terça-feira, 5 de abril de 2016

"Offshores", a caverna de Ali Babá


Surpreende como a vida traz de volta e com impressionante realismo os contos da infância. A história de "Ali Babá e os 40 Ladrões" começa assim:
 
«Chegaram àquele lugar quarenta homens muito fortes e bem armados de espadas, com caras de poucos amigos. Ali Babá os contou e concluiu que eram quarenta ladrões. Os homens desapearam dos cavalos e puseram no chão sacos pesados que continham ouro e prata. O mais forte dos ladrões, que parecia ser o chefe, aproximou-se da rocha e disse:
— Abre-te, Sésamo !
 Assim que essas palavras foram pronunciadas, abriu-se uma porta na caverna. Todos passaram por ela e entraram na caverna, e a porta se fechou novamente. Depois de muito tempo, a passagem da caverna voltou a se abrir, e por ela saíram os quarenta ladrões. Quando todos estavam fora, o chefe disse: 
— Fecha-te, Sésamo ! 
Os bandidos colocaram os sacos em suas montarias e voltaram pelo mesmo caminho pelo qual tinham vindo. Ali Babá os seguiu com os olhos até desaparecerem. Quando se viu em segurança, e ninguém por perto, desceu da árvore, dirigiu-se à rocha e disse: 
— Abre-te, Sésamo ! 
A porta se abriu e Ali Babá ficou sem palavras diante do que seus olhos viram: uma grande caverna cheia dos tecidos mais finos, tapetes da Pérsia, belíssimos,  e uma enorme quantidade de moedas de ouro e prata dentro de sacos. »
 
Estamos, nestes dias, a ser inundados por revelações escaldantes do mundo dos offshores, obtidas a partir de uma firma de advogados do Panamá, os "Panama Papers". Ora, o efeito mais sério destas revelações é o descrédito completo do sistema financeiro (que já estava bastante abalado) e a desconfiança máxima no sistema político nacional, europeu e global, se nada de verdadeiramente modificador for feito.
 
Na verdade, isto é aquilo que os poderes sempre souberam e que os comuns não sabiam. E convém ter presente que estas revelações panamianas são apenas uma gota de um oceano muitíssimo maior.
 
Um professor de Economia meu amigo comentou-me o caso assim: «Oh! Todos sabem disto, todos sabem. Isto é o mesmo que entrar num banco e revelar o dinheiro que cada um lá tem depositado.» E, de facto, é assim. Em síntese: nada disto aconteceria se os bancos o não movimentassem e, portanto, se os sistemas políticos o não permitissem. O que o mesmo é dizer: isto acabará se os bancos quiserem (ou a tanto forem obrigados) e os poderes políticos obrigarem.
 
Deixemo-nos, portanto, de fantasias. Estes poços de traficâncias e de corrupção só serão encerrados ou regularizados, se a política assim o decidir de uma vez por todas. Isto é a consequência de anos consecutivos de esconderijo, de dissimulação e de impunidade, em que uns foram seguindo outros até à caverna de Ali Babá.
 
Atingimos um patamar caótico. Seria bom que este fosse o golpe final num sistema completamente podre.
 
É bastante pueril a alegria excitada que vibra por aí com a demissão do primeiro-ministro islandês, David Gunnlaugsson. Não é só ele que está em causa. São todos os primeiros-ministros do mundo inteiro, diante do olhar curioso e exigente da opinião pública mundial.
 
Se não fizerem o que devem, impondo a reforma radical e saneadora do sistema, tudo não passará de música celestial.
 
«Abre-te, Sésamo!» - é o que é preciso. De uma vez por todas.
 

1 comentário:

Augusto Küttner de Magalhães disse...

Isto não tem remedeio!!!!!!!

E é gravissimo!!!!