Divulgamos a intervenção feita pelo General Garcia Leandro, membro do Conselho Supremo da SHIP - Sociedade Histórica da Independência de Portugal, na pré-apresentação, a 19 de Abril de 2012, do livro «1 de Dezembro, Dia de Portugal» da autoria de José Ribeiro e Castro.
1º DE DEZEMBRO – DIA DE PORTUGAL
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Encontramo-nos hoje nesta Sociedade Histórica para formalmente apresentarmos o livro sobre o significado do 1º de Dezembro, do Deputado José Ribeiro e Castro, mas verdadeiramente o que está em causa é Portugal, os seus valores e o seu futuro.
Com grande visão, sentido de Pátria e coragem desencadeou o Dr. Ribeiro e Castro um conjunto de acções alertando para as consequências nefastas da abolição do feriado do 1º de Dezembro, comemorativo da Restauração de 1640.
A SHIP assumiu, como era sua obrigação, este processo e esta luta já que na sua origem se encontra esta marca histórica de um renascimento nacional após um desaparecimento de 60 anos do concerto das Nações; foi a Comissão Central do 1º de Dezembro de 1640, criada em 1861 por um grupo de 40 patriotas que deu origem, mais tarde, à SHIP.
Neste momento tornou-se necessário voltar ao processo de 1861, envolvendo um largo especto de portugueses responsáveis de todas as profissões e sensibilidades políticas, já que por uma iniciativa governamental descuidada e superficial se pretende acabar com o feriado nacional que comemora uma accção única da nossa vida colectiva.
O livro fala por si e vem, além do mais, dizer que existem alternativas para esta decisão alarmante.
Mas, é preciso um enquadramento conceptual, histórico e do momento em que vivemos.
Posso dizer que todos os sócios da SHIP e todos os subscritores deste Manifesto compreendem a conturbada situação internacional actual, as dificuldades de Portugal e do seu Governo; por isto, muitos de nós temos dado apoio público à acção deste Governo.
Mas as dificuldades da actual governação do País não permitem tudo, de qualquer modo, sem qualquer cuidado; como em qualquer rota da vida individual e colectiva, há sinais, indicações, perigos a evitar e proibições.
Não se pode roubar a alma e os valores de uma sociedade nacional; se assim fosse o seu desaparecimento seria apenas uma questão de tempo.
Ora a governação de um País obriga a conhecer a sua História, a sua realidade actual, a situação internacional e o que se pretende para o seu devir.
Se se pretenderem apenas aplicar receitas importadas e avançar com medidas superficiais e pouco pensadas, sem se conhecerem a História, o País real e a máquina do Estado, não existe um quadro delimitado de actuação e os erros vã-se acumulando.
Começa a ser muito visível que, neste Governo, responsáveis existem que nada disto conhecem, nem da História, nem do País real, nem da máquina do Estado e das suas obrigações.
Infelizmente, citando o Dr. António Vitorino em declaração recente, desde a nossa entrada na CEE que as opções dos Fundos Europeus e a sua gestão não foi a melhor levando-nos à actual situação, em que se têm de tomar muitas medidas correctivas num curtíssimo espaço de tempo.
Mas o acto de reformar não pode significar fazer tábua rasa de tudo, para tudo voltar a reconstruir; os exemplos históricos desta tentação acabaram sempre com grandes prejuízos. Os erros podem surgir, mas também podem ser corrigidos; é o que se pretende com este Manifesto e com este livro.
Também se tem a consciência que este ponto pode ser apenas uma gota de água nas preocupações do Governo, mas o seu valor tem uma dimensão e qualidade perante o qual a SHIP e todos os patriotas não podem ceder.
Gostaria de lembrar um pouco da História.
Se Portugal acedeu à Independência em 1139 com D. Afonso Henriques viveu durante muitos anos na guerra da reconquista cristã, sempre em acampamento militar, só vindo a ter fronteiras definitivas em 1297 com o Tratado de Alcanizes.
