fugira da Guiné por envolvimento noutro "golpe tresanterior", mas regressara, entretanto, clandestinamente, refugiando-se (onde? pasme-se...) na representação das Nações Unidas em Bissau. Os golpistas de Indjai libertam Na Tchuto, que passa a agir a claro. Induta e Djaló são maltratados no presídio militar, consta que várias vezes torturados. Receia-se pela sua vida, ao longo de longos meses. 

A intriga constante entre Presidente da República e Primeiro-Ministro voa altíssima, com grande envolvente internacional. Bacai Sanhá viaja várias vezes ao estrangeiro, antes de cair gravemente doente - viria a falecer já em 2012, o que desencadeia as eleições presidenciais que decorriam agora e de que a segunda volta estava marcada para fim deste mês de Abril.

Indjai queria ser o novo CEMGFA. O mundo diz que não. O mundo exige a protecção da vida e a libertação imediata de Zamora Induta e Samba Djaló, bem como a reposição da ordem institucional normal, isto é, Induta como CEMGFA. O mundo interroga-se também pela impunidade e liberdade de movimentos de Bubo Na Tchuto, que, com outro alto responsável militar guineense, é formalmente indiciado pelas autoridades norte-americanas de participação no narcotráfico. O mundo diz que "Indjai e Na Tchuto de maneira nenhuma!" 

Mas o mundo não agiu. E foi falando cada vez mais pianinho...  Malam Bacai Sanhá, o Presidente da República, que não gostava de Zamora Induta, nem de Carlos Gomes Júnior, foi manobrando. Indjai, o golpista, acaba a tomar posse como CEMGFA, assumindo o posto do Induta que prendeu - e ao que consta, fez torturar. E o próprio Na Tchuto, o narcotraficante, acaba recolocado como CEMA (Chefe do Estado-Maior da Armada).

O mundo, cedendo em toda a linha, achou que, assim, comprava a estabilização político-militar na Guiné-Bissau. Viu-se... Está a ver-se.

Bubo Na Tchuto, o almirante do narcotráfico e CEMA, acabou por ser novamente preso por envolvimento noutro golpe ou pseudo-golpe, ainda em vida de Bacai Sanhá, e queixa-se das suas condições prisionais, por entre declarações de anedotário, comparando-se a Mandela. Zamora Induta e Samba Djaló que, entretanto, depois de várias peripécias, haviam sido libertados do presídio de Indjai não tiveram boa sorte: Djaló acabou assassinado há poucas semanas; Induta teve que buscar refúgio receando pela sua vida e segurança.

Entretanto, Angola, que assumira a presidência da CPLP, foi convencida a assumir as dores da estabilização militar guineense, com laborioso apoio político-diplomático de Nações Unidas, União Africana, CEDEAO, CPLP e União Europeia. Embrenha-se numa missão de reestruturação militar da Guiné-Bissau, através da MISSANG. A missão tropeça nos obstáculos do costume, dias antes deste último golpe, e ambos os factos estão estreitamente ligados na poderosa intriga local. Carlos Gomes Júnior, primeiro-ministro e líder destacado da 1ª volta das eleições presidenciais, e Raimundo Pereira, presidente da Assembleia Nacional e Presidente da República interino, são detidos e levados para local incerto. É dito que Indjai também está detido, mas dá para desconfiar que esteja por detrás deste golpe.

Em resumo: quem são os verdadeiros reféns destes militares guineenses? Zamora Induta e Samba Djaló em 2010? Carlos Gomes Júnior e Raimundo Pereira, hoje? Não. Reféns são as instituições locais. Refém é o povo da Guiné-Bissau. Refém é a comunidade internacional.

Hoje, reúne a CPLP em Lisboa. E as Nações Unidas parecem também falar grosso. Que não lhes doam as decisões. O povo da Guiné-Bissau precisa de ordem. Os guineenses querem ordem para poderem ter paz e progresso.

A comunidade internacional não pode continuar a agir como estando cativa destes militares. A comunidade internacional não pode continuar a abandonar a caprichos e desmandos militares, o povo da Guiné-Bissau, privado da democracia que pratica e quer praticar, mas vê sistematicamente assaltada por bandos armados.


Para falar curto e grosso, a comunidade internacional tem medo, age tolhida pelo medo. Pois bem: tem que deixar de ter medo.


A Guiné-Bissau não está sob qualquer ameaça externa; a ameaça é interna. Estes militares da Guiné-Bissau não são uma garantia de ordem - tornaram-se no principal factor da desordem. Importa deliberar, no imediato, e executar acções efectivas para o seu desarmamento. Importa proteger e reforçar o poder das autoridades civis e democráticas; reforçar a polícia e a Justiça, combatendo o narcotráfico e outras associações criminosas; garantir o futuro pessoal dos soldados e oficiais, mas, no quadro e para o efeito de uma reorganização e reconstrução das Forças Armadas guineenses.

