Os tempos de crise favorecem figuras assim. A verdade é que existem sempre e estão-se tornando cada vez mais frequentes e abundantes. Há até quem acuse que uma crise tão profunda só pode ter resultado da abundância, um pouco por todo o lado, de personagens com este estilo e perfil. A Crisologia ensina, porém, que prosperam ainda mais com a própria crise: a crise, quando nasce, não é para todos.
Toino Flausino é um desses. Nunca se rende, nunca se verga… à realidade. Por mais que ameace chuva, anuncia sempre sol radioso. Por mais que a tempestade sopre, imagina-se no El Dorado. Por mais que tudo escasseie, faz como se tivesse à mão recursos abundantes.
A crise, quanto mais profunda, mais chama oradores assim aos palcos. Cresce a disponibilidade para voltar a ouvir sons de antanho, música de outros tempos, palavras de eterna prosperidade – e continuar a alimentar a negação, a recusa da dureza dos dias. É como quem pensa: “se a gente nega, não dói.” Não passa, mas parece que alivia.
Há quem censure a Toino Flausino aparecer a liderar aqueles cujo líder anterior a todos mergulhou na crise e na bancarrota. Ele não se atrapalha: é o agente branqueador e aprecia esse papel. Ajuda a esquecer. Mesmo que seja só fingir esquecer, os tempos estão por tudo. Ao repetir o mesmo discurso de promessas e ilusões, de fantasias e quimeras, que multiplicou despesa, défice e dívida, os ecos fazem de conta que é coisa nova e, agora sim, verdadeiramente salvífica.
Entusiasma-se a acusar aqueles que “não cumprem a palavra”, embora omita esse pequeno pormenor de ficar a ideia de a sua “palavra” também não ser para levar muito a sério e que não estaria em condições de a cumprir, se se visse em posição de ter de o fazer. Excita-se a recomendar aos seus adeptos que “nunca prometam o que não estejam em condições de cumprir”, mas, ele mesmo, consome os dias a desdobrar-se em tômbolas maravilhosas de infinitos prodígios.
Filho do longo rosário socialista – “a gente gasta, os outros pagam” – enriqueceu o pensamento europeu moderno com uma nova criação que tudo cura, tudo salva, tudo melhora: é o totomutualismo europeu. É uma espécie de Euromilhões, mas sem necessidade de comprar bilhete.
A fórmula é verdadeiramente milagrosa: a despesa pública é "mutualizada" (a gente gasta, mas quem paga são os impostos dos outros europeus); o défice é "mutualizado" (a gente gasta a mais, mas quem paga são os outros países da União Europeia); a dívida pública é "mutualizada" (a gente endividou-se, mas são eles que pagam); até o desemprego é "mutualizado" (a gente não cria trabalho, mas eles pagam os nossos subsídios).
Brilhante! Genial! Toino é mesmo um rato! Como é que a gente não se lembrou disto mais cedo? [Há, porém, uns desmancha-prazeres que acham que sim: que já nos tínhamos lembrado disto e que foi por isso mesmo que teríamos chegado ao buraco onde estamos. Gente de má-fé.]
A magia da coisa soa tão brilhante, que já pôs estudiosos a ampliar a incidência do totomutualismo europeu. É na educação: eles estudam e nós temos as notas e os graus, avançando sem esforço e aos magotes não só para doutores, mas para doutorados, não só para mestres, mas para catedráticos – é a "mutualização" do conhecimento. É na saúde: a gente tosse, eles têm as dores e as febres; até os espirros são deles – é a "mutualização" das enfermidades. É na segurança social: com contas certas ou totalmente arruinadas, as pensões de reforma são sempre generosas e garantidas; pagam, pois claro!, os amigos europeus - é a "mutualização" da previdência. E é na segurança e defesa: que venham bandidos e leis permissivas, que os custos humanos e materiais de manter a ordem e a liberdade serão todos dos nossos parceiros europeus – é a "mutualização" da liberdade, segurança e justiça.
A coisa parece boa, muito boa mesma. Pelo menos, para nós. Já para os outros, a vantagem não é tão certa. Mas, quando lhe levantam essa dúvida, Toino Flausino tem resposta pronta: “Então, aderimos à Europa para quê!?” Ele tem jeito para isto. Razão por que o chamam também de Toninho Jeitoso.
Sem comentários:
Enviar um comentário