O Estado, verdadeiramente, só surgiu com D. Diniz, mas o grande e sólido sentimento de Nação só emerge e se consolida com a crise de 1383/1385 e as suas consequência que vão até Aljubarrota, onde ficou definido que esta parcela ocidental da Península Ibérica tinha decidido seguir um caminho separado dos seus vizinhos peninsulares.
Depois foi a expansão e o Império no norte de África, no Oriente e no Brasil que termina, depois de anos de decadência, no desatre de Alcácer Quibir e na perda da independência, com a monarquia dual e o domínio de Madrid.
Foram 60 anos de grandes dificuldades, cujo final começou a terminar nesse 1º de Dezembro de 1640, mas cuja consolidação demorou 28 anos de guerras até 1668 quando a Espanha aceitou finalmente de novo a nossa independência.
E tivémos de lutar contra uma situação internacional desfavorável, obrigando a uma grande actividade diplomática junto das diferentes potências da época; não será dispiciendo lembrar que o último Estado a reconhecer a Restauração foi o Vaticano, só depois da Espanha ter aceite a nova realidade imposta pela vontade de um povo e pela força das armas. Curiosamente, o mesmo Vaticano que actualmente não aceita eliminar feriados religiosos.
Se até aqui, tínhamos estado afastados intencionalmente das querelas europeias tal deixou de ser possível para o futuro.
A Europa envolveu-nos na Guerra da Secessão de Espanha, na Guerra dos Sete Anos, na expansão napoleónica, na I Guerra Mundial e em toda a dinâmica do difícil século XX.
Será de lembrar que a marca de 1640 é tão importante que mesmo na NATO tivémos o cuidado de negociar de modo a que nunca estivéssemos no mesmo Grande Comando Estratégico com a Espanha.
Com 1986 e a entrada na Europa das Comunidades, com a nova situação mundial pós queda do Muro de Berlim, com a globalização crescente de todas as actividades que desembocou na crise financeira mundial iniciada em 2008, com os sucessivos Tratados Europeus apontando para uma maior integração, o mundo é já muito diferente.
E vão acontecer mais mudanças a um ritmo talvez maior. Por isso temos de nos preservar em todas as frentes.
Hoje aquilo que nos liga a Espanha é mais forte do que o que nos separa, mas dentro de um conceito em que os Estados e as Nações são separados.
Trabalha-se em conjunto e para um futuro europeu melhor, mas com a consciência de que existem Nações e identidades diferentes; em nenhum lado se pensa de outro modo. E ainda há povos que lutam diariamente pela sua independência e todas as Nações comemoram oficialmente as suas datas históricas mais relevantes.
Ora isto, obriga-nos a voltar a 1640 e ao 1º de Dezembro.
Para quem não tenha percebido, trata-se do único evento dos últimos 400 anos sem o qual Portugal não existiria; foi a restauração e o renascimento pela vontade de um Povo.
Eu repito: trata-se do único evento sem o qual o Portugal acual não existiria.
Se assim é, como se pode aceitar que este, ou qualquer outro, Governo venha legislar de modo a matar este momento que permitiu o nosso renascer?
Que autoridade histórica, patriótica, moral, de cidadania e social, de respeito por nós próprios, existe para querer impor este assassínio de um valor colectivo?
Apenas existe a autoridade jurídica que, para este caso, é insuficiente.
Como o livro que hoje é apresentado aponta, há soluções alternativas que permitem ao Estado ter menos feriados sem tocar no 1º de Dezembro que deve ser inviolável - é só uma questão de conhecer e compreender a História e os valores da nossa vida colectiva.
Estamos, assim, a publicitar esta situação e a dar aos responsáveis políticos opções que lhes permitam encontrar alternativas para o seu objectivo que é só económico.
Uma palavra especial de parabéns e agradecimento ao Deputado Ribeiro e Castro pela sua iniciativa e trabalhos que permitiram acordar a população portuguesa para a gravidade desta situação.
Lisboa, 19 de Abril de 2012
José Eduardo Garcia Leandro