É preciso pôr termo de vez a este ciclo infernal de crime e impunidade, cedência e recaída. A Guiné-Bissau precisa de paz e liberdade, ordem e progresso.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

10 anos de paz em Angola

Os generais Armando da Cruz Neto (FAA) e Abreu Muengo "Kamorteiro" (FALA)
assinaram o acordo de paz.

No passado dia 4 de Abril, celebrou-se o 10º aniversário do Memorando de Entendimento do Luena, rubricado primeiro nesta cidade capital do distrito do Moxico, no interior angolano, e solenemente assinado no Palácio dos Congressos, em Luanda, em 4 de Abril de 2002.

Este Memorando, acordado entre  o governo de Angola e a UNITA, comprometendo também os militares das duas partes, pôs termo em definitivo a longos anos de guerra civil. E, apesar de contradições e dificuldades iniciais, tem resistido àquela que havia sido a prova mais difícil – e, anteriormente, sempre impossível de vencer – de outros acordos entre os contendores angolanos: a prova do tempo.

A guerra civil angolana, claramente influenciada pelo clima dos anos finais da chamada “guerra fria”, provocou milhões de mortos, feridos e estropiados, outros largos milhões de deslocados e refugiados e uma vastíssima destruição de equipamentos e infra-estruturas nacionais. O dramático rasto deixado pela guerra civil, em 2002, ao fim de 27 anos de combates entre diferentes forças beligerantes, era absolutamente devastador.

Após o fracasso dos acordos de Bicesse e Lusaka e, antes deles, de Alvor e Gbadolite, o Memorando do Luena e o seu êxito evidenciam o patriotismo das partes signatárias, politicas e militares, traduzindo, em circunstâncias muito duras, críticas e sensíveis, uma criação inteligente e uma solução original angolana, que fica como exemplo para o mundo e marco de referência inspirador para o fim de outros conflitos, nomeadamente no continente africano.

Desde que a paz se instalou, a partir de 2002, Angola iniciou caminho, sólido e progressivo, de reconstrução nacional, com acentuado crescimento económico nos últimos anos, e uma rota de afirmação e consolidação paulatina de instituições democráticas. As eleições legislativas de 2008 e as próximas eleições legislativas e presidenciais de 2012 são, apesar de todos os percalços, o sinal desse desenvolvimento, ao mesmo tempo que o debate avança quanto à realização também de eleições autárquicas.

Sem prejuízo das diferenças entre os diferentes actores e partidos políticos, bem como das dificuldades em fazer emergir rapidamente uma sociedade de pleno funcionamento livre e democrático no quadro concreto que marca a história angolana, Angola nunca mais conheceu a tragédia dos confrontos político-militares e quer solidificar-se num contexto de normalização institucional e de um Estado democrático de direito.

Angola preside, hoje, à CPLP e, graças à paz de 2002 e ao espírito de reconciliação nacional, os seus progressos políticos, económicos e sociais são seguidos com atenção por todo o mundo.

A Angola e aos angolanos, enviamos um abraço fraterno, fazendo votos por que o espírito criador do 4 de Abril perdure para sempre na terra e no coração dos angolanos e os ajude a construir e a enraizar uma sociedade cada vez mais próspera e socialmente justa, em democracia e liberdade, num quadro de paz e de Estado de direito.

Queremos que Angola seja referência para África e no mundo.

A festa da Parque Escolar


As audições, ontem e hoje, das ex-ministras da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues e Isabel Alçada, confirmam a linha essencial da acção política dos governos Sócrates e do PS nesta matéria: a intervenção massiva era indispensável sobre o conjunto das escolas, que estavam muito degradadas; o novo instrumento usado (uma EPE) era o único adequado, rompendo com o tradicional modelo anterior das Construções Escolares e do PIDDAC ; o legado deixado é notável; mau é que o programa tenha sido interrompido. E, ao mesmo tempo, firme negação de críticas surgidas: «não houve derrapagens»; e «não houve excessos». Os efeitos na economia teriam sido mesmo tão bons que fica-se com a ideia de que o PS defenderia até a existência de mais "Parques Escolares" para pôr a economia nacional a andar... - o conhecido discurso do efeito salvífico e quase mágico do investimento público.

Estamos diante de uma completa desfocagem da realidade e do problema.

