sexta-feira, 19 de julho de 2013

Acordo de salvação nacional, estabilidade e eleições



O primeiro-ministro e líder do PSD, Passos Coelho, tem reforçado a linha de rejeição e difamação do cenário de eleições legislativas antecipadas para algures no 2º semestre de 2014, como o Presidente da República adiantou na sua comunicação de 10 de Julho. Não é o único. E avança ora com o argumento da legitimidade (a legitimidade de legislatura inteira), ora com a ideia de que o anúncio a 1 ano de vista de eleições antecipadas seria prejudicial à estabilidade e contrária ao melhor interesse do regresso aos mercados.

Recomendo muito cuidado com esta linha.

Assim como não me pareceu brilhante a ideia, não muito original, de transformar em moção de confiança (para alvejar Cavaco Silva) a moção de censura do PEV, antecipadamente votada ao fracasso. Uma coisa é sugeri-lo uma vez, outra coisa é repeti-lo obsessivamente em variados tons e a várias vozes, como aconteceu no debate parlamentar de ontem, levando o PS a troçar repetidamente dos “recados para as Ilhas Selvagens”.

As pessoas não são parvas: todos vêem e sabem ver o que está à vista de todos; mas ninguém gosta que lhe forcem olhos adentro mais do que efectivamente se vê. Há coisas com que o melhor é não brincar. E o apropriado é mesmo fazer bem o trabalhinho de casa, deixando para outros as interpretações.

noutro post deixei a minha sugestão de saída para o imbróglio desta inesperada crise política, mesmo se não houver o concurso do PS. Creio que pode ser só a dois. Mas convém não exagerar. 

Compreende-se que maioria e Governo defendam o seu maior prazo, mas cabe lembrarem-se de quem provocou e abriu o enorme sarilho político e institucional em que mergulhámos – por pura "política", no pior sentido da palavra. Prudência e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. E humildade também não.

Quanto ao argumento da legitimidade governativa da maioria, este foi fragilizado e posto em causa por factos da conduta do próprio governo – importa que os líderes do PSD e do CDS não esqueçam como esta crise foi aberta.

É facto que o governo dispõe de maioria parlamentar – e essa maioria parlamentar, aliás, nunca esteve em causa. O curioso, por sinal, nesta coligação é que tem-se portado bem melhor a frente parlamentar do que o fundamental palco governativo. Pode mesmo dizer-se, sem receio de desmentido, que à sólida maioria parlamentar não tem correspondido a estabilidade (e unidade) do governo. Não me lembro de alguma vez ter visto uma coisa assim! E, se não fosse esta singular originalidade lusitana (maioria coesa, governo dividido!...), não estaríamos nesta crise, altamente indesejável.

Quanto ao outro argumento de que a proposta do Presidente da República geraria uma instabilidade antecipada, não é pura e simplesmente verdadeiro, se virmos bem o quadro completo.

Depois das brechas na maioria, o cenário de eleições antecipadas a seguir a Junho de 2014 foi avançado pelo Presidente como um elemento político para atrair o PS a um acordo de salvação nacional a três, que é naturalmente muito oneroso para um partido na oposição. Mas, nessa eventualidade, o argumento da instabilidade e da incerteza antecipadas não caberia de todo: na perspectiva dos credores e dos mercados (que é aquela que, aqui, interessa), o efeito de instabilidade do anúncio de antecipação de eleições a 1 ano de distância seria mais do que compensado pelo acordo de salvação nacional assinado a três para o fim da troika e o pós-troika. Não o defendo, mas é assim.

Podemos até dizer que, nessa perspectiva, ficaríamos melhor do que hoje: os credores e os mercados ficariam confiados num acordo substancial com vigência provável de 8 anos, o que é melhor do que a mera legislatura, até 2015, e muitíssimo melhor do que (custa-me dizê-lo, mas é verdade) a instabilidade, falta de unidade e falha de determinação de que, de modo recorrente, o governo tem sido lamentavelmente exibidor.

Por isso, reafirmo a opinião de que PSD e CDS devem concentrar-se unicamente no seu acordo de substância (a matéria propriamente dita da “salvação nacional”) e deixarem leituras para os leitores, interpretações para os intérpretes e conclusões para quem terá de concluir. Se fizerem assim, pode ser que haja uma saída, com ou sem PS. Mas, se, ao contrário, inverterem os papéis, negligenciarem as responsabilidades próprias e procurarem forçar a barra em manobras de política relacional, a coisa poderá acabar muito mal.

O melhor mesmo era, aliás, que esta crise não tivesse sido sequer aberta.

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