quinta-feira, 19 de março de 2015

Conselho Nacional de desEducação

Pela sua importância e actualidade, incluímos aqui, com autorização do autor, Guilherme Valente, um artigo publicado na última edição do semanário EXPRESSO.


CONSELHO NACIONAL DE DESEDUCAÇÃO
 
Entre as várias coisas boas que este Ministro da Educação foi capaz de fazer, a melhor foram os exames. E a prova, como se previa, viu-se logo: passados um ou dois anos sobre a medida, as médias subiram em todas as escolas. Em todas, mas mais… nas públicas! Nas "más", e isso é que é importante, para dar oportunidade e esperança a todas as crianças, criando as condições para diminuir o fosso da desigualdade social. (E subiram menos nas privadas por nelas haver já mecanismos de exigência de trabalho e de ser outro, regra geral, o empenho dos pais.)

Saudada com júbilo pelos que realmente se preocupam com a qualidade do ensino e o destino dos alunos, essa subida nos resultados enervou e abalou, como se viu, os defensores do facilismo, da ideologia que serviu magnificamente aqueles que quiseram e querem inviabilizar a educação em Portugal.

E a reacção não tardou. O CNE, agora com a cobertura útil do presidente que passou a ter - as escolhas e delegações deste Ministro são, regra geral, um desastre - vem agora propor, criminosamente, o fim das reprovações, isto é, o fim dos exames a sério. Para isso invocou três"razões", todas agoniantes: 

Uma, a de que as reprovações não resolvem o problema dos alunos que reprovam - e a transição sem se saber resolve? E foi por isso mesmo que desde sempre defendemos... a necessidade de apoio reforçado aos alunos reprovados. Solução que vêm apresentar agora como se fosse uma descoberta sua.

Outra razão, a de que reprovação suscita nas crianças perturbações emocionais, é hilariante, na linha de concepções e de práticas idiotas que têm conduzido à infantilização dos alunos, gerando jovens e adultos sem autonomia, personalidades frágeis incapazes de enfrentar as mínimas contrariedades que a vida a toda a gente inevitavelmente coloca.

E, última razão evocada, a de que as reprovações custam caro ao Estado. Razão hipócrita esta, por ser apresentada pelos que sempre tão assanhadamente atacaram o Ministro por "sacrificar a qualidade do ensino à poupança de dinheiro". Poupar-se-ia 900 milhões, dizem-me que terá dito o meu Amigo Eduardo Marçal Grilo – então porque não poupam tudo? Fechem-se as escolas, acabe-se com a Educação!
A proposta do CNE junta cegueira ideológica e ressentimento a uma aparente...burrice. E porquê? Por que os exames, a reprovação (a que chamam beatamente retenção), não se destinam apenas, nem sobretudo, a proporcionar aos alunos sem qualificações para transitar de ano a possibilidade de recuperarem. O objectivo e benefício dos exames a sério são sistémicos.
 
Isto é, promover o estudo pelos alunos todos, a qualidade do ensino (e o estudo...) pelos professores, a preocupação dos pais relativamente ao trabalho escolar dos filhos, e também o empenho e competência do aparelho do Ministério. O objectivo dos exames é, em suma, pôr toda a gente a trabalhar, a estudar, a ensinar e a educar realmente, informando e responsabilizando todos, professores, directores, escolas, ministério e pais. 

Percebe-se, assim, porque precisamos em Portugal de um regime de exames bem diferente daquele de que necessitam sociedades como a finlandesa ou a japonesa, por exemplo.

Acabar com os exames, como agora vem defender o CNE, determinará, rápida e inelutavelmente, que se passe a estudar menos e a ensinar pior. Voltará a descer, portanto, o nível de formação dos alunos, a crescer o abandono escolar e a indisciplina, a irresponsabilidade de estudantes e professores (e a frustração dos melhores deles), a indiferença dos pais. E os mais prejudicados seriam, serão…, como sempre foram, os mais desfavorecidos, assim se contribuindo para agravar ainda mais as desigualdades sociais. E entrariam ainda menos alunos no ensino superior, a não ser que também nesse grau de ensino viesse a verificar-se uma descida ainda mais escandalosa de exigência. Facto, infelizmente, bem provável, aliás, pois não começaram já alguns Politécnicos a decidir o fim de alguns exames – com excepção do exemplo que se esperava dos de Lisboa, Porto e Coimbra? Tudo para agravar a miséria da realidade política, cultural, económica, financeira, o pântano em que o País tem vivido.
Guilherme VALENTE

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