Não se nega a legitimidade de os Governos PS, tendo identificado um problema de ordem geral e não especificamente de uma ou outra escola isoladamente, adoptarem um novo instrumento de intervenção geral: uma nova empresa pública para intervir, massivamente, num programa global de reabilitação das edificações escolares. Daí, provavelmente, a empresa chamar-se "Parque Escolar": tratava-se de uma intervenção global sobre todo o parque escolar, e não apenas sobre algumas escolas, consideradas de modo avulso.

O problema fulcral, porém, além de outros aspectos também relevantes (propriedade e gestão das escolas intervencionadas, por exemplo) está no modelo de obra e na estratégia seguida: "tudo à grande!" O problema é Sócrates e o PS terem definido uma estratégia insustentável, melhor dito, mais uma estratégia insustentável: insustentável quanto à continuidade do esforço de investimento; e insustentável quanto a muitos dos novos custos correntes induzidos para as escolas e seu funcionamento.

É isso que levou à completa ruptura do sistema, à impossibilidade de poder prosseguir o programa e ao impacto muito negativo na sustentação corrente dos novos custos incorridos.

O modelo socialista, falsamente keynesiano, de "Parques Escolares" para dinamizar a economia, provou mais uma vez ser errado - e ruinoso! A pergunta a fazer não é «Era preciso?» ou «As obras justificam-se?»  O problema é se há dinheiro e como.

Hoje, a pergunta indispensável, para prosseguir, é: Quem financia? A verdade é que mais ninguém financia. Assim como a pergunta indispensável quanto ao passado legado é: Quem paga a dívida gerada? E a verdade é que não temos economia capaz de suportar os níveis de endividamento a que os Governos PS conduziram Portugal. Ou seja, as "Parques Escolares" não dinamizam a economia, mas afundaram as finanças e a economia.

A estratégia definida para a "Parque Escolar" foi uma outra SCUT, uma ilusão a somar a tantas outras ilusões - que ficaram caras. A ilusão do "sem custos para o utilizador" significa "com custos para o contribuinte". E o contribuinte não pode mais!

Bem sei que há socialistas que pensam «não pagamos», «não é preciso pagar, basta gerir». Mas não é verdade. Foi tudo mal gerido; e, agora, estamos exactamente a pagar tudo isso. E a que preço! A que preço colectivo!...

terça-feira, 10 de abril de 2012

A travessia


O jornalista José Vítor Malheiros escreve, hoje, um artigo forte no PÚBLICO - Recordes e mentiras. O artigo começa assim:
«Número de desempregados bate recordes. Número de desempregados jovens bate recordes. Número de falências bate recordes. O número de estudantes sem bolsas e a fuga de cérebros batem recordes. A emigração e o regresso de imigrantes aos seus países de origem batem recordes. O número de sem-abrigo e o número de pessoas que pedem ajuda alimentar batem recordes. O número de famílias que não conseguem pagar as suas hipotecas aos bancos e que não conseguem pagar escolas privadas bate recordes. O número de suicídios bate recordes. O aumento das taxas moderadoras e os cortes nos subsídios de desemprego e no rendimento social de inserção batem recordes. Os cortes na participação nos medicamentos batem recordes. O número de desempregados sem direito a subsídio e o número de doentes com cancro que abandonam tratamentos por falta de dinheiro batem recordes.
Estes são alguns dos recordes que o país bateu nos últimos dias. Apenas nos últimos dias e fazendo uma pesquisa superficial na imprensa. Não são todos. São apenas alguns dos que são mais fáceis de medir.»
José Vítor Malheiros é um homem sério, com pontos de vista próximos dos da oposição. O seu texto ignora o fundamental e inescapável: na situação a que anos consecutivos de políticas de esquerda e a governação PS conduziram o país, ficámos condenados a prosseguir uma consolidação orçamental "a frio", com efeitos imediatos que são, na verdade, duríssimos. Desperdiçámos oportunidades melhores e, agora, não temos outro remédio. Não temos mais dinheiro. Ficámos carregados de dívidas. E quem nos financiava também teve que fechar a torneira. Já aqui escrevi sobre isso. Por exemplo, aqui:  Saiu-nos o Zé errado; ou Folgas & almofadas, Cia. Lda.; ou Soluções e pesadelos.

Ter que adoptar Orçamentos de Estado que, consabidamente, concorrem para a recessão e a restrição de remunerações e de prestações sociais é estar consciente de que o país tem por diante uma travessia muito difícil. É indispensável; mas, na verdade, duro. 

A diferença entre prevê-lo e agora é que, agora, já estamos a fazer essa travessia. 

É duro, mas não podemos falhar. Vão ser precisos nervos de aço. E cabeça fria.